São Paulo, domingo, 12 de março de 2006

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Só reduzir taxa não resolve, diz o governo

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O desinteresse do empresariado por novos investimentos, sobretudo em áreas estratégicas como a de energia, deve ser visto pelo governo como um alerta do setor privado, na avaliação do secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy. Entretanto, ele diz que o problema não será resolvido exclusivamente com a redução da taxa de juros.
"Se acharmos que vamos resolver isso somente com a taxa de juros, não vamos conseguir. Vamos ter inflação porque o empresário vai continuar pegando o dinheiro e arrumando outra coisa [para investir]", afirmou ele.
Para Levy, essa é uma questão que passa também pela discussão do perfil do gasto público para reduzir o volume de impostos, de entraves burocráticos e, principalmente, pela "educação" dos empresários. Levy acredita que os empresários precisam deixar de lado a idéia de que a cada ciclo de recuperação da economia será possível "carregar a tinta nos preços".
Esse tipo de comportamento, segundo o secretário, exige uma reação do governo: para impedir o conseqüente aumento da inflação, é preciso elevar a taxa de juros.
"Estamos entrando numa armadilha. Temos que ver isso como um sinal de alerta do setor privado", afirmou. Segundo Levy, obstáculos que surgem em alguns setores estão fazendo com que o setor privado empurre para o governo a responsabilidade de garantir os investimentos.
Citando especificamente a área de energia, em que a dificuldade em conseguir licenças ambientais impede a construção de novas usinas, Levy afirma que os empresários precisam entender que o país mudou e que o processo decisório é dividido em várias áreas.
"Ele [setor privado] está caindo fora e jogando a responsabilidade para o governo, que não está mais bem aparelhado para atendê-la. O processo decisório é fragmentado. Hoje em dia, ninguém faz mais uma Balbina", avalia, referindo-se à construção da polêmica usina hidrelétrica nas décadas de 70/80 em meio a uma reserva indígena, no Amazonas.
Para Levy, o aumento da taxa de investimento no país e a redução dos juros passam pela discussão de coisas "chatas e complicadas", mas não há alternativa.

Processo de aprendizado
"As grandes questões do novo mundo são o que vamos fazer com o gasto público, a política de oferta [que tem ligação com a despesa do setor público] e essa relação da posição do setor privado em caso de aumento de demanda."
A rentabilidade das empresas precisa aumentar com redução de custos, segundo o secretário, o que significa menos burocracia nos negócios, menos impostos e um ambiente regulatório apropriado para diminuir incertezas, além da estabilidade dos preços.
Assim, acredita ele, será possível obter ganhos maiores no setor produtivo ao mesmo tempo em que o governo se sentirá confortável para reduzir os juros.
"Esse é um processo de aprendizado pelo qual teremos de passar", diz, ao ressaltar que é dever do Congresso Nacional garantir que não seja tão desinteressante investir. "Esse é o próximo passo. Temos de ter prioridade nisso para poder crescer."
A idéia de discutir o gasto público é compartilhada com especialistas do mercado financeiro. Para o ex-diretor de Política Econômica do BC Sérgio Werlang, é fundamental para a retomada dos investimentos cortar gastos públicos.
Assim, diminui a necessidade de cobrar tantos impostos para cobrir as despesas da União. Ela avalia: "Sem o governo gastar menos, fica difícil reduzir os juros de forma expressiva a ponto de incentivar os investimentos". (SHEILA D'AMORIM)


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