São Paulo, quarta-feira, 12 de março de 2008

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Medidas geram ceticismo em parte da equipe econômica

Mudança no câmbio é vista como ineficaz diante do cenário mundial de queda do dólar

Para especialistas, cobrança de estrangeiros é "tiro no pé", por acabar com um benefício que o investimento traz para o perfil da dívida pública

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A maré é de desvalorização do dólar no mundo todo. Os EUA enfrentam sua maior crise econômica da história recente, os juros por lá estão em queda e os investidores buscam alternativas mais rentáveis em economias ricas e, sobretudo, nas exportadoras de commodities, produtos que vivem um boom de alta. É o caso do Brasil.
Adotar medidas para evitar que o real siga o caminho trilhado pelas demais moedas é remar contra a maré, com grande chance de morrer na praia, que vive um momento de tormentas. Não à toa a proposta do governo de adotar medidas para tentar conter a valorização do real diante do dólar desagradou ao próprio governo.
Boa parte da equipe econômica não gostou e, num fato raro, a notícia desagradou aos técnicos da Fazenda e do Banco Central. Ontem, enquanto uns foram pegos de surpresa com a notícia de que o anúncio estava previsto para hoje, outros lamentavam o voto vencido.

Reclamação
A principal queixa? As medidas, sejam elas quais forem, não vão adiantar para conter a apreciação do câmbio.
A avaliação é que, além do fato de o dólar estar perdendo valor mundo afora, o preço das commodities está em trajetória de alta, e o Brasil, à beira de receber o selo das agências internacionais de boa economia para investir (o chamado "grau de investimento").
Com isso, não adiantaria encarecer a entrada de investidores estrangeiros, aumentando a cobrança do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) ou mesmo elevando o percentual dos dólares obtidos com exportações que os empresários podem deixar no exterior.
Hoje, o Brasil permite que 30% das receitas com vendas externas sejam mantidas no exterior. Porém, segundo estimativas da AEB (Associação de Comércio Exterior do Brasil), o valor realizado não chega a 3%.
"Se vier, a medida será muito bem-vinda para reduzir custos e melhorar a eficiência da indústria, mas não terá impacto na taxa de câmbio", defende José Augusto de Castro, vice-presidente da entidade.
Já a cobrança gradativa de IOF nas operações de renda fixa dos estrangeiros foi considerada "um tiro no pé" pela área econômica. Segundo técnicos ouvidos pela Folha, isso deverá acabar com um benefício que os estrangeiros trazem para a dívida pública, com alongamento dos prazos de vencimento e redução dos custos, sem gerar nenhum ganho em relação à taxa de câmbio.
Para o ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola, não haveria "momento pior" para discutir o assunto. "Especulações com o real não são feitas apenas com dinheiro que entra no país, e controlar o fluxo de ingresso de qualquer forma não vai mudar a trajetória do câmbio", afirma.
Para o economista Fábio Akira, do banco JPMorgan, "o momento é de ficar parado na política monetária e cambial para esperar os desdobramentos da crise externa". Isso porque, argumenta, por mais que não tenham efeitos práticos, as medidas criam um ruído desnecessário.
(SHEILA D'AMORIM E VALDO CRUZ)


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