São Paulo, segunda-feira, 12 de julho de 2004

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AVIAÇÃO

Regras do país dificultam uso de aviões regionais; para projeto não sucumbir, empresa pede mudanças a autoridades

Leis ameaçam sucesso da Embraer na China

Claro Cortes IV - 21.mai.04/Reuters
Trabalhadores montam o jato regional ERJ/145 na fábrica da Embraer em Harbin, na China


CLÁUDIA TREVISAN
ENVIADA ESPECIAL A HARBIN

A Embraer entregou, há 15 dias, os dois primeiros aviões que construiu na China, mas está longe de garantir o sucesso de seu empreendimento na economia que mais cresce no mundo. O principal desafio da empresa é convencer os burocratas de Pequim a modificar a estrutura do setor de aviação, cujas regras dificultam a utilização de aviões regionais e estimulam a compra de aeronaves de grande porte.
Sem essa alteração, as empresas aéreas não terão estímulo para comprar os aviões de até 50 lugares fabricados pela Embraer, que têm um custo de operação maior que os de aeronaves de grande porte. Nesse cenário, a aposta da companhia brasileira no enorme mercado chinês estará ameaçada.
Depois de tentativas frustradas de vender aviões para a China, a Embraer decidiu se instalar no país em 2002 e começou sua operação em 2003. Hoje, é a única empresa estrangeira de aviação que produz aeronaves no país -a Boeing também está presente na China, mas fabrica apenas peças que são usadas na montagem de aviões em outros países.
Como muitas multinacionais que colocaram o pé na China, a Embraer se associou a uma estatal local, a Avic II, mas conseguiu autorização para ter o controle da empresa, com 51% do capital.
Normalmente, os estrangeiros que se associam em joint ventures com os chineses podem ter, no máximo, 49% das ações da empresa. A Embraer argumentou que só poderia transferir tecnologia e sua cultura empresarial se tivesse o domínio da nova empresa, que se chama Harbin Embraer. Agora, espera que o governo mude as regras da aviação.
"Com a estrutura atual, as empresas não têm interesse em operar aviões de pequeno porte", diz Guan Dong Yuan, representante-chefe da Embraer na China.
Além de buscar clientes, os dirigentes da empresa têm dedicado grande parte de seu tempo a contatos com os inúmeros órgãos responsáveis pela aviação no país em todos os níveis de governo -nacional, provincial e municipal-, na esperança de que as regras sejam alteradas.
Como a estrutura da aviação chinesa reduz a lucratividade das linhas regionais, as encomendas da Embraer estão abaixo do esperado, reconhece Guan. A empresa produzirá seis aviões neste ano, dos quais um será entregue em janeiro de 2005. Para o próximo ano, a expectativa é fabricar dez aviões, ante uma capacidade de 24 por ano que a empresa pode ter.
Entre as dificuldades, está a taxa aeroportuária, que tem o mesmo valor, independentemente do número de assentos do avião. Quanto maior a aeronave, menor o impacto desse custo, diluído pelo grande número de passageiros.
Outro problema é o baixo custo da tarifa na China, que reduz a margem de lucro das empresas que operam na aviação regional, com menor número de passageiros. Um vôo de ida e volta nos 1.300 km que separam Pequim de Xangai custa US$ 200, o equivalente a R$ 600. No Brasil, a tarifa cheia do trecho São Paulo-Brasília-São Paulo custa R$ 1.600, para uma distância de 1.015 km.

Rotas para explorar
Também não há na China política de preservação de determinadas rotas para aviões de pequeno porte. As empresas que optaram pela aviação regional vivem sob a constante ameaça de entrada de uma aeronave de grande porte na mesma rota, com tarifas menores.
A Sichuan Airlines, que tem cinco aviões de 50 lugares da Embraer, opera desde 2002 a ponte aérea entre Chongqing e Chengdu, cidades no centro do país, separadas por 300 km. São seis vôos diários, ao preço de US$ 40 (R$ 120) cada trecho.
No início do ano, a Air China pediu autorização ao governo chinês para fazer a mesma rota com um avião de 180 lugares, o que permitiria a cobrança de uma tarifa menor que US$ 40 devido ao ganho de escala decorrente do maior número de passageiros.
Em um bom sinal para a Embraer, o pedido foi rejeitado pelo governo. "O valor da passagem poderia baixar, mas a freqüência dos vôos também cairia, com prejuízo para o usuário", diz Guan.
O modelo desenhado pela Embraer na China seria perfeito, não fosse a barreira das regras pouco favoráveis à aviação regional. As projeções da empresa indicam que a China terá necessidade de 635 aviões de menos de 120 lugares pelos próximos 20 anos. O país tem hoje 660 aeronaves, das quais 74 são de até 120 lugares, o equivalente a 11% do total. A média mundial é de 30%.
Nos últimos 20 anos, o tráfego aéreo cresceu 17,5% anualmente e a projeção é que se expanda em 9,2% anuais pelos próximo dez anos. Levantamento da Embraer indica que há 36 rotas no país que poderiam ser exploradas da mesma forma que a ponte aérea entre Chongqing e Chengdu, com aviões de até 50 lugares.
Dos 143 aeroportos civis do país, 72 têm movimento inferior a 200 passageiros, número pouco adequado a aviões de grande porte. Além disso, entre as 795 rotas aéreas, 466 (60%) são usadas por menos de 120 pessoas.
Outro elemento promissor para a aviação regional é a política da China de desenvolver o oeste, área mais pobre e menos habitada que o leste. Com pequenas cidades e menor número de passageiros, a região é ideal para aviões de pequeno porte, avalia a Embraer.


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