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LUÍS NASSIF
O Banco Central e a crise
Não está certo o presidente
do Banco Central, Armínio Fraga, em debitar à campanha eleitoral os problemas cambiais enfrentados pelo país. Politiza o debate, acirra o nervosismo do mercado e tira o corpo de
erros que foram cometidos na
gestão cambial deste ano. E foram muitos os erros.
Quando teve início o nervosismo do mercado, no primeiro semestre, o BC decidiu administrar as demandas adiando os
problemas para o último trimestre deste ano, justamente o período em que o mercado estaria
mais nervoso, por conta das
eleições. Ou seja, jogou o pepino
para o epicentro da crise.
O erro inicial foi ter utilizado
a "marcação a mercado" na definição do valor dos títulos em
carteira dos fundos, provocando
desvalorização das cotas. Criou
um nervosismo desnecessário,
porque a maior parte dos títulos
era levada até o vencimento pelos fundos.
No plano cambial, foram muitos os equívocos. Um deles foi o
de, para reduzir o nervosismo
do mercado com as mudanças
dos fundos, ter trocado papéis
cambiais com vencimento para
2003 e 2004 por outros com vencimento no último trimestre
deste ano, em pleno período
eleitoral. De 17 de outubro a 12
de dezembro serão US$ 9,35 bilhões em vencimentos, além de
US$ 5 bilhões em "swaps" cambiais que vencem entre 17 de outubro e 18 de dezembro.
A última coisa a fazer, em
uma empresa com dificuldade
de caixa, é antecipar vencimentos de dívidas, me diz um analista independente. Pelo contrário, o caminho prudencial é o do
alongamento da dívida, para
reduzir os problemas de liquidez. A idéia de encurtar o prazo
pode ter contentado o mercado
em um primeiro momento, mas
deixou bombas pelo caminho,
um excesso de procura sem oferta, em um período de alta volatilidade motivada pelas eleições,
que começou a movimentar a
roda da especulação.
O jogo começa quando os detentores de títulos cambiais começam a manipular o mercado
para elevar o valor do Ptax (o
preço de liquidação do título
cambial). Com o cenário instável por si, por conta das eleições,
os bancos técnicos saem da parada, deixando o terreno aberto
para os especuladores. Com o
movimento de alta, quem tem
dólar à vista segura, esperando
uma nova alta. Quem precisa se
proteger compra correndo, temendo uma nova alta. E aí se
cria o moto-contínuo da crise,
explica o analista.
A manipulação pode ocorrer
de várias formas, a mais primária das quais é a chamada operação "Zé com Zé", em que há
troca de chumbo entre instituições. Essas operações vêm ocorrendo com grande insistência,
sem que o Banco Central as detecte e puna.
Não foi o único erro do BC.
Entre agosto e outubro deste
ano, gastou US$ 2,8 bilhões na
recompra de C-Bonds, com vencimento entre 2003 e 2005, pagando entre US$ 0,54 e US$ 0,60
por dólar para fazer a cotação
subir e ajudar a "percepção da
curva de juros dos papéis brasileiros e melhorar a formação da
taxa de risco Brasil", segundo
Beny Parnes, diretor do BC e pai
da operação.
O resultado foi inverso. O papel está cotado a US$ 0,495 por
dólar e a taxa de risco Brasil não
parou de subir. Nessa recompra,
o BC amargou perda financeira
entre US$ 250 milhões e US$ 280
milhões. Se esses US$ 2,8 bilhões
tivessem sido utilizados internamente, poderiam ter sido muito
mais eficazes para acalmar o
mercado.
Por isso, o melhor a fazer é Armínio Fraga -a quem o país
deve muito, por sua atuação
tranquilizadora na crise cambial de 1999 - evitar debitar esses problemas ao processo político e tratar de atuar com serenidade, enquanto espera o vendaval passar.
E-mail -
LNassif@uol.com.br
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