São Paulo, quarta-feira, 12 de novembro de 2008

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VINICIUS TORRES FREIRE

Carros: Lula lá, Serra aqui


Crédito para montadoras é razoável, pequeno e tem um quê político, mas rema contra a maré de medo do consumidor

NINGUÉM QUER ver demissões em fábricas de carros, claro, assim como Lula da Silva e José Serra. Mas o presidente e o governador paulista gostaram de partilhar mais que gentilmente o auxílio ao financiamento para a compra de carros, o que estava meio combinado já antes do final de outubro.
Até o valor foi o mesmo: R$ 4 bilhões da Nossa Caixa, outro tanto do Banco do Brasil. Resta uma dúvida -se o acordo já tem um quê da negociação de compra da Nossa Caixa pelo BB, BB que deseja nacos do mercado de financiamento de carros.
Em si mesmo, o auxílio de crédito não tem lá nada de excepcional. É um motivo razoável para a "photo opportunity" de ontem para Serra -Lula faz as dele diariamente e, no caso das montadoras, já havia feito comício no Salão do Automóvel.
Deixar montadoras irem à breca é queimar rolos de filme eleitoral. Falando nisso, Serra já havia providenciado outra ajuda, ajuda mesmo, para pequenos e médios agricultores comprarem tratores. As fábricas cortam 20% do preço, a máquina é financiada em cinco anos, com três de carência, a juro zero. São Paulo entra com o subsídio, algumas dezenas de milhões de reais.
A "ajuda" anunciada ontem, por sua vez, é pequena; o subsídio implícito deve ser micro. Subsídio há, pois não há tal crédito na praça e as financeiras não veriam o dinheiro se não fosse a mão visível dos governos federal e paulista. Mas a "causa", digamos, é mais ou menos justa.
Os R$ 8 bilhões de crédito mal dão para dois meses do financiamento de veículos para pessoa física por meio de crédito direto ao consumidor -ou podem dar para mais tempo, se o consumo continuar a cair.
A maior parte da venda de carros para pessoas físicas se dá por meio de leasing. No primeiro semestre, 34% das vendas foram à vista, 25% por meio de financiamento, 3% por consórcio e 38% por meio de leasing.
Do estoque total de crédito para veículos em setembro, 39,7% era de leasing e 60,3% era de financiamento. Ou seja, dando um "chute ponderado", os R$ 8 bilhões dão para tocar um mês e pico de vendas.
A indústria de veículos é vez e outra mimada -por exemplo, conta com proteção tarifária (imposto sobre carros importados) grande. Mas é muito relevante. É mais de 10% da produção industrial medida pela pesquisa mensal do IBGE.
As vendas (licenciamentos) de automóveis caíram 11% de setembro para outubro, mas as fábricas não estavam exatamente morrendo de fome. No acumulado em 12 meses até outubro, as vendas haviam crescido 23,4% sobre o mesmo período do ano anterior. O pico do crescimento havia ocorrido entre fevereiro e abril deste ano (31% de aumento de vendas em 12 meses). Ou seja, o ímpeto de consumo já vinha caindo antes de a crise piorar.
Mas, de qualquer modo, os estoques subiram, e fábrica parada é custo. De resto, as filiais brasileiras devem estar levando um aperto das matrizes, algumas à beira da concordata, como a GM dos EUA.
Em suma, o crédito emergencial deve segurar as pontas até dezembro -isso se o consumidor não fugir de compras grandes assim por temer desemprego, juros maiores e prazos menores. Janeiro volta a ser mês de a onça beber água.

vinit@uol.com.br



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