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Autor de lei das teles ataca operação Oi/BrT
Carlos Ari Sundfeld afirma que só competição mais equilibrada justificaria mudança nas áreas de concessão do setor
Para advogado, assimetria entre o poder econômico das duas empresas e o de rivais poderia justificar mudança na legislação pelo governo
ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO
Para o principal autor da Lei
Geral de Telecomunicações,
Carlos Ari Sundfeld, a conotação nacionalista dada à compra
da BrT (Brasil Telecom) pela Oi
(ex-Telemar) é um retrocesso
no modelo de privatização do
Sistema Telebrás.
"Se análises econômicas bem
fundamentadas concluírem
que o Plano Geral de Outorgas
está inadequado e que fundir as
regiões da Brasil Telecom e da
Telemar resulta em uma competição mais equilibrada entre
as operadoras, não haverá retrocesso. É uma justificativa diferente do argumento nacionalista", disse à Folha.
O advogado, porém, afirma
que a mudança para permitir a
junção da duas teles pode se
justificar se o governo provar
que há uma assimetria entre o
poder econômico das duas empresas em questão e o dos outros grandes grupos que atuam
no setor: Telefônica e Telmex.
Sundfeld é professor de direito administrativo da Escola
de Direito de São Paulo, da
Fundação Getulio Vargas, e de
direito público econômico do
doutorado e mestrado da PUC
(Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo. A seguir, trechos da entrevista:
FOLHA - Há amparo legal para a Oi
comprar a Brasil Telecom?
CARLOS ARI SUNDFELD - Não há
amparo legal para um contrato
de execução imediata, mas as
empresas podem assinar algum
tipo de contrato para ser executado quando e se mudarem as
normas. É um contrato de compra e venda sob condição. Hoje,
o negócio não é permitido.
FOLHA - Como as duas são companhias abertas, com milhares de acionistas nas Bolsas no Brasil e no exterior, se aparecer um candidato com
oferta maior de preço, poderá atropelar a negociação?
SUNDFELD - A venda tem de ser
feita pelo melhor negócio, porque os controladores têm compromissos internos. Os fundos
de pensão não podem dilapidar
os seus patrimônios. Mas a melhor proposta não é, necessariamente, a de maior valor, porque há outras questões, como o
risco, a serem avaliadas. Enquanto o contrato não for assinado, se aparecerem outras
propostas, terão de ser levadas
em conta.
FOLHA - Como o senhor vê o envolvimento do Palácio do Planalto na
discussão da compra da BrT pela Oi?
SUNDFELD - Não vejo problema.
Como são empresas reguladas
e a concretização da venda depende da mudança na legislação, a negociação não pode ser
feita sem saber se há disposição
para mudança das regras.
FOLHA - O senhor considera um retrocesso a possibilidade de fusão da
Telemar com a BrT?
SUNDFELD - Critico a idéia de
criar uma supertele nacional
para enfrentar o poder das estrangeiras. Acho o argumento
muito frágil e um retrocesso.
Mas, se análises econômicas
bem fundamentadas concluírem que o Plano Geral de Outorgas está inadequado e que
fundir as regiões da Brasil Telecom e da Telemar resulta em
uma competição mais equilibrada entre as operadoras, não
haverá retrocesso. É uma justificativa diferente do argumento nacionalista.
Mas é preciso uma análise
econômica capaz de demonstrar que as vantagens de ter um
concorrente mais forte superam as desvantagens de eliminar um competidor.
FOLHA - Há informação de que o
Palácio do Planalto já estaria preparando o decreto para permitir a
compra de uma concessionária de
telefonia fixa por outra. Qual é o ritual previsto na lei?
SUNDFELD - A mudança tem de
partir da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações),
após fazer uma discussão pública do tema, e o Conselho
Consultivo dela tem de opinar.
A proposta da agência tem de
ser suportada por um estudo
sobre as vantagens do novo arranjo das áreas de concessão. O
presidente Lula acolhe ou não o
pedido de mudança.
FOLHA - Pode se arrastar, então,
por um bom tempo?
SUNDFELD - A lei fala em dez
dias para a audiência, mas, em
um caso como esse, deve demandar mais tempo, talvez um
mês. Se o governo editar um decreto sem seguir esse ritual, terá validade discutível.
FOLHA - A Lei Geral de Telecomunicações, da qual o senhor é um dos
autores, proibiu a venda de concessionárias de telefonia fixa por cinco
anos, contados a partir da privatização das teles, em julho de 1998.
Qual o sentido daquela proibição?
SUNDFELD - A grande preocupação era que aventureiros comprassem as empresas na desestatização para, logo adiante,
vendê-las com ágio, atuando
como meros corretores.
FOLHA - A julgar pelas manifestações do governo, essa preocupação
ainda existe. O presidente Lula quer
condicionar a mudança na legislação para permitir a compra da Brasil
Telecom pela Oi à garantia de que a
nova empresa, ampliada, não seja
revendida em seguida. O governo
tem como impedir isso?
SUNDFELD - Se o BNDES permanecer como acionista da nova
empresa, o governo poderá
exercer o direito de veto que o
acordo de acionistas der ao
banco. Mas isso não tem nada a
ver com a regulação. É um puro
arranjo entre sócios.
FOLHA - O modelo de privatização
previa que, após cumprirem as metas de universalização da telefonia
fixa, as teles passariam a disputar
clientes nas áreas uma das outras.
Por que esse objetivo não foi atingido? Elas continuam com mais de
90% do mercado de telefonia fixa
local, por exemplo.
SUNDFELD - Não há competição
entre as empresas de telefonia
fixa local, mas o celular compete com o telefone fixo. A competição precisa ser analisada de
forma mais abrangente. As empresas passaram a oferecer pacotes de serviços e a questão é
se há competição entre os pacotes. A experiência internacional não é muito animadora
em relação à competição na telefonia fixa local.
FOLHA - O problema é que as teles
se tornam dominantes onde elas
entram, como demonstram as aquisições no mercado de TV por assinatura e no acesso à internet. Esse cenário foi previsto quando o senhor
ajudou a redigir a Lei Geral de Telecomunicações, há dez anos?
SUNDFELD - A formação de
grandes grupos multisserviços
era prevista com muita clareza.
O critério de divisão do território em áreas de concessão foi
criar o embrião de grandes empresas de telecomunicações, e
não só de telefonia local.
FOLHA - O que precisa ser mudado
na lei?
SUNDFELD - Preocupa-me a
convergência das telecomunicações com a radiodifusão. É
necessário aprovar uma lei de
comunicação eletrônica de
massa para permitir a convergência tecnológica e, ao mesmo
tempo, proteger o conteúdo
produzido no Brasil. Senão, vai
tudo de roldão.
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