|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OPINIÃO ECONÔMICA
Deflação e recessão
BENJAMIN STEINBRUCH
No passado recente, os brasileiros morriam de medo do
dragão da inflação. Esse monstro
alado e com cauda de serpente
era um pesadelo recorrente.
Qualquer pesquisa que se fizesse
dava o mesmo resultado: o maior
problema da economia brasileira
era a inflação.
As coisas mudaram. Nos últimos meses, o dragão agitou a
cauda, mas já parece de novo
aquietado. Na semana passada, o
pessoal da Fipe, que apura a variação dos preços no varejo em
São Paulo, falava até em uma
possível deflação em maio. Os
preços dos alimentos, que representaram a principal pressão nos
últimos meses, finalmente cederam. Após 12 meses seguidos de
alta, caíram 2,7% em abril.
Do exterior também não vem
mais nenhuma pressão. O presidente do Banco Central americano, Alan Greenspan, velho guardião da moeda, agora alerta para
o risco de redução "inoportuna"
da inflação. Por mais que ele baixe os juros, que estão em 1,25% ao
ano nos Estados Unidos, os consumidores não compram.
Hoje os medos são outros, e não
faz sentido continuar assombrado com o dragão. O monstro que
atormenta os sonhos brasileiros é
a recessão. Lá fora, são a recessão
e a deflação. As taxas de juros,
não só nos Estados Unidos mas
também na Europa e em todo o
mundo desenvolvido, estão no nível mais baixo dos últimos 40
anos. Apesar disso, as economias
não reagem. Quando a inflação
cai demais -e, principalmente,
quando há inflação negativa-, o
consumidor espera para comprar
mais tarde, porque acredita na
queda dos preços.
Nesse contexto, o que aguarda o
Banco Central brasileiro para reduzir a taxa básica de juros? Até
os mais ortodoxos analistas
acham que chegou a hora de uma
"paulada" na taxa. Por mais que
esse instrumento não esteja funcionando no momento para reativar a economia desenvolvida,
ele pode ser usado com eficiência
por aqui, onde os juros são escandalosamente altos a ponto de impedir o investimento doméstico e
atrair capital externo em busca
de remuneração a curto prazo,
para operações que os especialistas chamam de arbitragem. Neste
momento, portanto, a redução da
taxa de juros pode cumprir também a função de conter um pouco
a entrada desse investimento especulativo internacional, que
Delfim Netto apelidou de "capital
morte súbita" e que outros denominam "capital motel".
Os leigos devem estar atônitos
com tudo isso. Até pouco tempo
atrás, o Brasil estava assustado
com a disparada do dólar e rezava por uma mudança de tendência. Agora, tudo se inverteu. Na
semana passada, cada vez que o
dólar baixava as pessoas punham
as mãos na cabeça: "Somos uma
Suíça, só falta nevar em julho!".
A preocupação, porém, é correta. Mantida a atual tendência de
valorização do real, a balança comercial será fortemente atingida
a médio prazo. O superávit comercial, previsto para US$ 18 bilhões neste ano, cairá, e com isso o
déficit em conta corrente voltará
a subir. Ao baixar as taxas de juros, portanto, o Banco Central
tem a chance de perseguir dois
objetivos com uma única medida:
estimular o crescimento da economia e ajudar no equilíbrio das
contas externas. Atenuado o fluxo dos capitais voláteis, a cotação
do dólar pode aumentar e deixar
de ameaçar o desempenho futuro
das exportações e o superávit comercial.
O vencedor do Prêmio Nobel Joseph Stiglitz é um dos expoentes
da economia não-ortodoxa atual.
Há poucos dias, publicou um artigo em que desbanca alguns clichês ardorosamente defendidos
como verdades absolutas pelos
presidentes de bancos centrais.
Um deles é que a inflação é prejudicial ao crescimento e à produtividade. Stiglitz sustenta que a
busca de níveis de inflação excessivamente baixos representa um
desastre para o crescimento.
Quando até Alan Greenspan
começa a arrancar os poucos cabelos por causa da deflação e tenta colocar a política monetária
americana a favor do crescimento, é sinal de que as percepções e
as verdades estão mudando. É
possível que a ameaça do dragão
inflacionário ressurja um dia. Por
ora, não passa de um medo infantil.
Benjamin Steinbruch, 49, empresário,
é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
Texto Anterior: Indústria tem queda recorde nas vendas em março, diz CNI Próximo Texto: Finanças: Lucro do Unibanco tem queda de 18% Índice
|