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São Paulo, terça-feira, 13 de maio de 2003

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LUÍS NASSIF

A crise que se aprofunda

Os indicadores econômicos refletem a realidade com defasagem. Os de março já comprovaram queda na atividade econômica. A julgar pelo que se recolhe de impressões por todos os cantos sobre a atividade econômica, vem um pirambeira pela frente.
No ano passado a atividade econômica foi sustentada pelas exportações. O mercado interno patinou. Neste ano, o mercado interno continua despencando e, se o câmbio continuar caindo, não vai encontrar o contrapeso da melhoria das exportações.
Pior: estamos embarcando novamente em todos os sofismas e erros de análise que marcaram o infausto ano de 1995.
Um deles foi brandido nesta semana por Marcos Lisboa, o correto secretário de Política Econômica. Mostrou dados isolados de recuperação de emprego como sinal de que a economia não está tão ruim assim. Não levou em conta a defasagem entre as medidas econômicas, as conseqüências sobre as vendas, depois sobre a produção, depois sobre o emprego. É só conferir os indicadores de emprego em julho.
De sua parte, porta-vozes da ala midiática da economia da PUC-RJ, como o economista Rogério Werneck, têm se especializado em fugir do tema principal, com uma capacidade de sofismar inacreditável.
Em artigo em "O Estado de S.Paulo" de sexta passada, o economista investe contra os "desenvolvimentistas". Segundo ele, essa linha de pensamento pediu uma política de substituição de importações por não acreditar no mercado. Houve a desvalorização cambial, e o mercado se incumbiu de acertar as contas externas, sem necessidade de política alguma, diz ele.
O que os chamados "desenvolvimentista" sempre propuseram -se por tal se pensar em pessoas como Nakano e Bresser, Serra e os Mendonça de Barros- foi a manutenção da desvalorização cambial para induzir esse processo de substituição de importações e criação de superávits comerciais.
A discussão, agora, é outra, e dela Werneck fugiu com a maior sem-cerimônia. Ele admite que a desvalorização cambial acertou as contas externas. Quando se pensa em um intelectual olhando a realidade, admitindo o óbvio (algo tão raro em intelectuais ideológicos), o efeito da desvalorização sobre as contas externas e, por consequência, investindo contra o pensamento vulgarizado da turma da PUC, o que faz nosso acadêmico? Utiliza o resultado para atacar a "outra turma", justamente a que defendia a depreciação cambial, e se cala sobre o cerne da questão: se o BC deve permitir a revalorização do real e, assim procedendo, se o equilíbrio externo será mantido. O sentimento de grupo é uma guilhotina sobre o pensamento intelectual independente, como comprova Werneck.
Durante quatro anos o país começou a preparar uma nova geração de exportadores, pequenas empresas organizando-se em consórcios, ousando lançar produtos inovadores, rompendo as barreiras culturais da exportação. Todo esse trabalho de fermentação desabrochou quando o câmbio explodiu no ano passado. Agora, a cada percentual de valorização, mata-se uma parcela dessas empresas. Quando o câmbio retornar ao patamar acima dos R$ 3,00, um investimento de quatro anos terá sido jogado pela janela.

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