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VINICIUS TORRES FREIRE
Campanha no caldeirão das bruxas
Falatório de candidatos sobre economia e governo soa como fórmulas da cozinha de feiticeiras de Shakespeare
FEL DE BODE, pêlo de morcego,
escamas de dragão, múmias
de feiticeiras, dedo de criança
assassinada ao nascer e jogada em
um fosso pela própria mãe. As palavras da campanha para o segundo
turno da eleição parecem a gororoba
viscosa do caldeirão fervente das
bruxas de Macbeth, embora as falas
das personagens da nossa peça não
cheguem aos pés das bobagens divertidas de bufões e de palermas das
tavernas de Shakespeare.
Lugar deserto, raios e trovões. "O
bonito é feio, o feio é bonito. Vamos
voar por entre a névoa e o ar impuro", dizem as bruxas.
As aparições dos "mercados" criticam o economista tucano e seu espectro "desenvolvimentista". O
mercado espezinha o economista do
candidato "market friendly", Geraldo Alckmin. O governo "market
friendly" petista critica o corte de
gasto público proposto pelo "desenvolvimentista" tucano, por sua vez
espezinhado por Alckmin, justamente o candidato do "choque de
gestão" e da eficiência econômica.
As bruxas vaticinaram que Alckmin seria rei, agraciado pela ajuda
da quadrilha de patetas petistas do
dossiê. Mas logo Alckmin entorna o
caldeirão das feiticeiras. Inaugura o
segundo turno a ouvir conselhos de
Anthony Garotinho, seu novo amigo
de fé, se não irmão, ao menos camarada. Cuidado com macumba! Com
vodu! Com banho de pipoca! "Nunca vi dia tão feio e tão bonito", diz
Macbeth, perdido no mato, logo antes de ouvir a profecia das bruxas.
Lula da Silva, depois de encarnar
os espectros de Tiradentes e de Getúlio Vargas, disse conhecer intenções divinas. Sim, segundo a mensagem revelada por Lula, Deus decidiu
pelo segundo turno ao avaliar que
"esse pessoal está muito empombado (sic)", sendo "esse pessoal" o plural majestático lulista.
"Não [foi] apenas a vontade do ser
humano, é uma vontade superior
que me fez chegar aonde cheguei",
disse Lula no sermão do Tietê. Segundo a revelação petista, Deus considerou que Lula tinha de ser provado no segundo turno para perceber
que devia colocar "mais álcool ou
feijão com água dentro do sapato,
para o sapato alargar um pouco".
Feijão no sapato? Seria um feitiço,
como "dar um truco de seis nesse
pessoal que fica blefando", segundo
o linguajar de carteado de Lula?
Pode ser que o lulismo tenha mesmo encantado Alckmin. O tucano
caiu na velha esparrela política de
vestir a carapuça das "acusações" da
propaganda petista. Não passa dia
sem desdizer que vá privatizar, cortar gastos ou acabar com o Bolsa Família, entre outras pragas lançadas
pelo governo petista. Daqui a pouco,
o enfeitiçado Alckmin terá de dizer
que ele mesmo tornou-se Lula, na
falta de algo original para convencer
o povo do seu reino prometido.
Enquanto isso, os mercadores de
São Paulo cobram seu quilo de carne
humana de quem se atreva a propor
qualquer plano diferente para o país.
Sim, trocamos de peça, mas Shylock,
o mercador de Veneza, era apenas
um cínico fino e amargo, em revolta
por ser aviltado. Na nossa peça ruim,
a brasileira, os mercadores é que nos
colocam no gueto. Parece que a fortaleza economicista vai cair apenas
quando as árvores andarem, como
fizeram contra Macbeth. Dos candidatos, a respeito disso se ouve só gororobas do caldeirão das bruxas.
vinit@uol.com.br
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