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Valor de dívida cresce mais do que renda
Para especialistas, descompasso em relação à capacidade de pagamento deve gerar uma elevação na inadimplência em 2010
Governo avalia que aumento
no crédito para o consumo
foi fator importante para
tirar o país da recessão
verificada na virada do ano
EDUARDO CUCOLO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O número de brasileiros com
dívidas acima de R$ 5.000 mais
que dobrou nos últimos cinco
anos, segundo dados do Banco
Central. Para algumas dessas
pessoas, isso significou o acesso, pela primeira vez, a crédito
para aquisição da casa própria
ou do primeiro veículo.
Outros, no entanto, entraram nas estatísticas oficiais devido ao acúmulo de dívidas e a
prestações não pagas.
Os dados oficiais sobre o sistema bancário confirmam essas duas interpretações. Por
um lado, mostram que o aumento no crédito para pessoa
física ocorreu, principalmente,
nos segmentos imobiliário e
consignado, aqueles que têm
juros menores e desequilibram
menos o orçamento familiar,
quando bem planejados.
Também mostram, no entanto, que o valor total da dívida dos brasileiros cresceu mais
do que a renda dos trabalhadores. Além disso, a inadimplência continua próxima dos patamares recordes alcançados no
período mais agudo da crise.
Em setembro deste ano,
aproximadamente 23 milhões
de pessoas físicas tinham empréstimos, ou dívidas, que somavam R$ 5.000 ou mais, de
acordo com dados do SCR (Sistema de Informações de Crédito do BC). Isso representa mais
de 10% da população brasileira.
Há cinco anos, eram menos de
10 milhões de pessoas.
Juntos, esses clientes têm R$
430 milhões em crédito, o que
representa 70% do estoque de
empréstimos existente no sistema financeiro para as famílias brasileiras. São cerca de R$
20 mil por devedor.
Nem a crise financeira conseguiu interromper essa expansão. Entre setembro de
2008 e setembro deste ano, o
número de "grandes e médios"
endividados subiu 22%. Foram
quase 4 milhões de brasileiros a
mais que assumiram dívidas
acima desse valor, praticamente o mesmo número verificado
nos 12 meses anteriores.
Aspecto positivo
Para o governo, esse movimento se deve a um aspecto positivo. O aumento no crédito
para o consumo foi um fator
importante para tirar o país da
recessão verificada na virada do
ano. Além disso, com a retomada dos empréstimos, o consumidor conseguiu trocar dívidas
mais caras, como a do cheque
especial, por financiamentos
mais baratos.
O advogado Ricardo William
Camasmie, por exemplo, aproveitou os benefícios fiscais e o
fato de estar com as contas em
dia para entrar novamente em
um financiamento de veículo.
"É uma coisa de cada vez. Eu já
tinha quitado o veículo anterior
e não tinha mais dívidas."
Alguns especialistas apontam, porém, para os riscos do
cenário atual, no qual o crescimento das dívidas acontece
mais rápido do que o avanço
dos salários. Para o economista
Luiz Rabi, da Serasa Experian,
esse descompasso em relação à
capacidade de pagamento deve
levar a um aumento na inadimplência em 2010. Depois de bater o recorde na metade do ano,
o volume de empréstimos em
atraso teve um pequeno recuo
nos últimos meses.
"Esse movimento de queda
da inadimplência vai se interromper em breve, devido à piora que estamos vendo na qualidade do crédito e à disparidade
entre o endividamento e a renda das pessoas", diz Rabi.
Perfil saudável
Para o economista Altamiro
Carvalho, da Fecomercio SP, a
cautela por parte do próprio
consumidor e as regras rígidas
do sistema bancário fazem o
mercado brasileiro de crédito
ainda apresentar um perfil bastante saudável.
Segundo ele, o risco de que
haja um aumento maior da inadimplência vai depender do
crescimento da economia no
próximo ano, que precisa voltar
a puxar a massa salarial.
Apesar de o trabalhador estar
mais endividado, os dois especialistas descartam problemas
semelhantes ao que ocorre nos
EUA, onde o descontrole no
mercado de crédito levou à chamada crise do "subprime".
As estimativas hoje são que
os brasileiros comprometam
entre um terço e 40% da sua
renda com o pagamento de
prestações, o que é considerado
um percentual adequado para
os níveis internacionais. "O
nosso nível de endividamento
ainda é muito baixo. Estamos
muito mais para Japão do que
para EUA", diz Carvalho.
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