São Paulo, domingo, 13 de dezembro de 2009

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Valor de dívida cresce mais do que renda

Para especialistas, descompasso em relação à capacidade de pagamento deve gerar uma elevação na inadimplência em 2010

Governo avalia que aumento no crédito para o consumo foi fator importante para tirar o país da recessão verificada na virada do ano

EDUARDO CUCOLO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O número de brasileiros com dívidas acima de R$ 5.000 mais que dobrou nos últimos cinco anos, segundo dados do Banco Central. Para algumas dessas pessoas, isso significou o acesso, pela primeira vez, a crédito para aquisição da casa própria ou do primeiro veículo.
Outros, no entanto, entraram nas estatísticas oficiais devido ao acúmulo de dívidas e a prestações não pagas.
Os dados oficiais sobre o sistema bancário confirmam essas duas interpretações. Por um lado, mostram que o aumento no crédito para pessoa física ocorreu, principalmente, nos segmentos imobiliário e consignado, aqueles que têm juros menores e desequilibram menos o orçamento familiar, quando bem planejados.
Também mostram, no entanto, que o valor total da dívida dos brasileiros cresceu mais do que a renda dos trabalhadores. Além disso, a inadimplência continua próxima dos patamares recordes alcançados no período mais agudo da crise.
Em setembro deste ano, aproximadamente 23 milhões de pessoas físicas tinham empréstimos, ou dívidas, que somavam R$ 5.000 ou mais, de acordo com dados do SCR (Sistema de Informações de Crédito do BC). Isso representa mais de 10% da população brasileira. Há cinco anos, eram menos de 10 milhões de pessoas.
Juntos, esses clientes têm R$ 430 milhões em crédito, o que representa 70% do estoque de empréstimos existente no sistema financeiro para as famílias brasileiras. São cerca de R$ 20 mil por devedor.
Nem a crise financeira conseguiu interromper essa expansão. Entre setembro de 2008 e setembro deste ano, o número de "grandes e médios" endividados subiu 22%. Foram quase 4 milhões de brasileiros a mais que assumiram dívidas acima desse valor, praticamente o mesmo número verificado nos 12 meses anteriores.

Aspecto positivo
Para o governo, esse movimento se deve a um aspecto positivo. O aumento no crédito para o consumo foi um fator importante para tirar o país da recessão verificada na virada do ano. Além disso, com a retomada dos empréstimos, o consumidor conseguiu trocar dívidas mais caras, como a do cheque especial, por financiamentos mais baratos.
O advogado Ricardo William Camasmie, por exemplo, aproveitou os benefícios fiscais e o fato de estar com as contas em dia para entrar novamente em um financiamento de veículo. "É uma coisa de cada vez. Eu já tinha quitado o veículo anterior e não tinha mais dívidas."
Alguns especialistas apontam, porém, para os riscos do cenário atual, no qual o crescimento das dívidas acontece mais rápido do que o avanço dos salários. Para o economista Luiz Rabi, da Serasa Experian, esse descompasso em relação à capacidade de pagamento deve levar a um aumento na inadimplência em 2010. Depois de bater o recorde na metade do ano, o volume de empréstimos em atraso teve um pequeno recuo nos últimos meses.
"Esse movimento de queda da inadimplência vai se interromper em breve, devido à piora que estamos vendo na qualidade do crédito e à disparidade entre o endividamento e a renda das pessoas", diz Rabi.

Perfil saudável
Para o economista Altamiro Carvalho, da Fecomercio SP, a cautela por parte do próprio consumidor e as regras rígidas do sistema bancário fazem o mercado brasileiro de crédito ainda apresentar um perfil bastante saudável.
Segundo ele, o risco de que haja um aumento maior da inadimplência vai depender do crescimento da economia no próximo ano, que precisa voltar a puxar a massa salarial.
Apesar de o trabalhador estar mais endividado, os dois especialistas descartam problemas semelhantes ao que ocorre nos EUA, onde o descontrole no mercado de crédito levou à chamada crise do "subprime".
As estimativas hoje são que os brasileiros comprometam entre um terço e 40% da sua renda com o pagamento de prestações, o que é considerado um percentual adequado para os níveis internacionais. "O nosso nível de endividamento ainda é muito baixo. Estamos muito mais para Japão do que para EUA", diz Carvalho.


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