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LETRA CAPITAL
Livro avalia transição da economia nos anos 90
JULIO WIZIACK
da Reportagem Local
Os economistas já
gastaram muito papel para avaliar os
anos 90 para a economia brasileira.
"Brasil: Uma Década em Transição", que chega às livrarias, entra no debate, que continua inconclusivo.
Organizado pelo economista
Renato Baumann, diretor da Comissão Econômica para a América Latina (Cepal), o livro reúne artigos de 16 especialistas que fazem
uma radiografia do período, considerado a década da transição.
A década anterior, a de 80, ficou
conhecida como a década perdida. Na de 90 o país cresceu ainda
menos, na média. A economia,
que vinha crescendo a um ritmo
médio de 2,8% ao ano até o final
dos anos 80, seguiu com o freio de
mão puxado a uma marcha de
1,8% na década de 90.
Mas o argumento é que, no período, teriam sido lançadas as bases para um crescimento auto-sustentado. Um fato é que a taxa
de inflação, que na década de 80
explodiu, despencou a partir de
1994, com o Real.
Mesmo alimentando a discórdia, a preocupação do livro é traçar um panorama do plano de estabilização, principal bandeira
daqueles que defendem a década
de 90 como ponte para a retomada do crescimento econômico.
Para o Banco Mundial, esse
crescimento depende também da
aprovação das reformas, principalmente a previdenciária, a da
administração e a fiscal. Segundo
o Bird, quanto mais tempo o país
perder em implementar esses
ajustes, maior será o custo social.
Quanto à privatização, o processo colaborou com a ampliação
do fluxo de capitais no país. Para
se ter uma idéia, os investimentos
estrangeiros diretos ultrapassaram US$ 26 bilhões em 1998 e se
mantiveram nesse patamar.
A receita gerada pela privatização chegou a quase US$ 90 bilhões, acumulados nos últimos
cinco anos, o que fez do processo
de desestatização brasileira um
dos maiores do mundo.
Segundo o governo, esse dinheiro deveria ser utilizado para
reduzir o déficit fiscal. Aí é feita
uma das críticas mais severas ao
governo Fernando Henrique Cardoso. Ao contrário do que se esperava, o déficit aumentou durante o período.
O déficit fiscal, que era equivalente a 1,4% do PIB em 1994, saltou para 8% quatro anos depois.
As taxas nominais de juros, usados como referência para o financiamento dessa dívida, chegaram
a 3% ao mês, segundo Baumann.
No saldo final do plano de estabilização, a economia mostra-se
dependente de fatores externos,
vítima de uma armadilha em que
o próprio governo caiu. As altas
taxas de juros atraem investimentos estrangeiros, mas secam-se as
fontes de financiamento interno.
Consequência direta dessa política é a retração da economia, a
redução do faturamento das empresas e o desemprego.
Uma das análises mais polêmicas do livro é feita pelo economista Rubens Cysne, da Fundação
Getúlio Vargas, e trata do Proer,
programa do governo para reestruturar o sistema financeiro.
Criticado por privilegiar um setor que vem registrando grandes
lucros, o Proer era um fundo criado por lei que incentivava fusões e
aquisições de instituições financeiras à beira do abismo.
A avaliação do programa chama a atenção pelo fato de 60% dos
recursos terem sido investidos em
bancos oficiais, a maior parte pertencentes ao governos estaduais.
Do total liberado entre 1994 e
1997, os bancos oficiais receberam R$ 40 bilhões, quantia que
cresceu dez vezes no mesmo período, contra R$ 27 bilhões destinados aos privados, número que
dobrou de tamanho.
Cysne considera que o saldo devedor do Proer em março do ano
passado seria de R$ 8,7 bilhões,
para garantias de R$ 19 bilhões e
deficiências bancárias na casa de
R$ 12,4 bilhões, o que tornaria
programa um mico.
Pode ser, mas faltou dizer que
esse foi um dos programas mais
baratos de que se tem notícia no
mundo, em torno de 2% do PIB, e
os resultados poderiam ser desastrosos se o governo não implementasse essa reforma.
Mesmo deixando clara a defesa
do plano de estabilização, há um
esforço em manter a imparcialidade e a crítica. A exceção mais
gritante a essa regra é o capítulo
que trata dos gastos sociais feitos
pelo governo ao longo da década.
É fato, como afirma a autora da
análise, a economista Sônia Draibe, que os investimentos na área
social vêm aumentando. Mas é
notório também, o que não é registrado, que a distribuição desses
recursos continua irregular.
Para citar um exemplo, o custo
médio de um aluno da rede pública hoje é de cerca de US$ 935 ao
ano, valor próximo ao da média
mundial, que é de US$ 1.200.
No entanto, o ensino fundamental, que deveria receber a
maior parte dos investimentos, fica com uma média de US$ 350,
um décimo do que é destinado
aos universitários.
Nas regiões Norte e Nordeste a
situação é ainda pior, o que colabora com o agravamento de problemas crônicos como a evasão
escolar e a repetência.
O artigo, no entanto, não faz esforço para recuperar nuances como essas, tão necessárias para se
avaliar o real efeito das políticas
sociais.
Apesar de ser escrito em uma
linguagem espinhosa, própria dos
economistas, o livro serve de referência para quem pretende entender as mudanças que marcaram a
economia na década de 90.
A OBRA
Brasil: Uma Década em Transição - Renato Baumann
(organização). Editora Campus (rua Sete de Setembro, 111, 16º
andar, RJ, CEP 20050-002, tel. 0xx21 509.5340). 332 págs. R$ 39,90.
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