São Paulo, domingo, 14 de janeiro de 2007

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Ações de Chávez não contagiam emergentes

Contas externas equilibradas, alta liquidez e capacidade do investidor de diferenciar entre países evitam "efeito manada" dos anos 90

Queda nas Bolsas no início do ano é vista como um movimento de realização de lucros, depois da forte valorização de dezembro

CLÁUDIA TREVISAN
DA REPORTAGEM LOCAL

A Venezuela anunciou a nacionalização dos setores de energia e telecomunicações na semana passada e não houve pânico dos investidores em relação ao Brasil, em um sinal de que o contágio entre os emergentes é bem menor hoje do que nos instáveis anos 90.
Na década passada, crises do outro lado do mundo eram suficientes para desencadear um movimento de manada entre os investidores, que transferiam seus recursos da noite para o dia dos países em desenvolvimento para ativos mais seguros, como títulos do Tesouro norte-americano.
De lá para cá, mudaram os emergentes e os investidores, e aumentou barbaramente a quantidade de dinheiro no mundo em busca de boas oportunidades de ganhos.
Apesar de quedas na Bovespa desde o início do ano, o Brasil sofreu poucos abalos com os anúncios da Venezuela. Para os analistas, a desvalorização nas ações foi um movimento de realização de lucros, depois da forte valorização que havia sido registrada em dezembro.

Liquidez em alta
O Brasil também passou incólume por outros fatos que, no passado, provocariam um terremoto entre os emergentes, como a decisão da Tailândia de impor controle sobre o fluxo de capitais, adotada em dezembro e revogada parcialmente.
"Um dos novos fenômenos em relação aos países em desenvolvimento é a enorme liquidez, que faz com que os investidores perdoem mais facilmente os pecados dos mercados emergentes", afirma Walter Molano, do banco de investimentos norte-americano BCP Securities. Nos países emergentes, a principal mudança foi a transformação em suas contas externas, que passaram de deficitárias a superavitárias. Com isso, tornaram-se menos dependentes de capitais externos e passaram a ter maior capacidade de suportar crises internacionais.
"Todos os emergentes passaram por crises no fim dos anos 90, desvalorizaram suas moedas e corrigiram suas contas correntes. As crises foram importantes para esses países se acertarem", diz Caio Megale, sócio da Mauá Investimentos.

Novo olhar
Também mudou a maneira pela qual os investidores analisam esses mercados, avalia Guillermo Ossis, da Pimco, empresa norte-americana que administra US$ 35 bilhões de investimentos em emergentes.
"Os investidores estão diferenciando cada vez mais entre os países. O que aconteceu na Venezuela teve pouquíssimo impacto sobre outros mercados emergentes", afirma.
Nos anos 90, a tendência dos investidores era considerar a América Latina como um todo, o que deixava pouco espaço para a análise da situação particular de cada país.
Mark Mobius, um dos mais célebres estrategistas de investimentos em emergentes, concorda. "Os investidores estão muito mais sofisticados. Eles sabem que o Brasil é diferente da Argentina e que a Argentina é diferente do Chile", ressalta ele, que administra os US$ 32 bilhões que o Franklin Templeton Investment destina a aplicações em mercados emergentes [leia entrevista abaixo].
Roberto Padovani, estrategista de investimentos para a América Latina do WestLB, aponta quatro países na região que se diferenciam dos demais: Brasil, Chile, Colômbia e México. Para ele, episódios como os da Venezuela ou da Bolívia -que nacionalizou a exploração de petróleo e gás- têm impacto nos mercados locais e sobre as empresas com negócios nesses países.
"A América Latina deixou de experimentar movimentos simultâneos entre os países, que foram comuns nos últimos cem anos. Agora, há movimentos não coincidentes. A Argentina caminhou para a moratória ao mesmo tempo em que o Chile conseguia o grau de investimento", exemplifica Padovani.

Previsões
Todos os entrevistados apresentam um cenário otimista para os países emergentes em 2007. A queda nas Bolsas no início do ano é vista como uma correção de preços, depois da valorização de dezembro. No longo prazo, a tendência é de alta, principalmente em relação às commodities.
O grande risco também é apontado de forma unânime: uma eventual freada na economia mundial, que parece cada vez mais improvável.
Na opinião de Mobius, tudo indica que o ano será positivo para os emergentes. "Sei que muita gente está com medo disso ou daquilo. Você pode ter medo de muitas coisas, mas, se as evidências de que caminhamos para uma crise não estão lá, não há razão pela qual deveríamos temer isso."


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