|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
LUÍS NASSIF
O caso Garoto
A campanha que o presidente do Cade (Conselho
Administrativo de Defesa Econômica), João Grandino Rodas,
está conduzindo contra o órgão
que dirige é o maior desserviço
à luta pela autonomia das
agências reguladoras e pela implantação do direito econômico
no país de que se tem notícia.
Que Grandino discorde da decisão faz parte do jogo. Sua reação posterior é incompreensível
por dois motivos. Primeiro, por
expor amplamente o órgão às
pressões políticas -maneira
mais rápida de destruir sua autonomia. Segundo, pela própria
reação em si.
No dia do julgamento da
compra da Garoto pela Nestlé,
apesar da maioria acachapante
de conselheiros contrária
-quatro votos contra e apenas
o de Grandino a favor-, chamou a atenção a reação idêntica de total surpresa e agressividade contra a decisão por parte
de duas pessoas: o presidente da
Nestlé, Ivan Zurita, e Grandino.
Por que essa certeza cega de
Zurita de que a compra seria
aprovada? Por que essa reação
desmedida de Grandino contra
uma decisão tão maciçamente
contrária à sua?
À medida que as informações
vão pingando, se fica sabendo
de um acordo prévio entre a
Nestlé e o Cade, para não tomar
nenhuma medida que pudesse
transformar a compra em ato
irreversível. Também se fica sabendo do interesse de outras gigantes do setor em adquirir a
empresa e preservar a competição. Finalmente, se fica sabendo que a Nestlé, por precaução,
nem sequer pagou integralmente o preço acertado com os antigos controladores da Garoto.
Portanto o veto à compra era
uma possibilidade que sempre
esteve presente na operação e
não coloca em risco a Garoto
-a menos que a Nestlé decida
liquidá-la.
O direito econômico é uma
ciência viva, que deve ser permanentemente analisada à luz
das transformações na economia e das experiências passadas. Chamo a atenção para os
efeitos de dois episódios de concentração econômica sobre um
aspecto mais visível da competição: as verbas publicitárias.
Comparem-se os gastos publicitários da Antarctica e da Brahma antes e depois da fusão. Faça-se o mesmo com as verbas
destinadas à guerra dos cremes
dentais depois que a Kolynos foi
absorvida. A queda foi brutal.
O que interessa nos exemplos
são as campanhas como reflexo
da competição. Só anuncia
quem compete. E quem compete tem interesse em reduzir preços, melhorar o atendimento ao
consumidor etc. Nos dois casos,
a redução da competição no setor foi proporcional à queda das
receitas publicitárias.
No caso da venda da Kolynos,
a alegação é que o comprador
precisava da empresa para garantir exportações e a sua sobrevivência econômica. Chegou-se a uma saída salomônica
-não utilizar mais a marca
Kolynos-, mas o resultado
prático foi a preservação do
market share da Kolynos.
O único risco da operação é a
Nestlé optar por asfixiar a Garoto. Embora não se vá esperar
atitude dessas, por parte de
uma empresa com as preocupações sociais da Nestlé, o Cade
precisa agir preventivamente.
Mas uma coisa está clara no
processo: é hora de o sr. Grandino adotar a única atitude coerente com sua reação ao episódio e com o dano que causou a
todos os que defendem agências
reguladoras autônomas: pedir
demissão.
Bingo!
As revelações da revista "Época" sobre o esquema do bingo e
do bicho rasgam de vez a fantasia. Durante todo esse período a
luta contra essa praga ficou nas
mãos de poucos procuradores,
enfrentando toda sorte de pressões e/ou de indiferença. Agora,
virou tema central da política
brasileira. Ou se aproveita a
oportunidade para acabar de
vez com essa praga urbana ou
soçobram todos.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
Texto Anterior: Montadoras: Hyundai faz recall por problema em freio Próximo Texto: Espetáculo?: Produção industrial cresce em metade das regiões em 2003 Índice
|