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VINICIUS TORRES FREIRE
Casa própria e caso de polícia
Como em outras bolhas, suspeita de crime financeiro
ronda a crise imobiliária nos
EUA; Bolsas voltam a azedar
A RUÍNA de parte do mercado
imobiliário americano ainda
não abalou as bases do resto
das finanças, se é que vai fazê-lo,
mas reproduz, por ora em caricatura, a história dos estouros de outras
bolhas. Produz o efeito óbvio de reduzir o patrimônio e a inclinação de
consumir do americano, que antes
utilizava seu imóvel supervalorizado como garantia para empréstimos. Mas também começa a dar em
quebras suspeitas e em outros casos
de polícia, por assim dizer.
O Bear Stearns e o UBS foram intimados pela Justiça a explicar suas
avaliações recentes e estranhamente positivas de uma financeira imobiliária que está para quebrar, a New
Century, que ontem foi colocada para fora da Bolsa de Nova York.
Como no estouro da bolha pontocom (2000-2001), suspeita-se que
analistas recomendavam o investimento em empresas podres, mas
que rendiam negócios para o banco
em que trabalhavam.
A New Century fazia empréstimos imobiliários para clientes de segunda linha. Está sendo investigada
pela SEC (agência federal de supervisão do mercado) e pelo governo,
não se sabe bem o motivo, embora a
empresa já tenha reconhecido erros
de centenas de milhões de dólares
em seus registros. Está à míngua. Os
bancos desistiram da ciranda.
Financeiras imobiliárias, de fundo
de quintal a grandes, dizem que estão sufocadas. Grandes bancos emprestam dinheiro para as financeiras e compram seus empréstimos,
que são transformados em títulos e
vendidos como um investimento,
que rende os juros da prestação imobiliária. Com a crise do calote das
prestações, os bancos cortaram o
crédito. Pior, têm o direito de obrigar as financeiras a recomprar os
créditos imobiliários. Sem dinheiro,
as financeiras quebram às dezenas.
Ontem, saiu um dado até outro dia
obscuro e quase ignorado pelo mercado financeiro em geral: o balanço
do calote imobiliário, que cresceu no
último trimestre de 2006. Mas essa
foi a causa da ressurgência do paniquito financeiro nas Bolsas? Soube-se ontem também que as vendas no
varejo dos EUA estagnaram em fevereiro. Mas o número pode ser apenas "sazonal" (o frio espanta o consumidor) e, faz um mês, tal indicador não renderia emoções.
Qual o efeito da crise imobiliária?
No "mundo real", a economia em
desaceleração e o furo da bolha derrubam o número de casas vendidas,
o que afeta indústria e serviços. Em
tese, entra mais areia na máquina
econômica, no lucro das empresas e,
por tabela, isso afeta suas ações.
Nos EUA, pode-se abrir uma linha
de crédito baseada no valor da casa
própria e sacar o dinheiro quando
necessário, com cheques ou cartão.
A alta no valor dos imóveis e juros
baixos levaram muito americano a
tomar empréstimos garantidos por
imóveis. Refinanciavam dívidas,
usavam o dinheiro em consumo ou
em investimentos. A desvalorização
das casas reduz suas disponibilidades financeiras e seu consumo.
O calote imobiliário, por sua vez,
detona investimentos. Quem comprou títulos imobiliários e ações de
financeiras perde dinheiro. Perdem
dinheiro fundos de "hedge", bancos
e seguradoras que venderam instrumentos financeiros de proteção ao
risco de calote no título imobiliário
("credit default swaps", CDS).
vinit@uol.com.br
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