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ANÁLISE
Zonas livres de exportação têm que mudar
ALAN BEATTIE
ANNA FIFIELD
DO "FINANCIAL TIMES"
Para seus proponentes, elas
são a vanguarda do desenvolvimento empresarial dinâmico. Para seus críticos, são exercícios passageiros e dispendiosos
em teorias econômicas de favorecimento desleal.
As zonas livres, ou zonas de
processamento de exportações, se
tornaram comuns nos países que
aspiram a se tornar potências na
economia mundial. Cresceram
em número ao longo dos últimos
30 anos e são hoje mais de 5.000
áreas, nas quais trabalham mais
de 40 milhões de pessoas. Mas seu
futuro não é certo. Além das crescentes restrições impostas pelas
normas mundiais e regionais de
comércio, as zonas livres também
enfrentam queixas de que os sacrifícios e esforços que requerem
simplesmente não compensam.
Existem muitas permutações da
idéia de zonas livres, dos simples
"portos livres" onde bens podem
ser desembarcados e embarcados
sem que passem pela alfândega, a
"zonas econômicas especiais" ao
estilo chinês, que abarcam todo
um município. Mas o padrão
mais típico é o da zona de processamento de exportações -um
enclave, muitas vezes isolado por
cercas, freqüentemente localizado na costa ou perto de um porto.
As zonas de processamento de exportações (ZPEs) em geral empregam baixos impostos e tarifas
e regulamentação mais enxuta,
para atrair investimento estrangeiro direto e estimular as exportações de uma nação.
Os atrativos desse tipo de zona
são reforçados por exemplos
proeminentes de aparente sucesso. A tendência moderna nesse
sentido foi iniciada pela Irlanda,
que estabeleceu zonas de exportação em torno do aeroporto de
Shannon nos anos 60. A virada
abrupta da China em direção da
liberalização e economia de mercado, em 1979, coincidiu com a
designação de Shenzhen como a
primeira das zonas econômicas
especiais do país.
O modelo foi copiado por nações de todo o planeta e novos
projetos desse gênero estão em
curso. O governo da Índia esta semana apresentou ao Parlamento
uma lei que retoma os planos de
criação de zonas econômicas especiais, para permitir que as empresas contornem as restritivas
leis trabalhistas nacionais e concorram com os fabricantes chineses. Em reunião da Convenção
Mundial de Zonas Livres, realizada no mês passado na "zona livre
do Egeu", em Izmir, Turquia, palestrantes da Europa Oriental,
África e América Latina elogiaram as virtudes das zonas livres
como áreas pioneiras de liberalização e crescimento importando
capital, criando transferências de
tecnologia para as economias domésticas e fornecendo empregos.
Existem, de fato, exemplos de
zonas econômicas que serviram
como vanguarda para uma liberalização nacional o que transforma
toda a economia, na prática, em
uma zona livre. Mas, além das
queixas tradicionais de que as zonas livres solapam os salários das
pessoas que empregam, há preocupações quanto ao possível exagero na análise de seus benefícios
e quanto à possibilidade de que o
tratamento preferencial que oferecem a exportadores e produtores não seja sustentável.
Contestações mais recentes às
zonas livres, porém, podem representar problema mais sério.
Uma delas é que as regras internacionais se tornaram consideravelmente mais rígidas. Em uma tentativa de bloquear as distorções
comerciais, os acordos da Organização Mundial do Comércio impedem governos de subsidiar a
produção para exportação ou pelo menos autorizam retaliação
contra os que decidirem fazê-lo.
Para os países que aspiram a
aderir a blocos comerciais como a
União Européia, as regras são ainda mais severas: as zonas de exportação violam as regras da
União Européia contra assistência dirigida a empresas. "Trata-se
claramente de uma ferramenta de
transição que usamos a caminho
da admissão à União Européia",
disse Kursad Tuzmen, ministro
do Comércio Internacional da
Turquia e forte defensor das zonas livres. "Fomos informados de
que, quando aderirmos à União
Européia, teremos de transformá-las em parques tecnológicos, sem
os benefícios fiscais".
Ceticismo
Ponto de importância ainda
mais fundamental é que existe ceticismo perene quanto ao valor
intrínseco das zonas de exportação. Instituições internacionais
como o Banco Mundial e a OCDE
(Organização para a Cooperação
e o Desenvolvimento Econômico)
há muito vêm advertindo que elas
estão longe de ser uma panacéia.
Algumas simplesmente não funcionaram: o Banco Mundial destaca a zona econômica de Dacar,
no Senegal, África Ocidental, onde regras restritivas sobre o investimento, baixa produtividade e altos custos de transporte significam que apenas dez empresas,
com 600 funcionários, foram
atraídas, nos 14 anos de existência
do programa.
Há quem duvide, mesmo no caso das zonas que atraem investimentos, que elas sejam capazes de
qualquer coisa mais que oferecer
vantagens tributárias a empresas
que teriam investido no país de
qualquer maneira.
"Estamos longe de um veredicto final sobre o valor real dos incentivos dados às zonas livres ou
zonas especiais", disse Mehmet
Ogutçu, principal administrador
do fórum de investimento internacional da OCDE. Ele aponta para a experiência da Associação
dos Países do Sudeste Asiático
(Asean), de dez membros, entre
os quais Indonésia, Malásia, Tailândia e Vietnã.
"Os incentivos nos países da
Asean envolveram abrir mão de
arrecadação equivalente a 0,5%
do PIB [Produto Interno Bruto]
agregado da região e os benefícios
não são claros", disse Ogutçu. O
que quase certamente representa
desperdício é quando um país
opera mais de uma zona livre e
elas lutam entre si para conquistar
o mesmo investimento.
Na China, por exemplo, as muitas zonas há muito estão envolvidas em um concurso de beleza a
fim de atrair investimento estrangeiro direto para fins de exportação. Isso vem provocando descontentamento entre os economistas chineses, que dizem que a
situação distorce os sinais de mercado.
"As políticas preferenciais como o aluguel zero, com o objetivo
de atrair investimento estrangeiro
direto, são muito más para a China", diz Yu Yongding, pesquisador sênior na Academia Chinesa
de Ciências Sociais.
Mas as autoridades municipais
demonstram recalcitrância. A
duas horas de carro de Pequim fica a área de desenvolvimento econômico de Tianjin, onde 230 mil
pessoas trabalham para empresas
cujos nomes soam como a lista de
honra da globalização: Motorola,
Nestlé, Volkswagen. A Área de
Desenvolvimento Econômico de
Tianjin tem de concorrer contra
os centros de produção mais conhecidos, no sul do país, concentrados em torno de Xangai e no
delta do rio Pérola, e continua a
oferecer aluguel grátis e isenções
tributárias prolongadas para encorajar empresas estrangeiras a
optar pelo norte.
Mesmo os partidários das zonas
livres admitem que o modelo precisa se adaptar. À medida que o
efeito da competição chinesa reduz as margens de lucros nos setores de eletrônicos, brinquedos e
roupas, acabaram-se os dias em
que uma estratégia vencedora para um país em desenvolvimento
poderia consistir de uma cerca
isolando uma área costeira qualquer, com a construção de algumas docas, para a atração de empresas estrangeiras com a oferta
de tarifa zero e eletricidade grátis.
As zonas livres, ao que parece,
terão de se adaptar para sobreviver. Dado o ímpeto por trás delas,
parece improvável que seu crescimento exponencial cesse subitamente. Mas entre as regras de comércio internacional mais rígidas, de um lado, e ministérios das
finanças mais suspeitosos, de outro, elas terão de batalhar muito
para provar seu valor em uma
economia globalizada em que a
competição por investimento se
torna cada vez mais intensa.
Tradução de Paulo Migliacci
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