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Cartel de energia dá prejuízo de R$ 1,7 bi
Secretaria de Direito Econômico vê ação conjunta de sete multinacionais, já multadas na Europa pela mesma prática
Documentos revelam suposto esquema na venda de transformadores entre 1988 e 2004; empresas
não se manifestam
VALDO CRUZ
IURI DANTAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Documentos obtidos pela
Folha revelam investigação de
um suposto cartel na venda de
transformadores de distribuição de energia elétrica que teria
provocado prejuízo de pelo menos R$ 1,7 bilhão a empresas do
setor entre 1988 e 2004.
A investigação da SDE (Secretaria de Direito Econômico)
colocou sob suspeita sete multinacionais que vendem no país
dois tipos de transformadores
-a gás e a ar- que controlam
os fluxos de energia elétrica entre as geradoras e consumidores comerciais e residenciais.
São elas: ABB, VA Tech, Siemens, Areva, Japan AE Power
Systems, Toshiba e Mitsubishi.
O mesmo grupo de empresas
foi multado pela Comissão Européia (órgão executivo da
União Européia) por formação
de cartel em 750 milhões (R$
2,1 bilhões) neste ano.
A Folha teve acesso a parte
do processo que corre na Justiça. Nele, a SDE aponta que os
elementos reunidos até agora
"constituem indícios veementes de prática de cartel nos
mercados" de transformadores
de distribuição de energia.
Diz ainda que, pelo acordo,
as empresas apresentariam
propostas de "5% a 7% maiores
do que o preço da ganhadora do
projeto". Segundo a SDE, "a intenção era dar uma aparência
de competitividade e evitar que
o cartel fosse descoberto".
A SDE começou a investigar
o suposto cartel depois que
uma das empresas fez acordo
com o órgão do Ministério da
Justiça, chamado de acordo de
leniência, no qual uma das partes faz delação em troca de redução ou isenção de penas.
Segundo a Folha apurou, foi
a ABB que entregou o esquema.
Ela também se beneficiou de
mecanismo idêntico para colaborar nas investigações na Europa, livrando-se de uma multa
de 215 milhões.
Ao procurar a SDE, a ABB
forneceu cópias dos acordos
que teriam sido firmados entre
as concorrentes -uma lista de
144 projetos de compra de
equipamentos de 56 grandes
empresas públicas e privadas
no Brasil, além de uma confissão por escrito das práticas.
Segundo esses documentos,
o cartel teria formalizado por
escrito sua atuação "estabelecendo com grau de requinte as
regras de funcionamento".
A ABB informou ainda à secretaria que o acordo teria alcance mundial, excluindo apenas EUA, Canadá, Rússia e China. No Brasil, funcionaria com
base em uma tabela de pontuação, prevendo inclusive punição caso uma empresa tomasse
o empreendimento da outra.
A SDE decidiu então promover uma operação de busca e
apreensão, autorizada pela
Justiça Federal, nos escritórios
da Siemens e da Areva, supostas líderes do cartel. A SDE diz,
no processo, que os documentos recolhidos reforçam a suspeita de existência do cartel.
Entre eles, uma agenda
apreendida na sede da Siemens
que anotaria os resultados de
uma licitação para fornecimento de transformadores para
Furnas no projeto Samambaia.
Os dados estão anotados na
página do dia 11 de agosto de
2005 (veja quadro abaixo).
Traz a Areva em primeiro lugar, com um preço de R$
42,351 milhões, seguida da
ABB (R$ 43,144 milhões) e Siemens (R$ 46,376 milhões).
Só que, segundo o processo, a
estatal Furnas informou à SDE
que 11 de agosto foi o dia de
apresentação das propostas. O
resultados só foram publicados
em 24 de novembro. A SDE
conclui que a agenda apreendida mostra que o "responsável
pela comercialização na Siemens já tinha conhecimento
tanto da colocação quanto dos
lances de seus concorrentes".
As empresas do suposto cartel, porém, pediram na Justiça
a anulação da operação de busca e apreensão. Tribunal Regional Federal em São Paulo
atendeu ao pedido. O mérito
ainda não foi julgado.
Para evitar a devolução dos
documentos apreendidos, a
Advocacia Geral da União, em
nome da SDE, pediu e conseguiu no STJ (Superior Tribunal
de Justiça) que eles fiquem
com a secretaria até o julgamento do mérito da ação.
Questionada sobre a pendência judicial da operação e
sua legalidade, a secretária de
Direito Econômico, Mariana
Tavares, disse que a "busca e
apreensão foi bem sucedida" e
crê que o TRF reverterá sua decisão, "principalmente após
parecer do Ministério Público
que confirma a existência" de
indícios. Tavares disse ainda
que a investigação não foi concluída e que "as empresas terão
ampla oportunidade de se defender" durante o processo.
Após concluído pela SDE, o
processo segue para o Cade
(Conselho Administrativo de
Defesa Econômica), que decidirá se houve ou não prática de
conduta danosa ao mercado e
eventualmente aplicará multa
de até 30% do faturamento das
empresas no ano anterior ao
início do suposto cartel.
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