|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Crise revela falhas na regra de recuperação
DA REPORTAGEM LOCAL
Antessala da falência, a antiga concordata era vista como o anúncio esperado de
um calote. Diante do fim
anunciado, credores buscavam, desorganizadamente,
reaver na Justiça o mais rápido possível bens e direitos.
Inspirada no capítulo 11 da
lei de falências americana, a
recuperação judicial brasileira buscou promover a melhora da situação financeira
da empresa, acompanhada
por um interventor nomeado pela Justiça.
A receita tradicional manda reunir credores em assembleia, fechar um acordo
em torno de um plano viável
de retomada dos pagamentos, vender ativos bons (marcas, patentes, unidades de
produção etc) para fazer caixa, voltar a pagar dívidas e seguir vida nova. A crise atual,
no entanto, revelou uma série de falhas e de mecanismos que precisam de ajuste,
segundo especialistas.
O primeiro problema é que
ninguém quer colocar dinheiro novo em uma empresa que deixou de pagar suas
dívidas. E isso ocorre no momento em que ela mais precisa de capital para se reerguer. "Quem tem coragem de
colocar dinheiro novo em
um negócio em que há insegurança sobre o destino do
recurso em uma eventual falência? Nos EUA, o dinheiro
novo é prioridade número 1.
É o primeiro a ser pago em
caso de falência. Tem de proteger esse dinheiro novo e
dar condições para que ele
venha. Se ele não vier, não
tem negócio", disse o consultor Luiz Galeazzi, especializado em gestão de empresas
em recuperação.
Outra falha dizia respeito
às dívidas trabalhistas, que
têm prioridade assegurada
no caso de falência. A Justiça
do Trabalho entendia que a
empresa que comprava um
ativo da companhia em recuperação -como marca, bens,
unidade lucrativa etc. -herdava o passivo correspondente dos trabalhadores. Só
no final de maio que o STF
(Supremo Tribunal Federal)
definiu, como já dizia a Lei de
Falências, que o comprador
desses ativos não tem responsabilidade pelo passivo
trabalhista antigo, que segue
na empresa-mãe que administra a massa recuperável.
Apesar de o governo federal ter promovido a aprovação da Lei de Falências, não
há regras tributárias específicas para equacionar os débitos tributários com a
União. Cada Estado e município definem a própria política de parcelamentos, sendo
que alguns inviabilizam negociação com outros credores ou recorrem à Justiça para recuperar os créditos.
"Como a lei não forçou a
entrada desses débitos no
plano da recuperação judicial, não temos uma posição
solidificada ainda. Há projetos de lei que tramitam no
Senado para modificar isso,
mas estão longe da ordem do
dia", disse Mirella Andreolla,
do Noronha Advogados.
Pelas regras da recuperação judicial, ficam fora da
massa recuperável os bens
com alienação fiduciária, em
que o dono cede a posse desse em garantia da dívida.
O mesmo acontece com os
ACC (Adiantamentos de
Contrato de Câmbio), papéis
em que o exportador adianta
em reais a receita que terá
em dólares. No caso, o banco
passa a ter o direito de receber a venda externa.
O problema é que os ACCs
são os principais ativos de
empresas exportadoras, que
são as que mais recorreram à
recuperação judicial. Se ficam fora, não é viável a retomada dessa empresa.
"Tudo isso precisa ser revisto. Embora a lei tenha sido feita sobre pressupostos
corretos, internacionalmente reconhecidos como válidos, na aplicação a gente recai nas práticas anteriores",
disse Thomas Felsberg, que
ajudou na redação da lei.
Texto Anterior: Agroindústria lidera recuperação judicial Próximo Texto: Análise: Setor do agronegócio foi pego no contrapé Índice
|