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São Paulo, segunda-feira, 14 de julho de 2003

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LINHA OCUPADA

Setor cresceu até 30% ao ano de 1998 a 2002, com a privatização das teles; agora, expectativa é mais modesta

Após explosão, telemarketing perde o fôlego

LÁSZLÓ VARGA
DA REPORTAGEM LOCAL

O telemarketing foi um dos setores que mais cresceram no governo FHC, devido à privatização de operadoras de telefonia fixa. Naquele período, os telefones foram popularizados, abrindo caminho para que as empresas de telemarketing tivessem um acesso maior à população.
De 1998 até 2002, a taxa de crescimento no ramo era de 20% a 30% por ano, enquanto o PIB (Produto Interno Bruto) avançou em média 2% anuais. Mas a explosão do telemarketing acabou. A expectativa é que cresça cerca de 5% ao ano, pois o avanço da telefonia fixa perdeu o fôlego.
Mas o presidente da ABT (Associação Brasileira de Telemarketing), Pedro Renato Eckersdorff, 63, afirma que o setor está se firmando como um dos que mais oferecem o primeiro emprego para jovens no Brasil. Hoje existem 500 mil pessoas no ramo, que fatura R$ 65 bilhões. Leia a seguir a entrevista de Eckersdorff à Folha.


Folha - O telemarketing é um dos setores que mais cresceram nos últimos anos no Brasil. Isso continua?
Pedro Renato Eckersdorff -
O telemarketing cresceu muito após a privatização das operadoras de telefonia -a uma média anual de 20% a 30% desde 1998, pois havia demanda reprimida de linhas e de serviços de atendimento. Existem cerca de 180 mil postos de atendimento de telemarketing, nos quais trabalham 500 mil pessoas. Mas o setor não vai mais crescer como no passado. A partir deste ano, haverá redução no ritmo de expansão, para 5% ao ano.

Folha - Quanto fatura o setor?
Eckersdorff -
Há 200 empresas especializadas, mas é bom lembrar que toda indústria ou empresa de serviços tem seu próprio departamento de telemarketing. Muitas contratam empresas externas para colaborar com o trabalho. O setor faturou R$ 65 bilhões em 2002. É hoje um dos principais setores que dão o primeiro emprego para as pessoas.

Folha - Muitas operadoras de telefonia compraram ou montaram empresas de telemarketing. Isso não concentrou demais o setor?
Eckersdorff -
As empresas de telefonia podiam optar pela terceirização do telemarketing ou pela criação de suas próprias empresas. A Telemar criou a Contax, a Telefônica criou a Atento. Além de usá-las para elas mesmas, ofereceram o serviço para o mercado. E o mercado é que decide se quer usar essas empresas ou não.

Folha - O telemarketing ficou agressivo nos últimos dez anos?
Eckersdorff -
Com certeza. Ele é mais competente, eficaz e objetivo. Ficou mais profissional. Existem vários tipos. O Serviço de Atendimento ao Consumidor é um telemarketing receptivo e recebe as ligações de clientes de uma empresa. O ativo é aquele em que a empresa procura as pessoas. Há ainda o telemarketing de retenção de cliente, para saber o grau de satisfação do cliente.

Folha - Existem empresas brasileiras que atuam fora do país?
Eckersdorff -
Muitas empresas brasileiras se associaram com grupos estrangeiros, como a TMKT com a Mac Ericsson. Em breve, a Dedic, empresa de telemarketing do grupo Portugal Telecom, vai fazer a partir do Brasil serviços para Portugal.

Folha - Sábado é considerado o dia do telemarketing. As empresas aproveitam que os consumidores estão em casa para vender produtos. O que irrita algumas pessoas. Como evitar isso?
Eckersdorff -
A ABT tem um código de ética, que está em fase de reformulação. No código há a recomendação dos horários em que as ligações devem ocorrer. Durante a semana, das 8h às 21h30. Aos sábados, das 9h às 18h, com um cuidado especial. Quer dizer, as pessoas que receberão os telefonemas devem ter alguma conformidade com os produtos ou serviços que serão oferecidos.
Quando o operador liga, ele deve se identificar, dizer em nome de que empresa ou entidade está falando e qual a razão do telefonema. O interlocutor, se não tiver interesse, deve desligar.

Folha - E se o operador não respeitar essas recomendações?
Eckersdorff -
Se o consumidor não gostar do telefonema, deve reclamar para a empresa.

Folha - Vários provedores ou sites anunciam medidas contra spam [mensagens comerciais em massa]. Isso prejudicará o telemarketing?
Eckersdorff -
O spam não é considerado telemarketing. O spam usa a internet, já o telemarketing é feito basicamente por telefone. Evidentemente, o spam esbarra às vezes com o telemarketing. Mas acredito que o telemarketing sempre usará a voz como principal instrumento. Existem momentos em que o consumidor precisa falar com alguém sobre determinado produto. A voz não vai acabar nos negócios.

Folha - Um profissional de telemarketing tem condições de seguir carreira na área?
Eckersdorff -
Com certeza. A empresa de telemarketing Softway, por exemplo, fez acordo com a Universidade Anhembi Morumbi e acoplou à unidade de Jundiaí, interior de São Paulo, um centro de ensino de tecnologia da administração, gestão de "call center" e marketing de "call center". O funcionário trabalha seis horas e depois estuda três horas em um desses cursos subsidiados. No plano de carreira, o funcionário começa como operador júnior, passa para sênior, depois vai para a supervisão, gerência e chega à diretoria.

Folha - Qual o perfil do operador?
Eckersdorff -
A idade média é de 18 a 24 anos. Mas há mulheres casadas e com filhos que trabalharam no setor no passado e voltaram a procurar as empresas para ter uma renda a mais na família.

Folha - O telemarketing é um trabalho desgastante?
Eckersdorff -
Muito. Há crises na comunicação entre o operador e a pessoa do outro lado da linha. Uma noite peguei minha mulher brigando às 2h com a central da PM, porque queria que os policiais acabassem com o barulho de uma banda. Mas a polícia precisava saber o endereço da festa, e minha mulher achava isso um absurdo, pois teria de sair para a rua.
A recomendação é que um operador descanse a cada duas horas ou depois de atender 12 ou 15 ligações difíceis. Existem as chamadas "câmaras de descompressão" para isso. São salas ou jardins onde o operador relaxa e baixa a agressividade. Toda empresa precisa ter uma "câmara", ou vira uma panela de pressão.



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