São Paulo, quarta-feira, 14 de julho de 2004

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VIZINHOS EM CRISE

"Lógica empresarial não é a da integração", afirma assessor

Governo Lula pede "paciência e calma"

ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O assessor internacional da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, ratificou ontem o tom conciliador adotado pelo governo brasileiro em relação à atual crise com a Argentina, ao distinguir "a lógica empresarial da lógica da integração" e pedir "paciência e calma" nas negociações com os vizinhos.
Ou seja: Garcia considera "natural" haver duras cobranças e negociações para defender interesses comerciais legítimos dos dois lados, mas acha que os governos precisam manter uma posição "mais estratégica", porque o mais importante é o fortalecimento e a ampliação do Mercosul.
Segundo ele, a Argentina cresceu muito entre 2003 e 2004 e tem motivos para reclamar: "Não são problemas artificiais, são problemas reais que nós temos de entender. Aliás, entender e estar preparados, porque esse tipo de problema tende a ocorrer até com certa freqüência. É normal".
A reação brasileira, portanto, se mantém cautelosa: "Temos de ter paciência e calma, porque sabemos que há objetivos maiores a serem alcançados. Já imaginou uma zona integrada desde a Amazônia até a Antártida?".
Garcia falou à Folha no fim da tarde, mais ou menos à mesma hora em que o ministro da Economia da Argentina, Roberto Lavagna, dava declarações condenando o Brasil por fazer uma tempestade em copo d'água pela decisão de impor barreiras a produtos brasileiros.
Para o assessor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, não é bem assim: "Nós valorizamos muito a aliança com a Argentina e o processo do Mercosul. Nossa tendência é não transformar esses episódios pequenos, como nós os vemos, em maiores do que realmente são. Ao contrário, estamos dando a eles sua real dimensão".
Na sua versão, o Planalto e o Itamaraty não gostaram, "evidentemente", de o anúncio das barreiras aos produtos da linha branca ter sido feito por Lavagna, na semana passada, às vésperas da reunião de cúpula do Mercosul. Mas isso não abalou as relações.
Para enfatizar a "tranqüilidade" como o governo brasileiro vê a questão, Garcia disse que não acompanhará a reunião de hoje entre empresários dos dois países na Argentina, com a intermediação, pelo lado brasileiro, do Itamaraty e do Ministério do Desenvolvimento. "É a parte técnica", relevou. "O Brasil precisa ter grandeza para entender as dificuldades que eles [o governo argentino] enfrentam com seus industriais", defendeu.

Indústria
"E os industriais brasileiros?", perguntou-lhe a Folha. Resposta: "Ter grandeza não significa fazer todas as concessões, mas ter compreensão com as dificuldades e negociar de forma equilibrada".
Quanto à informação de que a Secretaria de Transportes da Argentina pretendia restringir o tráfego de caminhões entre o Brasil e o Chile, via seu território, Garcia menosprezou: "Foi cogitado durante algumas horas e se desfez. Não era nada importante".
O impasse, entretanto, durou mais do que algumas horas. A resolução da secretaria fora baixada no último dia 5, e o recuo só foi anunciado ontem.
Para Garcia, a autoria foi de escalões inferiores do governo de Néstor Kirchner: "Às vezes, o guarda da esquina é mais radical do que o comandante do quartel", ironizou.


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