São Paulo, sábado, 14 de julho de 2007

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CAIO MEGALE

O câmbio e a atividade industrial


Não há desindustrialização generalizada, a despeito de o câmbio ter se apreciado 30% nos últimos três anos


A TAXA de câmbio continua se apreciando. Nesta semana, ela rompeu a barreira do R$ 1,90 por dólar, e não há sinais de que estejamos perto do fim do movimento. Críticos da política econômica do governo argumentam que o real forte ameaça a indústria nacional, pois prejudica as vendas, gerando queda na produção e desemprego.
No entanto, os dados do IBGE não respaldam essa tese. Até maio deste ano, em comparação ao mesmo período de 2006, houve crescimento da produção e ampliação no nível de emprego em setores diversos da indústria, que vão desde metalurgia e mineração até alimentos e bebidas, perfumaria, máquinas e equipamentos e mobiliário. Em outras palavras, não está havendo desindustrialização generalizada na economia brasileira, a despeito de o câmbio ter se apreciado em 30% nos últimos três anos.
Não é "trololó de economistas", como foi sugerido por um político nesta semana, são os números do IBGE.
É verdade que estão ocorrendo perdas, algumas significativas, em setores como vestuário e calçados, cuja produção doméstica não consegue competir com os produtos muito baratos vindos do exterior. No entanto, mesmo esse aspecto tem um lado positivo, pois permite aos consumidores comprar esses produtos a preços menores. Mais do que isso, o barateamento desses produtos libera renda para aumentar o consumo de outros bens -automóveis, por exemplo, que vêm batendo recorde de produção-, cuja indústria absorverá parte da mão-de-obra dispensada pelos setores prejudicados.
Cabe então a pergunta: por que a apreciação cambial não vem sendo negativa para a produção nacional, como temiam os críticos? Fundamentalmente, porque a apreciação cambial tem causas e conseqüências muito positivas.
Comecemos pelas causas. O câmbio está se apreciando porque a demanda global pelos produtos brasileiros cresceu extraordinariamente nos últimos anos. Como conseqüência, houve um aumento dos preços de exportação, que não se restringiu a itens básicos como grãos e minério: segundo a Funcex, o preço das exportações brasileiras de manufaturados, por exemplo, subiu 20% desde 2005. O ganho no preço compensa em boa parte a perda cambial.
Outra causa importante tem sido o aumento do interesse dos investidores globais em financiar a produção doméstica, seja na forma de investimentos diretos, seja na compra de ações de empresas nacionais. Melhoram assim as condições de produção.
Já entre as conseqüências da apreciação cambial, uma das mais importantes é que ela ajudou a trazer a inflação para baixo, permitindo ao Banco Central promover cortes de juros que já levaram -e vão continuar levando- a Selic para o patamar mais baixo em décadas. Juros mais baixos estimulam a demanda interna, que vem crescendo a taxas próximas de 6% ao ano, mantendo aquecida a produção doméstica, a despeito do forte crescimento das importações de bens de consumo.
O câmbio apreciado ainda barateia o custo de tecnologias e insumos importados, estimulando investimentos na produção de setores como maquinário e transportes.
Assim, a conclusão é que a apreciação cambial e a conjuntura macroeconômica que a cerca têm sido peça importante para o aumento do bem-estar do consumidor brasileiro, sem trazer como conseqüência negativa um processo de desindustrialização, que poderia gerar frutos negativos no futuro. Os seus benefícios, portanto, têm sido amplamente superiores aos seus custos.


CAIO MEGALE , 32, economista, mestre pela PUC-RJ (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), é sócio da Mauá Consultoria.


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