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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
A crise financeira no centro do capitalismo
A falta de transparência está dificultando o trabalho dos
BCs de manter funcionando
os mercados de empréstimos
APESAR DA importância da divulgação dos números do PIB
relativos ao segundo trimestre deste ano, decidi refletir sobre a
evolução da crise financeira que
atinge o centro do mundo econômico contemporâneo neste nosso encontro semanal.
A importância do acompanhamento da crise nos mercados financeiros do Primeiro Mundo está relacionada à perenidade desse nosso
novo vigor econômico. Ele só poderá ser mantido se a economia do
mundo continuar a crescer a taxas
próximas a 4% ao ano. E, para que isso ocorra, a economia americana
não pode entrar em recessão. E a crise atual, se não for superada com rapidez, pode levar a essa situação em
2008.
A crise iniciada com o colapso da
bolha imobiliária nos Estados Unidos evoluiu nas últimas semanas para um quase congelamento de parcela importante do mercado de crédito americano, inclusive de curto
prazo. O risco é que os problemas de
crédito agravem o ajuste que está
ocorrendo na construção civil, acentuando os problemas em outros segmentos. O canal seria a aceleração
da queda dos preços dos imóveis, reduzindo a riqueza das famílias e,
conseqüentemente, os gastos dos
consumidores. Há evidências de que
uma queda de 20% nos preços dos
imóveis, cenário realista hoje, poderia subtrair mais de um ponto percentual do crescimento, o que seria
suficiente para aproximar perigosamente o país de uma recessão. Daí a
importância da reativar os mercados de crédito.
Mas aí entra a novidade trazida
pela crise atual. Sabemos que o crédito nos países do Primeiro Mundo,
seja para empresas ou consumidores, depende cada vez mais dos mercados de títulos e derivativos. Nos
últimos anos, houve um vigor extraordinário, com o aparecimento
de inovações financeiras que provocaram um boom pelo mundo afora.
Os otimistas apontavam para essa
universalização dos mercados de
crédito como um fator de redução
da possibilidade de crises, na medida em que o risco de crédito era espalhado para mais investidores e
mercados, reduzindo a exposição do
sistema bancário.
Mas esqueceram que, por outro
lado, a transparência dos riscos de
créditos empobrece muito quando
passamos do crédito tradicional para os derivativos complexos que
existem hoje. No primeiro caso, os
bancos centrais mantém regulação e
monitoramento eficiente das carteiras de empréstimo. No segundo, não
existe uma instituição que consolide
e acompanhe as responsabilidades
dos emissores desses novos mecanismos de crédito. Além disso, a diversificação de risco apontada como
vantagem das inovações está se
mostrando menos abrangente, já
que os bancos mantiveram linhas de
crédito contingentes com vários dos
veículos que assumiram riscos e que
agora estão sendo sacadas. Ou seja, o
risco está voltando para os bancos
com rapidez inesperada.
A falta de transparência está dificultando o trabalho dos principais
bancos centrais em seus mandatos
de manter funcionando adequadamente os mercados de empréstimos. Tanto o Fed como o BCE estão
agindo de forma decisiva para rapidamente trazer de volta a racionalidade de investidores e intermediários financeiros. Há muito boas
chances de conseguirem. Mas, se
fracassarem, o crescimento do mundo todo será reduzido. Nem mesmo
o dinamismo da China e de outros
países asiáticos deixará de ser afetado nessa hipótese. E o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva também
poderá descobrir que o problema
não é só "dos americanos".
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 64, engenheiro e
economista, é economista-chefe da Quest Investimentos.
Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações
(governo FHC).
lcmb2@terra.com.br
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