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LUÍS NASSIF
A trégua no plano externo
O governo Lula ganhou
uma carência de dois a
três anos para resolver o pepino
externo brasileiro. A opinião é
de Júlio Sérgio Gomes de Almeida, diretor técnico do Iedi (Instituto de Estudos de Desenvolvimento Industrial).
Sua avaliação tem dois ângulos. O primeiro, a redução da
"prime", a taxa de juros básica
norte-americana, criando uma
folga no pagamento dos juros.
O segundo, a balança comercial, cujo saldo, em 2002, já está
em US$ 10,4 bilhões.
Parte relevante desse resultado se deveu à redução das importações. Só que ela não será
permanente: 50% referem-se a
importação de eletrônicos e
material elétrico, por conta da
crise de energia e do fim do ciclo
das telecomunicações. Em setores duros, como a química, houve redução no valor por conta
dos preços internacionais, porque houve aumento em volume.
No período de janeiro a setembro, a pauta de importação
de bens de consumo caiu de
US$ 4 bilhões para US$ 3,2 bilhões em relação ao mesmo período do ano passado. Desse total, no entanto, US$ 600 milhões foram de redução de importação de automóveis, e apenas US$ 200 milhões referentes
aos demais itens.
Haverá de dois a três anos de
uma trégua que permitirá algum crescimento do produto,
sem a explosão das importações. Passada essa trégua, haverá novo "boom" das importações, com novos produtos de informática e de eletrônica de
consumo, com a implantação
da TV digital.
O Iedi analisou outros países
que passaram por processo agudo de desvalorização cambial,
como Rússia, Coréia, México e
Espanha. Houve reversão drástica na balança comercial. O
pontapé inicial é uma queda
sensível das importações. No segundo ano, houve crescimento
vertiginoso das exportações.
Mas o México tinha o Nafta, a
Espanha tinha a União Européia, a Rússia tinha petróleo e a
Coréia tinha tecnologia. O Brasil terá de avançar fortemente
em novos setores e aproveitar o
momento para obter concessões
para entrar no mercado norte-americano.
Há algumas vantagens iniciais para o próximo ano. A primeira é a provável recuperação
dos preços de commodities internacionais, aparentemente
marcando o fim de um ciclo de
baixa que começou em 1997. A
segunda é a recuperação da
competitividade dos manufaturados brasileiros, fenômeno que
foi escondido pela crise da Argentina, que levou à queda de
70% das exportações brasileiras
para lá neste ano.
Mesmo assim, haverá enorme
desafio pela frente. A substituição fácil de bens de consumo
importados ocorreu no período
1999 a 2000, diz Júlio Sérgio.
Agora, se entra em fase mais
complexa, que exigirá investimento, atração de empresas internacionais para os setores duros.
Na opinião de Júlio Sérgio,
Lula acertou um golaço com a
bandeira da "Fome Zero". O segundo gol teria de ser o de
transformar o Brasil em base
exportadora. Até agora, a globalização da economia brasileira se deu exclusivamente pelo aumento das importações.
Chegou a hora de um grande
programa de atração de investimentos nacionais e internacionais para os chamados setores intensivos de capital.
Apesar dos grandes movimentos das multinacionais na
década de 90, Júlio sustenta haver espaço para realocação das
filiais. A recessão internacional
parou o novo ciclo de expansão
das multinacionais, diz ele.
Mas o novo ciclo irá procurar
distribuição geopolítica mais
eqüitativa. A China começa a
ser perseguida pelo fantasma
de uma crise bancária. A Índia
virou zona quase conflagrada.
Esses fatores pesarão na redefinição das filiais. E, retomada a
normalidade política, o Brasil
se apresenta como alternativa
atraente de segurança e crescimento.
O México ocupou esse espaço,
mas recorrendo ao caminho fácil da maquiagem. Ao se abastecer com fornecedores asiáticos, não resolveu o problema
geopolítico. O Brasil está optando por um caminho mais difícil,
de agregar valor, porém mais
consistente.
Para tanto, diz Júlio Sérgio, a
Alca adquire papel fundamental, desde que, nas questões comerciais, o país inclua os argumentos de ordem geopolítica.
E-mail - lnassif@uol.com.br
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