São Paulo, domingo, 15 de janeiro de 2006

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OPINIÃO ECONÔMICA

A questão da produtividade

JOSÉ ALEXANDRE SCHEINKMAN

Um estudo da Consultoria Tendências, coordenado por Guilherme Maia, indica uma queda em 2003-2005 da taxa de crescimento da produtividade no Brasil. Cálculos de aumento de produtividade em períodos curtos são notoriamente imprecisos, mas os números não deixam de preocupar.
Nos cálculos mais simples do aumento de produtividade, mede-se o crescimento do estoque de capital no país que resulta dos investimentos e o acréscimo no número de horas trabalhadas. O crescimento do produto que não pode ser atribuído a esses dois fatores é imputado ao aumento da produtividade.
Embora o crescimento da produtividade seja calculado como um resíduo, ele sintetiza fatores cruciais para o desenvolvimento: O aumento da qualidade da força de trabalho, a adoção de novas tecnologias e a melhoria da qualidade do ambiente produtivo. Com o investimento, esses componentes são responsáveis pelo enriquecimento das nações.
Examinando um período mais longo, a produtividade no Brasil cresceu 2,7% ao ano em 1999-2005. Essa taxa é aproximadamente a mesma que prevalece desde o Plano Real e representa uma melhoria sobre o desempenho em 1981-1993, quando o crescimento da produtividade foi nulo. Mas é ainda baixa levando em conta o quadro mundial. Nos EUA, a produtividade aumentou mais de 3% ao ano no século 21 e, como o país cria boa parte da fronteira tecnológica, espera-se que a produtividade cresça aí menos do que em nações como o Brasil, que podem beneficiar-se da transferência de tecnologias. De fato, em muitos países emergentes a produtividade está crescendo a taxas superiores à americana.
Há várias razões para o mau desempenho da produtividade no Brasil, mas quero aqui destacar três que são da maior importância:
1) A crescente informalização da nossa economia. A evidência mostra que empresas informais, por serem pequenas, não conseguem aproveitar ganhos de escala e por isso são menos produtivas. Essas firmas só sobrevivem porque escapam à pesada carga tributária.
2) A baixa taxa de investimento em infra-estrutura. Na computação da produtividade, considera-se o aumento do estoque de capital em geral, mas estudos demonstram que os investimentos em infra-estrutura têm um papel essencial no crescimento. A taxa de investimento no Brasil já é baixa, mas a regulamentação precária para setores como o de energia elétrica e a falta de investimentos do setor público resultaram em uma infra-estrutura extremamente inadequada.
3) A pouca importação de bens de capital. Estudos microeconômicos demonstram que o crescimento de produtividade americana concentrou-se em setores que fabricam ou que usam intensamente as novas tecnologias de informação. O nível ainda alto de proteção à indústria nacional priva o país de se favorecer plenamente desses avanços.
Nenhum desses problemas é insolúvel. A informalidade diminuirá quando tivermos menos burocracia e um sistema tributário mais racional. Os investimentos privados em infra-estrutura responderão a uma definição favorável do ambiente regulatório. Um governo que gasta, não contando os juros, quase um terço do PIB tem a capacidade de fazer mais investimentos públicos sem aumentar impostos. E, apesar das dificuldades que temos enfrentado para obter concessões dos países ricos na agricultura, não podemos adiar para sempre a diminuição das alíquotas de importação nos produtos industriais.
É provável que os números de 2003-2005 sejam revistos no futuro, mas a questão da produtividade no Brasil permanece. O melhor seria que governo e oposição decidissem, apesar das eleições, que o Brasil não pode adiar por mais um ano as medidas necessárias.


José Alexandre Scheinkman, 57, professor de economia na Universidade Princeton (EUA), escreve quinzenalmente aos domingos nesta coluna.

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jose.scheinkman@gmail.com


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