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PROTECIONISMO
Para chanceler, a boa oferta dos EUA foi para os países do Caribe e da América Central; a ruim, para o Mercosul
"Essa Alca não se vende", diz Brasil aos EUA
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A TÓQUIO
"Assim não dá para vender a Alca no Brasil."
Foi essa a primeira resposta oficial do governo brasileiro à oferta
norte-americana de liberalização
comercial no âmbito da Área de
Livre Comércio das Américas,
apresentada na terça-feira.
A frase foi pronunciada pelo
chanceler Celso Amorim diretamente para Robert Zoellick, chefe
do United States Trade Representative, uma espécie de Ministério
de Comércio Exterior dos EUA.
Amorim queixou-se, em especial, do que chama de "segmentação" proposta pelos norte-americanos: a oferta melhor foi para os
países do Caribe e da América
Central e, "a pior, para o Mercosul", na avaliação do chanceler.
"Ou bem se está falando de uma
Área de Livre Comércio das Américas ou bem se está falando de vários acordos segmentados", atacou Amorim. Mais: "Para negociar com a América Latina, não
precisa de Alca".
Apesar das críticas, até certo
ponto duras, o chanceler fez todo
o equilibrismo verbal para não
transformar a divergência "em
uma questão de estridência". Propôs até "baixar o tom acrimonioso" que ele viu em comentários
nos jornais (alguns deles, aliás,
feitos por subordinados de Amorim).
A tentativa de equilibrar a crítica com uma "estridência" reduzida reflete a armadilha colocada
para o Brasil pelas negociações da
Alca.
A armadilha funciona assim: o
Brasil "tem muito interesse no
mercado norte-americano", como diz o ministro, o que é, de resto, óbvio, por se tratar do maior
mercado do mundo.
O Brasil teme, também, perder
as vantagens comerciais de que
hoje goza nos países latino-americanos, quando elas forem estendidas aos Estados Unidos, cuja produção é muito mais competitiva.
Mas, ao mesmo tempo, o governo precisa de uma oferta norte-americana mais suculenta, sob
pena de "tornar difícil a articulação necessária para que o Brasil
apresente uma proposta significativa", sempre segundo Amorim.
É uma alusão às restrições que
setores do PT e do movimento social ligado ao partido fazem à negociação da Alca, que o próprio
presidente Luiz Inácio Lula da Silva já chegou a considerar uma
"anexação" do Brasil pelos EUA.
A Alca vale a pena
Como a proposta norte-americana foi considerada tímida, a
brasileira será ainda mais: em
princípio, apenas 36% do que o
Brasil importa dos parceiros da
Alca (excluídos os do Mercosul,
que farão proposta conjunta com
o Brasil) serão liberalizados em
um prazo de dez anos.
Os EUA ofereceram eliminar a
tarifa de importação para cerca de
65% das importações de bens de
consumo e produtos industrializados e 56% das importações
agrícolas.
A proposta brasileira já está
pronta, mas precisa ser compatibilizada com os sócios do Mercosul, para ser apresentada na semana que vem.
De todo modo, Amorim fez
questão de lembrar que tanto a
oferta norte-americana como a
brasileira são um primeiro momento da negociação, cujo prazo
encerrou-se ontem.
A partir dele, abre-se uma nova
etapa que é a de pedidos de melhora das ofertas feitas, culminando em julho com a apresentação
das propostas já revistas.
Até lá, Amorim e Zoellick terão
um novo encontro, já agendado
para o início de maio. Vão discutir, na versão do chanceler brasileiro, "se a Alca vale a pena, que
Alca vale a pena e como chegar a
essa Alca".
Nessa discussão, entrará, obviamente, um segundo ponto da crítica brasileira à oferta norte-americana: o fato de que ela trata apenas de tarifas, quando as principais barreiras aos produtos brasileiros nos Estados Unidos são
não-tarifárias (antidumping, subsídios internos, cotas e restrições
fitossanitárias, entre outras).
A eliminação dos subsídios à
agricultura, principal reivindicação do Brasil nas negociações comerciais em que está envolvido,
só terá mesmo algum tipo de evolução no âmbito da OMC (Organização Mundial do Comércio).
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