São Paulo, domingo, 15 de fevereiro de 2004

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Financiamento barato inflou preços, que, para economistas, são insustentáveis

Imóveis alimentam bolha de US$ 3 trilhões nos EUA

CÍNTIA CARDOSO
DE NOVA YORK

Os imóveis nos Estados Unidos nunca estiveram tão caros. A média nacional dos preços nos últimos oito anos está aproximadamente 35 pontos percentuais acima da taxa de inflação.
A valorização excessiva alimenta uma bolha de US$ 3 trilhões, segundo o Cepr (sigla em inglês para Centro de Pesquisa Econômica e Política, "think tank" baseado em Washington).
O governo, leia-se o Fed (banco central dos EUA), não faz referências à formação de uma bolha no mercado imobiliário. Para certos economistas, porém, os sinais são inegáveis.
O primeiro deles é a insustentabilidade da manutenção dos preços dos imóveis nos patamares atuais. Um dos grandes impulsos para a compra de imóveis nos Estados Unidos nos últimos anos têm sido as taxas de financiamento de hipotecas em níveis historicamente baixos.
Para contratos de 30 anos, a taxa anual média beira 6%. Uma elevação -ainda que modesta- nos juros do Fed pode provocar uma alta das taxas de financiamento. Na avaliação de Dean Baker, co-diretor do centro, isso já seria o suficiente para provocar o estouro dessa bolha.
Mas esse processo pode ser detonado pela própria dinâmica do mercado imobiliário. "O preço dos aluguéis não está crescendo nas mesmas proporções encontradas na venda de imóveis. Em algumas regiões, ele está até mesmo caindo", avalia o co-diretor do Cepr. Essa situação, diz o economista, derruba o argumento de que o aumento populacional é o principal responsável pela trajetória ascendente dos imóveis para venda.

Renda
Michael Youngblood, diretor de pesquisas da Gmac-RFC -uma das maiores do setor de hipotecas nos EUA-, tem um parecer semelhante. Mas ele aponta outras razões para demonstrar a existência de uma bolha.
"A variação dos preços das casas excede a variação da renda dos indivíduos", diz. Segundo o levantamento da empresa, o preço de casas nas 318 áreas metropolitanas estudadas subiu 5% em um ano (entre setembro de 2003 e setembro de 2002). Nessas mesmas regiões, a renda cresceu, em média, 3,1%.
Nas áreas onde houve uma maior disparidade entre a relação dos preços do imóvel e da renda, o economista apontou a formação de bolhas. No total, o levantamento detectou a formação de bolha em 29 mercados.
Pela definição de Youngblood, uma bolha existe quando uma espécie de espiral de expectativa de ganhos mais altos no futuro é o principal combustível para a alta dos preços.

Anos 90
Essa visão é corroborada por Baker. As origens da atual bolha imobiliária, explica, remontam a fins dos anos 90. "Esse processo começou com a ultravalorização do mercado acionário. Esses investidores tinham muito dinheiro em mãos para gastar com casas. As pessoas passaram a especular com os imóveis, sempre na expectativa de retornos cada vez mais altos", avaliou.
O estouro da bolha de tecnologia, em 2000, também pressionou o mercado de residências, ao provocar um êxodo de investidores de ações de tecnologia para o mercado imobiliário.
Hoje, alguns já vêem uma sobrevalorização do mercado acionário. "A média histórica da relação de retornos sobre os preços das ações é de 15 para 1. Hoje, vemos algo em torno de 24 para 1", afirmou Baker. O economista, porém, não vê bolha.
Mas a recessão -com depressão dos preços dos imóveis- pode ser muito mais grave que uma eventual implosão do mercado acionário. Hoje, 68% das famílias americanas têm imóveis, contra 52% das que possuem ações.



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