São Paulo, domingo, 15 de fevereiro de 2009

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VINICIUS TORRES FREIRE

O comércio mundial murcha


China, EUA, Alemanha e Japão exportam e importam menos; falta de crédito e mercado externos limitam PIB do Brasil

O BRASIL exportou bens no valor de mais ou menos US$ 200 bilhões no ano passado. A China exporta o mesmo valor em menos de dois meses. Os Estados Unidos levam ainda menos tempo. Tanto China como EUA têm visto seu comércio exterior declinar.
As exportações chinesas caíram mais de 17% em janeiro (em relação a janeiro de 2008). Alguém poderia achar que se trata de "boa notícia" -os chineses, e não apenas os brasileiros, estariam perdendo mercado. Bem, as importações chinesas declinaram 43%. No fim das contas, o superávit comercial chinês aumentou 100%, para US$ 39 bilhões (sempre na comparação anual).
O déficit comercial americano de dezembro foi o menor desde 2002 (é o dado mais recente). O déficit em conta corrente dos EUA deverá ter caído no final deste ano para uns 2,5% do PIB, ante um pico de mais de 6% do PIB em 2006 (o saldo da conta corrente registra as transações de bens, as comerciais, e também de serviços de um país com o resto do mundo). O déficit externo americano era um dos grandes desequilíbrios da economia mundial e é uma das causas da presente baderna. A redução do déficit americano, porém, não é agora uma boa notícia.
As exportações norte-americanas de bens caíram 9% em dezembro (ante janeiro de 2008). O déficit comercial caiu porque as importações declinaram ainda mais (cerca de 15%). Os problemas comerciais do Japão são ainda piores. O superávit comercial japonês caiu 23% em dezembro, com baixa de 35% nas exportações e 26,5% nas importações. O PIB japonês encolheu uns 3,5% no trimestre final de 2008. O comércio da Alemanha, um dos três líderes da exportação mundial, não sofreu tanto como o japonês, mas vai minguando em ritmo assemelhado ao do comércio americano.
E daí? Daí que um dos fatores mais importantes do crescimento brasileiro de 2004 a 2008 foi o extraordinário aumento do volume de comércio mundial. Além do mais, o volume de comércio e a oferta internacional de crédito e investimento determinam o ritmo possível de crescimento saudável para o Brasil.
Digamos que, por acaso, o país crescesse no ritmo de 4% até faz pouco propagandeado pelo governo. Nesse ritmo, é quase certo que ou o país importa mais produtos e faz mais déficit externo (como vem fazendo desde o final de 2007) e/ou a inflação sobe. Não há grande problema em ter um déficit externo, em nível controlado, desde que tal "dívida" possa ser coberta por investimento ou crédito externo. Não havendo capital externo, somos obrigados a torrar reservas internacionais (os dólares guardados como "seguro" no BC) e/ou ocorre uma desvalorização ainda maior do real.
O problema é que não há capital "sobrante" no mundo nem haverá, tão cedo. E, como se viu, as oportunidades de exportação já estão rareando. Logo, nossas contas externas agora sofrem a primeira ameaça razoável em cerca de seis anos. Enfim: o governo exagerar nos planos de estímulo econômico doméstico pode ser uma imprudência tão grande como deixar o mercado provocar um exagero recessivo. Deixar o PIB crescer a quase zero é arriscar-se a um ciclo vicioso, de graça; crescer a 4% é ora insustentável.

vinit@uol.com.br


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