São Paulo, sábado, 15 de março de 2008

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ROBERTO RODRIGUES

Ramos e Páscoa

Foram a agricultura, a pecuária, o agronegócio que trouxeram o progresso para qualquer rincão deste imenso país

AMANHÃ É Domingo de Ramos. E na semana que vem tem Páscoa. Não dá para esquecer a comemoração pascal há 60 anos, quando vivíamos numa fazenda, no norte de São Paulo, e um tio era diretor da Gardano, fabricante de chocolates.
Aquele era outro tempo. O telefone era na parede, de manivela, e, a telefonista "morava" na central. As estradas, de terra, ficavam intransitáveis durante o período de chuvas e insuportavelmente poeirentas na seca. Uma viagem para Ribeirão Preto, a 50 quilômetros de distância, precisava ser muito bem planejada, para não ficar no caminho. Nas fazendas, fazia-se de tudo: toda a comida, inclusive massas, roupas, brinquedos, móveis.
Chocolate era um pitéu raro. Não havia. Mas, na semana da Páscoa, meu tio mandava de São Paulo, de trem, um caixotinho de madeira com ovos e bombons. Era uma festa! No Domingo de Ramos, marcado pela ida à missa com folhas de palmeira, começava a espera, e a molecada ia todo dia com a charrete, esperar o correio na estação de trem, a poucos quilômetros, só para ver o caixote; só ver, nem pensar em abrir. Depois vinha toda a solenidade de esconder os ovos, procurar, achar e disputar os bombons preferidos, no Domingo de Páscoa.
E hoje? Ora, hoje a gente pega o telefone e fala em Tóquio como se estivesse conversando na sala de visitas. Vai a Ribeirão Preto para ver um filme e volta, mais depressa do que ir a um cinema em São Paulo.
Naquele tempo, quando quebrava um rolamento de um trator, a máquina ficava três ou quatro dias parada, esperando vir a peça, de jardineira, encomendada por telegrama à capital. Hoje, em três horas está tudo funcionando.
E o que fez essa mudança? Como esse progresso formidável começou, fazendo de Ribeirão Preto uma cidade com magníficos hospitais e universidades, com todos os serviços da melhor qualidade? O que fez o progresso de Londrina, Maringá e Cascavel, no Paraná? De Chapecó, em Santa Catarina? De Uberaba, Uberlândia, Montes Claros, em Minas Gerais? De Rio Verde, Itumbiara, Quirinópolis, em Goiás? De Rondonópolis e Cáceres, em Mato Grosso? De Campo Grande e Dourados, em Mato Grosso do Sul? De Passo Fundo e Não me Toque, no Rio Grande do Sul? De Luiz Eduardo, na Bahia? De Balsas, no Maranhão? De todo esse interiorzão brasileiro?
Foram os produtos da agropecuária. Os fazendeiros precisaram de estradas para trazer insumos e escoar a produção. De serviços para financiá-la, comercializá-la, armazená-la, de indústrias para transformá-la, de energia para tocar as indústrias, de comunicação para modernizar os processos de gestão, da tecnologia para competir, de equipamentos, de faculdades de agronomia e escolas técnicas.
Foram a agricultura, a pecuária, o agronegócio que trouxeram o progresso para qualquer rincão deste imenso e generoso país. Depois da produção rural, e por causa dela, vieram as indústrias -tanto de insumos como de transformação- e todos os serviços. Para servir à agricultura e dela se servirem. Para, em simbiose, crescerem juntos e fazerem crescer o país.
Amanhã é Domingo de Ramos. E no outro será a Páscoa. Com chocolates. E, graças aos produtores de cacau, de leite, de açúcar, de amêndoas diversas, vamos, mais uma vez, celebrar docemente a Ressurreição...


ROBERTO RODRIGUES, 65, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal, foi ministro da Agricultura (governo Lula). Escreve aos sábados, a cada 15 dias, nesta coluna.


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