São Paulo, terça-feira, 15 de abril de 2008

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Alta dos juros afetará crescimento, diz Ipea

Ligado ao governo, instituto aponta "temor excessivo do BC" e prevê contração nos investimentos caso Selic tenha alta

Para um dos autores do estudo, divergências de opiniões com o Banco Central refletem "heterogeneidade" existente no governo Lula

JANAINA LAGE
DA SUCURSAL DO RIO

Estudo divulgado ontem pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), órgão ligado ao governo, diz que um aumento dos juros básicos pode comprometer o crescimento sustentado da economia. O Copom (Comitê de Política Monetária) se reúne a partir de hoje, e a alta dos juros é dada como certa pelo mercado. Hoje, a taxa está em 11,25% ao ano.
De acordo com a nota técnica, o BC já indicou claramente que pretende realizar uma alta preventiva na Selic com a justificativa de que, dessa forma, poderia minimizar os custos da estabilidade de preços.
"Uma contração monetária seria um tremendo banho de água fria no espírito empresarial, o que pode reduzir drasticamente a sustentabilidade do atual ciclo de crescimento. Ainda que uma elevação da Selic não interrompa os investimentos já em curso, ela certamente inibiria novos investimentos. Aí, sim, a expansão da demanda poderia comprometer a estabilidade dos preços", diz o estudo do Ipea, órgão dirigido por Marcio Pochmann, contumaz crítico da política monetária.
Para os autores da nota técnica, Miguel Bruno, Salvador Vianna e André Modenesi, o cenário atual requer cautela, mas o Banco Central deveria optar pela manutenção da taxa. Vianna atribui o comportamento do BC ao medo de errar. "O que se observa é um temor excessivo do BC, um grande conservadorismo. O presidente do banco reclamou dos grupos de interesse, como Fiesp e CNI, mas não menciona os interesses do mercado financeiro", disse.
A divulgação do estudo na semana do Copom é polêmica, dado que o Ipea é um órgão ligado ao governo. Segundo Vianna, a divergência sobre a condução da política monetária é uma realidade no atual governo. "Reflete a heterogeneidade presente no governo Lula. Ele arbitra esses conflitos."
Para Miguel Bruno, não há nenhum tipo de evidência empírica que mostre a necessidade de alta da taxa, e o BC deveria apresentar à sociedade dados que comprovem a necessidade de subir os juros. Questionados sobre a possibilidade de um único aumento na taxa causar impacto negativo sobre os investimentos, os pesquisadores afirmaram que, caso o Banco Central opte por elevar a taxa, o movimento não deve se restringir a um único aumento.
Segundo Bruno, o BC interpreta processos de recomposição de custos e recuperação de margens como sinais de descontrole inflacionário. "O investimento no Brasil é muito sensível porque há 25 anos tem taxas baixas de expansão."
O impacto da alta seria ainda mais expressivo para os exportadores. "Se a Selic subir ainda mais, esse diferencial se ampliará, anulando o efeito do IOF sobre as entradas de capitais de curto prazo. Aí, sim, o dólar vai derreter, sepultando de vez a ilusão da eliminação da vulnerabilidade externa da economia brasileira."
Um dos fatores que permitiriam a manutenção da taxa é o aumento de produtividade. Segundo o Ipea, a indústria de transformação obteve ganhos de produtividade acumulados em 12 meses da ordem de 4,5% no mês de janeiro. O custo unitário do trabalho acumulou queda de 1,2% no período.
Além disso, ressalta que a massa salarial ficou estável em relação ao PIB. O Ipea destaca ainda que o aumento da utilização da capacidade tem sido acompanhado pela alta do investimento. "Se a produtividade cresce proporcionalmente mais que a utilização da capacidade, é possível atender ao crescimento da demanda sem gerar pressões por aumento de preços", diz o estudo.


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