|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Governo investiga venda de soro hospitalar
Laboratórios são suspeitos de vender abaixo do preço de tabela, enquanto hospitais cobram valor "cheio" de planos e pacientes
Estratégia faz empresas barrarem rivais e obterem exclusividade para fornecer o soro, mas benefício não chega aos consumidores
FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL
A SDE (Secretaria de Direito
Econômico), do Ministério da
Justiça, e o Gedec (Grupo Especial de Repressão aos Delitos
Econômicos), do Ministério
Público do Estado de São Paulo, abriram investigação para
apurar suspeita de infração à
ordem econômica cometida
por três fabricantes de Solução
Parenteral de Grande Volume
(SPGV), popularmente conhecida como soro hospitalar. É
um mercado que deve movimentar cerca de R$ 1 bilhão
neste ano no Brasil.
A Baxter Hospitalar, a B.
Braun e a HalexIstar são suspeitas de venderem produtos
para hospitais e clínicas a preços abaixo dos da tabela da
CMED (Câmara de Regulação
do Mercado de Medicamentos), prática que, num primeiro
momento, parece até beneficiar o consumidor. Só que, na
hora de pedir reembolso de planos de saúde e de clientes particulares, hospitais e clínicas cobram o preço "cheio" e ficam
com a diferença. E os fabricantes ganham a exclusividade no
fornecimento do produto.
A denúncia da conduta das
três fabricantes à SDE foi feita
pela CMED -que reúne seis
ministérios- há cerca de um
ano. A entidade, que estabelece
preço-teto para os medicamentos, chegou a discutir o caso
com as três empresas -que admitiram a prática, segundo relatório da Câmara-, mas não
conseguiu acordo para registrar preços menores dos soros
hospitalares. A CMED não pode reduzir unilateralmente
preços de medicamentos.
A SDE e o Ministério Público
entendem que a "conduta promove graves barreiras à entrada de concorrentes no mercado", já que o incentivo para que
hospitais e clínicas adquiram as
soluções passa a ser a diferença
entre o preço de compra e o de
reembolso, e não a variedade e
a qualidade dos produtos. O
consumidor é prejudicado porque tem de pagar mais pelo plano de saúde.
"A SDE instaurou processo
administrativo para verificar se
a conduta das três empresas
prejudica a concorrência e o
consumidor. Também vamos
investigar os hospitais, os mais
representativos do país, pois,
num primeiro momento, quem
paga a conta são os planos de
saúde, e, num segundo momento, os consumidores", diz
Ana Paula Martinez, diretora
do Departamento de Proteção
e Defesa Econômica da SDE. A
SDE deve estender a investigação para medicamentos. Procurada, a CMED não se pronunciou sobre as investigações.
Concentração
As três empresas tinham em
2006, segundo informações da
CMED, cerca de 90% do mercado de soro hospitalar em embalagem de sistema fechado,
aquele que não permite o contato da solução com o ambiente
durante o preparo e a administração. Essa participação deve
ter diminuído, pois outras empresas entraram no mercado.
Em 2007, a Anvisa (Agência
Nacional de Vigilância Sanitária) obrigou as empresas a
substituírem as embalagens de
sistema aberto por fechado
-adotado em outros países-, o
que minimiza riscos de infecções hospitalares.
A Abrasp (Associação Brasileira de Produtores de Solução
Parenteral) informa que existem no país 13 fabricantes de
soro hospitalar em sistema fechado. Essas empresas fabricam cerca de dez formulações
diferentes de produtos em cerca de 40 apresentações. No total são vendidos por ano cerca
de 480 milhões de unidades.
Os hospitais, segundo relatório da CMED, não podem comercializar medicamentos
nem cobrar de planos de saúde
e pacientes preço diferente do
que pagou. Eduardo de Oliveira, presidente da Federação
Brasileira de Hospitais, diz que
o que o hospital não pode é pedir reembolso de preço acima
do preço-teto da CMED, o que
vale para medicamentos.
Na prestação de serviços que
envolvam fornecimento de medicamentos, segundo relatório
da CMED, hospitais têm direito a receber de pacientes particulares ou de planos de saúde
reembolso, que representa a
devolução da quantia desembolsada, não configurando atividade de revenda.
Na denúncia encaminhada à
SDE, a CMED cita ainda que há
evidências de que as três empresas têm preços de tabela
próximos e vendem esses produtos a preços mais baixos.
Notas fiscais reunidas na investigação mostram que algumas das soluções que tinham
preço de tabela entre R$ 5 e R$
6 eram comercializadas por R$
1,60 a R$ 1,90 para hospitais e
clínicas. Há caso de um produto, como a solução glicose 10%
de 1000 ml, que tem preço de
tabela de R$ 14,20, mas foi vendida por R$ 2,77.
Gilberto Leme Marcos Garcia, promotor do Gedec, do Ministério Público do Estado de
São Paulo, diz que o grupo vai
investigar a prática das três empresas. "São fortes as suspeitas
de condutas que infringem a
ordem econômica e de prática
de estelionato, já que há indícios de que essa conduta ocorra
em grandes hospitais particulares em São Paulo", afirma.
Arlindo de Almeida, presidente da Abramge, associação
que reúne os planos de saúde
de medicina de grupo, diz que
essa prática de descontos é antiga e que as operadoras, cientes, "procuram impedir esse
ação por meio de auditorias".
Texto Anterior: Mercado Aberto Próximo Texto: Outro lado: Laboratório diz que preço está em discussão Índice
|