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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
A economia reage sempre
AS ECONOMIAS modernas sempre apresentam reações racionais aos estímulos de mercado ou da política econômica dos
governos. O que diferencia os vários
países é a intensidade e a rapidez
dessas reações. Elas são mais intensas e rápidas nas economias com
maior flexibilidade e eficiência e demoram mais a acontecer nos países
com mercados mais controlados e
com ineficiências operacionais. Já
falei, em outra oportunidade, sobre
a influência poderosa que uma Bolsa
de Futuros, como a nossa BM&F,
exerce hoje no processo de ajuste de
uma economia de mercado.
Mas, independentemente da eficiência de uma economia, as reações
sempre ocorrem. Tomemos o exemplo do Brasil nestes últimos anos. A
extraordinária virada estrutural em
nosso balanço de pagamentos provocou uma mudança sensível em
nosso sistema econômico. Libertada do fantasma de uma crise externa
sempre iminente, característica dos
anos anteriores a 2004, a economia
brasileira passou a trabalhar com
riscos muito menores, principalmente no que se refere ao clássico e
recorrente círculo vicioso: súbita
desvalorização cambial, aumento da
inflação e aperto na política monetária. O resultado é uma modificação importante no funcionamento
da economia, que ainda não foi devidamente debatida e compreendida.
Nesta coluna, quero refletir sobre
os impactos da forte influência do
governo, no contexto atual de ampla
disponibilidade de dólares, em dois
dos preços mais importantes da economia: a taxa de câmbio e os juros.
Esses preços estão sendo monitorados com mão-de-ferro, e a equipe
econômica não permite que respondam às condições vigentes, principalmente os juros. Em razão disso, a
economia reage, criando forças próprias que não apareceriam se a política econômica atual estivesse sendo operada com o diagnóstico correto e esses preços refletissem melhor
o que está acontecendo.
Como se dá isso? O ajuste externo
permitiu -e continuará a fazê-lo- a
estabilização da taxa de câmbio em
nível valorizado, incentivando os
agentes econômicos a ativar cada
vez mais os canais de importação
(também tenho mencionado na coluna que a má qualidade da política
econômica implica "vazamento"
crescente do crescimento para o exterior). A redução do risco externo, o
câmbio valorizado e o aumento das
importações são fatores determinantes para a rápida redução da inflação. Nem mesmo os fatores temidos pelo Copom -a eleitoreira expansão fiscal, o aumento do crédito
e os efeitos da redução, modesta, dos
juros nos últimos nove meses- têm
sido suficientes para interromper a
queda da taxa de inflação.
É cada vez mais evidente que o
ajuste externo da economia brasileira permite que o país trabalhe com
uma taxa de juros real muito abaixo
da que vigorou no passado recente.
A taxa de juros deveria estar sendo
reduzida mais rapidamente, e a lentidão do Copom só pode ser explicada por uma visão equivocada das
forças dominantes no contexto
atual, mesmo após serem considerados os riscos. O resultado é uma taxa
de inflação muito inferior à meta explicitamente perseguida pelo Banco
Central e um crescimento econômico também abaixo do potencial, que,
diga-se de passagem, também não é
nenhuma maravilha.
A inflação medida pelo IPCA deve
fechar o ano ao redor de 3%, e não
vejo por que não possa ficar no mesmo nível em 2007. Digo isso porque
trabalho com um cenário de baixa
volatilidade da taxa de câmbio e
crescente competição das importações, em razão de dois fatores. Primeiro porque nossos canais de importação estão se sofisticando e aumentando sua abrangência.
O ajuste externo permite que o país trabalhe com juro real menor do que aquele que vigorou no passado recente
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Em segundo lugar, porque a desaceleração
da economia americana vai aumentar os esforços de exportação dos
chineses para outros mercados. Voltarei a esse tema, pois tenho recebido informações importantes dos
movimentos chineses na América
Latina e que afetarão nossa economia já em 2007.
Com câmbio estável e pressão
maior das importações, o cenário da
inflação deve ser benigno, e nosso
crescimento econômico pode até
ser menor que o de 2006. Como o
Banco Central parece não estar considerando adequadamente os fenômenos descritos, os juros estarão
sempre acima do necessário para
restaurar o crescimento sem comprometer a meta de inflação. Em razão dessas distorções, a economia
vai responder com menos inflação e
menos crescimento econômico. Será sua vingança.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS , 63, engenheiro e
economista, é economista-chefe da Quest Investimentos.
Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações
(governo FHC).
lcmb2@terra.com.br
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