São Paulo, sábado, 16 de fevereiro de 2008

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ROBERTO RODRIGUES

Recessão americana e preços agrícolas

Os produtores aumentarão as áreas de plantio e, em poucos anos, o equilíbrio entre oferta e procura será restabelecido

OS PREÇOS agrícolas estão bem mais altos em 2008 do que na média dos últimos anos (2004/2006), quando a crise brasileira no setor rural foi enorme.
Alguns economistas afirmam que atingimos um novo patamar de preços das principais commodities agrícolas, e há até noticiário na imprensa mundial dizendo que "acabou a comida barata". Não é primeira vez que se especula dessa maneira sobre a variação dos preços.
Há um desequilíbrio entre a oferta e a demanda de alimentos provocado por vários fatores: por um lado, houve um espetacular crescimento da demanda, determinado pelo aumento de renda dos consumidores dos países em desenvolvimento; e, por outro, a oferta caiu, seja porque houve seca em várias regiões do planeta, desde a Austrália até a América do Sul, passando pela Europa, seja porque boa parte da safra americana de milho foi desviada para a produção de álcool. O resultado disso é que os estoques mundiais despencaram e os preços subiram.
Em 1999/2000, os estoques de milho eram de 192,9 milhões de toneladas e no ano passado caíram para 101 milhões; os de trigo, de 208,9 milhões de toneladas para 124,2 milhões, e os de arroz, de 145,1 milhões de toneladas para 75,6 milhões. Mas não dá para afirmar que temos um novo patamar de preços.
Bem remunerados, os produtores aumentarão as áreas de plantio e, em poucos anos, o equilíbrio entre oferta e procura será restabelecido, de modo que os preços deverão retornar os seus níveis naturais. No máximo cairão menos.
O Brasil tem um papel determinante nesse rebalizamento de produção x consumo, pela grande capacidade de expansão da sua fronteira agrícola. Dados recentes do Ministério da Agricultura informam que, nos próximos dez anos, em nosso país a produção de soja poderá crescer 30,9%, a de milho, 25,6%, a de açúcar, 40,7%, a de arroz, 16,5%, a de carne bovina, 31,5%, e a de carne de frango, 46,8%. E isso permitiria ao país exportar muito mais, gerando empregos, renda e riqueza para os brasileiros.
No entanto, tudo isso depende de uma lição de casa ainda por terminar (logística, tecnologia, política de renda etc.) e de três novos problemas.
O primeiro, bem imediato, é o aumento de custos de produção, basicamente de fertilizantes, que nos últimos 12 meses subiram 109% (média das variações de preço dos quatro principais fertilizantes); o segundo é a crise americana: se ela se transformar em recessão e for profunda e extensa, acabará mudando esse cenário.
Isso porque terá um efeito dominó sobre países da Europa e da Ásia, que, além dos americanos, terão que apertar os cintos. Isso alteraria a relação oferta x demanda, com retração dessa última. E, contrariando a tese do "novo patamar", os alimentos teriam queda de preços.
Não obstante os fundamentos da economia brasileira estarem firmes, tal fato poderia determinar uma perda de renda para nossos agricultores. Mas, para 2008, isso não deve ser muito grave, porque boa parte da safra já foi negociada. Se, todavia, persistir a recessão e com os custos de produção aumentando, pode piorar muito o quadro para 2009, com novo descasamento da renda rural.
E o terceiro tem a ver com o embargo europeu à carne brasileira.
Uma demora na solução dessa questão terá efeitos negativos sobre toda a cadeia produtiva, inclusive nos preços dos grãos usados como alimento para o gado.


ROBERTO RODRIGUES, 65, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal, foi ministro da Agricultura. Escreve aos sábados, a cada 15 dias, nesta coluna.


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