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LIÇÕES CONTEMPORÂNEAS
Mais tiros no pé?
LUCIANO COUTINHO
Graças ao comércio com preços superfavoráveis às exportações, a economia brasileira conseguiu superar a vulnerabilidade
externa nos três últimos anos. A divida externa caiu de US$ 211 bilhões para US$ 169 bilhões; as reservas em moeda forte ascenderam
a US$ 60 bilhões -e tendem a
crescer. A gravíssima crise do PT e
do governo Lula praticamente não
afetou a trajetória da taxa de câmbio.
Essa extraordinária recém-adquirida robustez cambial pode ser
a base de um novo ciclo de crescimento com estabilidade de preços.
A partir de reformas consistentes
no campo fiscal (abrangendo a
previdência, as políticas sociais e a
gestão das máquinas estatais) será
possível conter a expansão dos gastos correntes do setor público, reduzir a dívida interna, aumentar
os investimentos e, mais importante, acelerar a redução da taxa de
juros. A economia brasileira poderá crescer firmemente a 5% ao ano,
com juro real básico abaixo de 6%
e classificação do risco-país em
"grau de investimento".
Mas esse novo ciclo pode ser comprometido se a apreciação prolongada da taxa de câmbio voltar a
fragilizar a posição cambial. O BC
vem errando gravemente em ter
permitido essa apreciação excessiva. Enquanto nossos concorrentes
seguraram a valorização de suas
moedas (na média, apenas 5% de
apreciação na Ásia e 10% na América Latina nos últimos 12 meses), o
real se apreciou significativamente
(22% só nos últimos 12 meses).
A continuada elevação dos preços das commodities mascara, por
enquanto, os efeitos negativos da
apreciação. Mas esses já estão em
curso e, inevitavelmente, se abaterão sobre o saldo da balança comercial. Empresas exportadoras
importantes (brasileiras e transnacionais) já deslocam investimentos
para outras economias com condições mais favoráveis. As estratégias
de importação começam a ganhar
corpo. Potencialidades e oportunidades de desenvolvimento competitivo estão sendo queimadas em
todos os setores, até mesmo nas cadeias mais competitivas.
A manutenção da robustez cambial é, sublinhe-se, condição-chave
para a política antiinflacionária,
ao viabilizar a redução da volatilidade da taxa de câmbio e ao defletir as maxidepreciações que sempre perturbaram a estabilidade de
preços no Brasil.
Ao permitir a apreciação excessiva, o Banco Central põe em risco a
robustez e semeia risco inflacionário futuro. A taxa de câmbio deve
flutuar dentro de uma faixa (entre
R$ 2,60 e R$ 2,90 por dólar) confortável para o equilíbrio de longo
prazo do balanço de pagamentos.
Essa é a trajetória estabilizadora
que previne choques e reduz a volatilidade. A atual é inequivocamente insensata.
O Brasil pode voltar a crescer a
5% ao ano, com juros reais civilizados, com investimentos e estabilidade de preços, desde que reformas regenerem a saúde fiscal e a
capacidade financeira do Estado.
Mas para chegar lá é urgente interromper a sobreapreciação destrutiva. O BC precisa utilizar mais intensamente o seu manancial de
instrumentos. Chega de oportunismo cambial!
Luciano Coutinho, 54, é professor titular
do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Foi
secretário-geral do Ministério da Ciência
e Tecnologia (1985-88).
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