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ANÁLISE
A economia está mesmo superaquecida?
FERNANDO SAMPAIO
ESPECIAL PARA A FOLHA
As mais recentes divulgações
de dados sobre a atividade econômica no país reforçaram o
coro dos que avaliam que o BC
irá começar a "pisar no freio", a
partir do final deste mês, com
atraso. Essa corrente avalia
também que o aumento dos juros básicos requerido para
manter a inflação na meta e as
expectativas inflacionárias sob
controle seria substancialmente maior que os 2,5 a 3 pontos
percentuais hoje projetados
pela maioria das instituições financeiras e consultorias.
Entre os dados recentes, destacam-se: a) a Pesquisa Mensal
do Comércio (divulgada na
quarta), que apurou que as vendas do varejo tiveram em fevereiro alta novamente mais forte
do que se antecipava e, além
disso, informou que as taxas de
crescimento dos meses anteriores, já expressivas, foram revistas para cima pelo IBGE; e b)
os números sobre o desempenho do mercado de trabalho
formal no mês de março. Novamente (como em fevereiro) o
saldo positivo entre admissões
e demissões de trabalhadores
com carteira de trabalho superou as expectativas.
Do ponto de vista setorial, o
resultado do Caged sinalizou
que o aquecimento da atividade
econômica continua a se espraiar. Descontadas as flutuações sazonais, de fevereiro para
março observou-se aceleração
das contratações líquidas na indústria, no comércio e sobretudo nos serviços, enquanto a
construção civil sustentou nível forte de admissões. Só na
agropecuária os números (novamente) não foram positivos
-o que faz pouca diferença nos
números da economia como
um todo, dado o peso bastante
limitado do setor no contingente total de empregados com
carteira.
Para além das vendas do varejo e do emprego formal (cujo
dinamismo volta a ser reforçado pela formalização de vagas
de trabalho preexistentes), outros números precisam ser levados em conta para avaliar as
tendências da inflação e a perspectiva para os juros. E alguns
desses números não se encaixam facilmente num diagnóstico de flagrante superaquecimento da economia.
A capacidade ociosa na indústria, por exemplo, desde dezembro deixou de se estreitar
rapidamente, tendo quase que
se estabilizado num nível inferior (em relevantes três pontos
percentuais) ao observado antes do agravamento da crise financeira global (em setembro-outubro de 2008). O levantamento da FGV sobre o nível
percebido de demanda interna
pela indústria de bens de consumo indica um moderado refluxo ante o "pico" do final de
2009. A mesma pesquisa indica
que o nível de produção previsto para os próximos meses pela
indústria de transformação como um todo se manteve praticamente estável de janeiro para
março, em nível também moderadamente inferior ao dos
meses derradeiros do ano passado. Em paralelo, as mais recentes leituras sobre a evolução
dos preços da indústria no atacado revelam uma marcante, e
importante, desaceleração.
É intuitivo que as reduções
temporárias de IPI, que se esgotaram no final de março
(com exceção apenas de móveis
e material de construção), estimularam um movimento significativo de antecipação de consumo. Sobretudo por isso, na
atual conjuntura é muito difícil
estimar com que força o consumo irá se desacelerar, comparativamente às taxas de expansão muito altas que vem exibindo desde meados de 2009.
Esses (e outros) elementos
sugerem que pode haver uma
dose relevante de precipitação
no diagnóstico de que a economia se encontra francamente
superaquecida.
FERNANDO SAMPAIO , economista,
é sócio-diretor da LCA Consultores.
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