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Dólar cai abaixo de R$ 2 pela 1ª vez em seis anos
Lula descarta intervir no câmbio e diz que saída é melhorar competitividade das empresas
Cenário é justificado pela propensão de estrangeiros a continuar investindo no país e pela aposta de que BC não conseguirá segurar cotação
TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL
O dólar comercial rompeu
ontem a barreira de R$ 2,00 pela primeira vez em seis anos e
alimentou a discussão sobre o
novo piso para o câmbio do
real, moeda que se valorizou
7,85% apenas neste ano.
No encerramento dos negócios, o dólar comercial, que passou o dia a R$ 1,99, terminou a
R$ 1,983, com baixa de 1,29%.
Foi o menor valor desde 12 de
fevereiro de 2001.
O real forte barateia as importações e ajuda a segurar a
inflação, mas tira competitividade de setores industriais ao
encarecer seus produtos diante
dos importados, gerando críticas de empresários.
O novo patamar histórico da
moeda brasileira foi justificado
ontem por dois motivos principais, um externo e outro interno. O externo foi a sinalização
de que o mundo continuará
com muito dinheiro para investir em países como o Brasil.
Essa percepção veio com a
divulgação de mais um indicador de inflação controlada nos
Estados Unidos, que sugere que
o Federal Reserve, o banco central dos EUA, não deve subir o
juro em breve e pode até derrubá-lo no futuro próximo.
O motivo interno é que o
Banco Central não tem mais
cacife para manter uma queda-de-braço em que fatalmente
sairá derrotado pelo mercado
financeiro, como no passado.
Apenas na semana passada, o
BC comprou mais de US$ 5 bilhões em moeda, e, mesmo assim, não conseguiu conter a
queda no câmbio. Com reservas na casa de R$ 130 bilhões, a
autoridade monetária não teria
mais como justificar o acúmulo
de dólares, que, além de render
pouco, embute um prejuízo
cambial crescente.
Pelo segundo dia seguido, o
BC manteve-se praticamente
alheio à derrocada do dólar. Em
meio à greve de servidores, o
BC só apareceu no mercado
exatamente às 15h35, quando
operadores já tinham praticamente limpado suas mesas.
Ofereceu comprar dólar a R$
1,984 e sinalizou que deixaria a
moeda abaixo de R$ 2.
O presidente Lula disse que o
governo tomará medidas para
auxiliar as empresas prejudicadas pela variação cambial, mas
que não haverá "milagre".
"O câmbio vai continuar sendo flutuante. O que precisamos
é ter medidas tributárias para
que as empresas brasileiras que
produzem e competem com
um produto, normalmente chinês, possam ter mais competitividade. O dólar vai se ajustar
na medida em que a gente comece a importar mais bens de
capital [máquinas], na medida
em que a gente comece a reduzir a taxa de juros", disse Lula
[leia entrevista em Brasil].
Apesar de a queda ser aguardada pelo próprio mercado,
não foi difícil encontrar operadores atônitos, tentando entender o que havia acontecido
no câmbio. Como acontece nos
dias de rompimento de barreiras psicológicas, houve até boatos de quebra de bancos e corretoras que estariam apostando num dólar mais alto e esperavam uma atuação firme do
BC -nada se confirmou. "Deve
ter muito banco que se complicou", disse Johnny Kneese, diretor da corretora Levycam.
"Precisamos ver o que o Banco Central vai fazer daqui para
a frente. Se a justificativa for a
greve [do BC], veremos o que
vai acontecer quando todos
voltarem ao trabalho. Só uma
mudança nos juros poderá
conter a queda do dólar", disse
Mário Batistel, da corretora
Novação.
Alex Agostini, da Austin Ratings, concorda que o dólar
abaixo de R$ 2,00 pressionará
o BC a baixar com maior velocidade os juros. Ele espera uma
queda de 0,5 ponto na taxa básica, a Selic, hoje em 12,5%.
"Com os índices de inflação
apontando para abaixo do centro da meta, não terá justificativa manter os cortes de 0,25
ponto", disse Agostini.
Juro alto atrai capital estrangeiro para os papéis brasileiros,
elevando a procura por reais e
fortalecendo a moeda. Outro
motivo que dá força ao real são
os sucessivos recordes das exportações brasileiras, apesar
do câmbio desfavorável, que
inundam o mercado de dólares.
Para Kneese, o pior cenário é
uma queda ainda maior e lenta
do dólar porque "vai testando a
cada dia um novo piso".
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