São Paulo, quarta-feira, 16 de maio de 2007

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Dólar cai abaixo de R$ 2 pela 1ª vez em seis anos

Lula descarta intervir no câmbio e diz que saída é melhorar competitividade das empresas

Cenário é justificado pela propensão de estrangeiros a continuar investindo no país e pela aposta de que BC não conseguirá segurar cotação


TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

O dólar comercial rompeu ontem a barreira de R$ 2,00 pela primeira vez em seis anos e alimentou a discussão sobre o novo piso para o câmbio do real, moeda que se valorizou 7,85% apenas neste ano.
No encerramento dos negócios, o dólar comercial, que passou o dia a R$ 1,99, terminou a R$ 1,983, com baixa de 1,29%. Foi o menor valor desde 12 de fevereiro de 2001.
O real forte barateia as importações e ajuda a segurar a inflação, mas tira competitividade de setores industriais ao encarecer seus produtos diante dos importados, gerando críticas de empresários.
O novo patamar histórico da moeda brasileira foi justificado ontem por dois motivos principais, um externo e outro interno. O externo foi a sinalização de que o mundo continuará com muito dinheiro para investir em países como o Brasil.
Essa percepção veio com a divulgação de mais um indicador de inflação controlada nos Estados Unidos, que sugere que o Federal Reserve, o banco central dos EUA, não deve subir o juro em breve e pode até derrubá-lo no futuro próximo.
O motivo interno é que o Banco Central não tem mais cacife para manter uma queda-de-braço em que fatalmente sairá derrotado pelo mercado financeiro, como no passado.
Apenas na semana passada, o BC comprou mais de US$ 5 bilhões em moeda, e, mesmo assim, não conseguiu conter a queda no câmbio. Com reservas na casa de R$ 130 bilhões, a autoridade monetária não teria mais como justificar o acúmulo de dólares, que, além de render pouco, embute um prejuízo cambial crescente.
Pelo segundo dia seguido, o BC manteve-se praticamente alheio à derrocada do dólar. Em meio à greve de servidores, o BC só apareceu no mercado exatamente às 15h35, quando operadores já tinham praticamente limpado suas mesas. Ofereceu comprar dólar a R$ 1,984 e sinalizou que deixaria a moeda abaixo de R$ 2.
O presidente Lula disse que o governo tomará medidas para auxiliar as empresas prejudicadas pela variação cambial, mas que não haverá "milagre".
"O câmbio vai continuar sendo flutuante. O que precisamos é ter medidas tributárias para que as empresas brasileiras que produzem e competem com um produto, normalmente chinês, possam ter mais competitividade. O dólar vai se ajustar na medida em que a gente comece a importar mais bens de capital [máquinas], na medida em que a gente comece a reduzir a taxa de juros", disse Lula [leia entrevista em Brasil].
Apesar de a queda ser aguardada pelo próprio mercado, não foi difícil encontrar operadores atônitos, tentando entender o que havia acontecido no câmbio. Como acontece nos dias de rompimento de barreiras psicológicas, houve até boatos de quebra de bancos e corretoras que estariam apostando num dólar mais alto e esperavam uma atuação firme do BC -nada se confirmou. "Deve ter muito banco que se complicou", disse Johnny Kneese, diretor da corretora Levycam.
"Precisamos ver o que o Banco Central vai fazer daqui para a frente. Se a justificativa for a greve [do BC], veremos o que vai acontecer quando todos voltarem ao trabalho. Só uma mudança nos juros poderá conter a queda do dólar", disse Mário Batistel, da corretora Novação.
Alex Agostini, da Austin Ratings, concorda que o dólar abaixo de R$ 2,00 pressionará o BC a baixar com maior velocidade os juros. Ele espera uma queda de 0,5 ponto na taxa básica, a Selic, hoje em 12,5%. "Com os índices de inflação apontando para abaixo do centro da meta, não terá justificativa manter os cortes de 0,25 ponto", disse Agostini.
Juro alto atrai capital estrangeiro para os papéis brasileiros, elevando a procura por reais e fortalecendo a moeda. Outro motivo que dá força ao real são os sucessivos recordes das exportações brasileiras, apesar do câmbio desfavorável, que inundam o mercado de dólares.
Para Kneese, o pior cenário é uma queda ainda maior e lenta do dólar porque "vai testando a cada dia um novo piso".


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