São Paulo, sexta-feira, 16 de junho de 2006

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LUÍS NASSIF

Varig e ignorância nacional

O fim da Varig demonstra que nem governos nem mercado estão preparados para um país moderno

AO LONGO de sua existência, no auge de seu poder, a Varig conseguiu derrotar, uma a uma, suas concorrentes. Em parte, pela competência; muito, pela influência política.
Foi um avião da Varig que transportou João Goulart da China para Porto Alegre, quando os militares ameaçaram não deixá-lo tomar posse. Foi em um avião da Varig que Ruben Berta transportou clandestinamente Walther Moreira Salles a Porto Alegre, num regime parlamentarista.
Mudou o regime, não a influência da Varig. No regime militar, sua influência ajudou no fim da Panair, de quem herdou os espaços nos aeroportos. Depois, incorporou a Cruzeiro do Sul. Seu poder era fantástico nos tempos de um país fechado, em que uma viagem ao exterior era considerada "jabá" que encantava políticos e jornalistas.
Ruben Berta morreu. Seu sucessor, Hélio Smidt, ampliou a influência da Varig. Mas, já em sua gestão, o modelo de governança implantado por Berta começava a fazer água.
Feudos começaram a se estratificar na companhia. Como um imperador, Smidt distribuía benesses. Cada vez mais a Varig ia se burocratizando na gestão. Na linha de frente, mantinha a qualidade do atendimento, a excelência dos pilotos, da manutenção.
Smidt morreu, logo depois de ter sido envolvido por Mário Garnero no episódio Brasilinvest, nos anos 80. Seu sucessor, Rubel Thomas, acabou de afundar a Varig. Sob seu comando, surgiu a Rio-Sul, uma empresa de excelência que, durante certo período, chegou a rivalizar com a TAM em qualidade de atendimento.
O presidente da Varig, Fernando Pinto, foi demitido, acusado de incompetente. Mudou-se para Portugal, salvou a TAP e se tornou o mais prestigiado executivo do país. Thomas foi demitido, contratado pela TAM, e quase deixa a companhia em maus lençóis por sua megalomania na montagem das linhas internacionais.
Na época da saída de Thomas, a Varig já estava começando a degringolar. Ano após ano, a situação ia piorando. Pouco antes de morrer, o comandante Rolim, da TAM, estava articulando com o então presidente da Varig, Ozires Silva, uma maneira de assumir a empresa, tentar recuperá-la e, mais adiante, promover uma fusão com a TAM. Sua morte frustrou os planos.
Depois disso, era questão de tempo para a Varig desaparecer. Uma atuação decisiva de governos, de FHC ou de Lula, de credores, da própria Justiça teria permitido à companhia se salvar, surgir uma nova Varig, com novos controladores, preservando empregos, linhas e o nome Varig. Nada disso ocorreu. FHC fugiu do problema Varig da mesma maneira irresponsável que seu sucessor Lula.
Na imprensa, o caso Varig era afogado por um mar de desinformação, de quem não conseguia entender que quem deve ser punido por má gestão são gestores, não empresas.
Recuperar uma empresa não significa premiar seus controladores, se eles forem afastados e punidos por seus erros. É ato de racionalidade.
O fim da Varig é o atestado maior da ignorância nacional. É a demonstração de que nem governos, nem Judiciário, nem mercado e credores estão preparados para um país moderno. O fim da Varig é a comprovação cabal do grau de ignorância nacional.


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