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INTEGRAÇÃO
União Européia tem de se preocupar com absorção de produtos agrícolas do leste do continente; entendimento com vizinhos é mais urgente
UE tem prioridades maiores que o Mercosul
CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
da Sucursal de Brasília
A União Européia, em particular
a França, tem prioridades mais urgentes e razões estratégicas importantes e muito concretas para não
desejar abrir seu mercado a produtos agrícolas do Mercosul.
Ao contrário do que disse em São
Paulo na semana passada o embaixador Renaud Vignal, diretor para
as Américas do Ministério das Relações Exteriores da França, o veto
de seu país ao início de negociações com tal objetivo no Rio no final deste mês não é fábula.
Ele existe e está calcado em motivos bastante compreensíveis, do
ponto de vista europeu, como ficou claro em reunião realizada pelo Grupo de Análise de Conjuntura
Internacional (Gacint) do Instituto
de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo.
Em primeiro lugar, a União Européia tem de se preocupar com a
absorção dos produtos agrícolas
que vêm do leste do continente.
Produtores importantes como
Hungria e Polônia estão em processo de integração com a Europa
ocidental. A vizinhança e a possibilidade de graves problemas sociais
tornam um entendimento com esses países muito mais urgente do
que com os do Mercosul (Brasil,
Argentina, Uruguai e Paraguai), da
perspectiva da maioria dos integrantes da União Européia.
Em segundo lugar, não há nenhuma disposição da parte da Europa para discutir com o Mercosul
seu principal instrumento de protecionismo à agricultura, os subsídios estatais à produção agrícola.
Para que fazer concessões nesse
setor por causa do Mercosul, se
elas beneficiariam o mundo inteiro
e se a Europa pode colocá-los na
mesa do novo acordo mundial de
comércio, que começa a ser discutido em novembro, com muito
maior poder de barganha?
Além disso, um aspecto pouco
ressaltado na discussão sobre o tema é o fato de que boa parte do negócio agrícola no Mercosul está
sob controle de empresas de capital europeu (como a Parmalat).
Essas empresas têm grande lucratividade no mercado interno
brasileiro e nenhum interesse de
exportar nada para a Europa.
Pela ótica das empresas européias, a consumação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca)
será ótima notícia: ela lhes abrirá o
agora impedido e sempre ambicionado mercado dos EUA.
No caso específico da França, a
manutenção de subsídios agrícolas
faz muito sentido político.
O presidente Jacques Chirac, que
na década de 70 foi ministro da
Agricultura no governo Chaban-Delmas, compreende isso melhor
do que ninguém. Bulir na estabilidade dos produtores agrícolas na
França é mexer em casa de marimbondos, com consequências políticas imprevisíveis.
Ainda há o problema da unidade
da União Européia. A guerra nos
Bálcãs já a colocou em excessivo
risco para que seus integrantes
queiram se dar ao luxo de voltar a
dissidir por causa do Mercosul.
Assim, embora ainda ocorra intenso esforço diplomático para
que, no próximo dia 21, seja conferido pelos ministros das relações
exteriores europeus algum tipo de
mandato que permita à comissão
da União Européia discutir no Rio
qualquer negociação com o Mercosul, com certeza não será nada
que se compare à dimensão que se
chegou a imaginar em 1997, quando Chirac esteve em Brasília.
Os interesses imediatos, e mesmo de longo prazo, da França e da
maioria dos países europeus estão
voltados para outros lugares do
mundo, não para o Mercosul.
Participaram da reunião do Gacint na segunda-feira passada em
São Paulo, entre outros, Gilberto
Dupas, Marcus Jank, Guilherme
Silva Dias, Marcos Gianetti da
Fonseca e Geraldo Forbes.
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