São Paulo, sexta-feira, 16 de julho de 2004

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OPINIÃO ECONÔMICA

A taxa Selic vai subir novamente?

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

A aceleração da inflação nos últimos meses e a recuperação da produção industrial, em intensidade superior à esperada, têm levado alguns analistas a pedir uma nova rodada de aumento de juros pelo Banco Central. Embora a previsão sobre o comportamento do IPCA neste ano (7,5%) seja ainda inferior ao topo da banda fixada para a meta de inflação (8%), já existe um mal-estar no mercado financeiro em relação ao ano de 2005.
A meta de inflação, já fixada para o próximo ano (4,5%), é muito apertada quando considerada a variação do IPCA esperada em 2004. Trazer uma inflação anual de 7,5% para perto de 4,5% -uma redução de mais de 60%- em um prazo de 12 meses, vindo a variação do IGP-M em 2004 (de cerca de 11,5%) a corrigir uma parcela importante dos preços, é uma tarefa quase impossível. Mas, se essa é a meta estabelecida, não sobra ao Banco Central outro caminho a não ser aumentar os juros, esfriar a economia e reduzir o consumo dos brasileiros.
Mas justificar a decisão de elevar os juros como resultado da aceleração recente da inflação não faz sentido. Os índices de preços mais recentes mostram que o aumento da inflação ao consumidor está concentrado em itens voláteis, como energia e alimentos, que foram pressionados por aumentos nas cotações internacionais das commodities, pela recente desvalorização do real e por preços públicos indexados ao IGP-M. Quando trabalhamos com os índices de inflação sem a influência desses itens, os chamados índices núcleos, o cenário que se visualiza é muito claro: o choque externo de preços foi assimilado sem que houvesse o tão temido efeito secundário sobre os preços.
O gráfico nesta página apresenta a evolução do núcleo por exclusão do índice de inflação calculado pela Fipe na cidade de São Paulo nos últimos meses. Eu prefiro seguir o chamado núcleo por exclusão, e não modelos estatísticos mais sofisticados usados pelo Banco Central, pela simples razão de que esse é o índice usado nas economias mais avançadas, há muitos anos. Não vejo, portanto, a necessidade de reinventar a roda para mostrar erudição estatística!
O que se vê no gráfico é um processo claro de choque externo sem que o impacto inicial de aumento de preços contamine, posteriormente, os preços da cesta de produtos acompanhada pela Fipe. O gráfico mostra, claramente, que houve um primeiro choque entre novembro de 2003 e janeiro de 2004, seguido de outro de intensidade ainda maior nos dois meses seguintes. A partir de março, os efeitos desse choque foram sendo absorvidos nos índices, com recuo constante da taxa de inflação medida pelo núcleo por exclusão. A primeira medida realizada pela Fipe em julho mostra a estabilização do núcleo em níveis equivalentes a uma taxa de inflação anual da ordem de 7,5% ao ano. As previsões de alguns analistas mostram que terminaremos este ano com a inflação anualizada do último trimestre, medida pelo núcleo por exclusão, entre 6% e 6,5%.
Por enquanto, os efeitos de escassez de oferta de alguns produtos no mercado interno ainda não apareceram nos radares dos institutos que medem a inflação no Brasil. O nervosismo -que já se pode detectar entre alguns analistas financeiros e no segmento mais duro do Copom- com o aparecimento de uma inflação de demanda é fruto apenas de modelos econométricos e expectativas. Mas o aumento da taxa Selic já faz parte dos murmúrios que se ouvem nas mesas de operação do mercado financeiro no Brasil.
Será muito interessante acompanhar os efeitos políticos de uma nova rodada de elevação dos juros às vésperas das eleições municipais de outubro próximo!


Luiz Carlos Mendonça de Barros, 61, engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br


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