São Paulo, segunda-feira, 16 de julho de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Empresas mudam para atender baixa renda

Companhias lançam versões de produtos mais simples e de menor custo para as classes C e DE, que ganhou poder de compra

Empresas contratam antropólogos, e executivos estagiam em favelas para entender comportamento do consumidor

Raimundo Pacco/Folha Imagem
Consumidoras em loja de eletrodomésticos em São Paulo; empresas se adaptam ao maior poder de compra da baixa renda


DENISE BRITO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O ganho de poder aquisitivo da população de menor renda do país provocou uma transformação de peso no mercado de consumo e, conseqüentemente, nas estratégias adotadas pelas empresas.
Desde o Plano Real e o controle da inflação, em 1994, houve um ganho aproximado de 150% no poder de compra das famílias das classes C e DE, com renda de até dez salários mínimos, o equivalente a 87% da população do país.
Pelo volume de consumidores, esse segmento passou a ter importância estratégica para as grandes marcas. "Qualquer empresa do mercado de consumo hoje só assume a liderança se tiver produtos adequados a esse segmento", diz o professor de varejo Juracy Parente, da FGV (Fundação Getulio Vargas). Para ganhar a preferência desse público, as grandes empresas têm buscado aprofundar a compreensão da realidade das famílias de baixa renda.
"Muitas estão incluindo antropólogos em seus quadros e investindo em pesquisas etnográficas, espécie de estágio em que executivos convivem com famílias de baixa renda dentro de suas residências, observando seu cotidiano", diz Haroldo Torres, diretor do Data Popular Pesquisa e Consultoria.
Segundo ele, a demanda de pesquisas desse tipo cresceu cerca de 250% no último ano.
A Johnson & Johnson é uma das adeptas do modelo de treinamento. "Intensificamos os investimentos em pesquisas ligadas ao comportamento das classes C e D. Fomos à casa desse consumidor e o acompanhamos no momento das compras e da utilização de nossos produtos", diz José Vicente Marino, presidente da Johnson.
"Equipes de marketing, diretores e até o presidente de então participaram dessa atividade. E fazemos isso até hoje."
Segundo Marino, devido à importância desse público para os negócios da empresa, foi implementada uma série de estratégias de aproximação, como o lançamento de produtos em versões mais simples -caso de fralda descartável e escova dental- e a redução de 30% no preço de outros -caso de hidratante corporal e xampu infantil. Entre os "ótimos resultados" alcançados, Marino cita as vendas do hidratante, que aumentaram cinco vezes, e a conquista da liderança da categoria de xampu infantil.
A estratégia da Unilever e da Nestlé incluiu a abertura de fábricas na região Nordeste, onde está a maior concentração das famílias de baixa renda.
O investimento rendeu importantes resultados para ambas. "Nosso faturamento dobrou nos últimos cinco anos. Hoje somos o segundo mercado em volume da companhia no mundo e o quarto em faturamento", afirma Johnny Wei, diretor da Nestlé.
Parte desse resultado foi fruto de soluções sob medida desenvolvidas pela empresa, que também levou uma equipe de 70 executivos para "estagiar" em residências de consumidores em favelas. Foram criados produtos como uma marca de leite em pó de preço baixo e alto valor nutricional exclusiva para a região Nordeste. Outro exemplo foram as as porções menores, caso de biscoito recheado que passou a oferecer embalagem de 140 gramas como opção à tradicional de 200 gramas.

Café quente
A comunicação, antes unificada para todo o país, também passou por alterações. A propaganda de café, por exemplo, que no Brasil inteiro retratava o consumo da bebida em um clima de frio, mesmo no calor de cidades como Recife, ganhou versões específicas para o Nordeste, onde a ênfase é dada ao rendimento do produto.
"Compreendemos que a renda familiar é instável, o que faz o consumidor ir mais vezes ao supermercado próximo de sua casa. Por isso, ele busca produtos de menor custo, com menor embalagem", diz Wei. "Em vez de uma lata de 2 quilos, ele prefere um sachê de 500 gramas."
A Unilever, já nos anos 90, abriu sua fábrica no Nordeste. "Enviamos para lá as melhores cabeças de marketing", conta o vice-presidente Luiz Carlos Dutra. Entre o itens desenvolvidos localmente desde então, destacam-se o sabão Ala e a versão compacta do desodorante Rexona, ambos considerados sucesso de vendas e participação de mercado: 24% e 9%, respectivamente.
A empresa no Brasil comemora o fato de estar em terceiro no ranking da companhia. "Hoje, estamos atrás somente dos EUA e do Reino Unido."


Texto Anterior: Mercado Aberto
Próximo Texto: Frase
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.