São Paulo, sexta-feira, 16 de agosto de 2002

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LUÍS NASSIF

Os incendiários e a crise

Há uma certa confusão nessa história do papel dos presidenciáveis na administração da atual crise cambial.
O que se argumenta é que, como foi Fernando Henrique Cardoso quem colocou o país nesse alçapão, não se poderia sonegar dos presidenciáveis o direito legítimo de recorrer a qualquer retórica para se eleger.
Não pode ser assim. Equivale a absolver o sujeito que riscou conscientemente o fósforo em uma poça de gasolina porque o responsável pelo vazamento foi outro.
Peraí! Independentemente de Fernando Henrique Cardoso, tem de haver um compromisso claro dos candidatos com o futuro do país. Caso contrário, se estimularão iniciativas temerárias, de algum voluntarista inescrupuloso botar fogo na gasolina agora, simplesmente para não correr o risco de a gasolina inflamar no seu governo. É isso o que se quer para o país?
Vamos tentar definir responsabilidades. A culpa pela atual situação é do governo FHC. Ciro Gomes deu sua contribuição, ao defender com unhas e dentes a irresponsabilidade dos economistas do Real de apreciar o câmbio e de abrir indiscriminadamente a economia. Não foi capaz sequer de defender os interesses nacionais na negociação do acordo automotivo com a Argentina, na sua curta gestão à frente do Ministério da Fazenda. Mais: quando, internamente na equipe de transição, José Serra e Pérsio Arida começaram a articular a alteração do câmbio, em dezembro de 1994, Ciro encetou campanha nacional tentando estigmatizar qualquer mudança. Dizia que os defensores da mudança cambial eram inimigos da pátria, e do Real, e só ele seria a garantia de manutenção do plano.
No entanto sua responsabilidade cessa em 31 de dezembro de 1994. A partir daí é inteiramente da responsabilidade do governo FHC, do ministro da Fazenda, Pedro Malan, e dos sucessivos presidentes do Banco Central, após a saída de Arida, a fragilização da economia.
Só que hoje a manutenção dessa estabilidade depende, mais do que qualquer coisa, da palavra dos presidenciáveis, especialmente daqueles com chances reais de vitória em outubro. Portanto eles são co-responsáveis, sim, pela estabilidade, e poderão arcar com a culpa da desestabilização se tentarem apostar no pior.

Responsabilidade
Os rompantes de Ciro Gomes nada agregam de positivo ao país, apenas à sua campanha. Usar de retórica inflamada contra o tal "mercado", em plena campanha, não tem a menor utilidade para o país, sequer para a sua gestão. Se eleito, na hora em que sentar na cadeira de presidente, vai ter de informar, primeiro, onde conseguirá os dólares que substituam a ajuda do FMI (Fundo Monetário Internacional), e como conseguirá evitar uma explosão partindo para o pau com o mercado, sem uma estratégia clara e antecipada de equacionamento das dívidas interna e externa.
A retórica inflamada só tem duas consequências -nenhuma delas positiva para o país. A primeira, eleitoral, com aquela massa de eleitores que confundem voluntarismo com coragem, e adjetivação com conhecimento. A segunda, a de antecipar o estouro da boiada, para não correr o risco de que o rebanho estoure após a posse.
É importante que os presidenciáveis tenham a consciência de que, se se comportarem com responsabilidade, mesmo na eventualidade de um estouro da boiada depois da posse, a responsabilidade será exclusivamente de Fernando Henrique Cardoso. Se quiserem colocar fogo no circo, terão de conviver não só com uma economia desorganizada mas também -e para sempre- com a pecha de incendiários.

"Call center"
O crescimento do número de funcionários da Embratel, de 8.000 para 12 mil, se explica pela criação de um "call center" como subsidiária integral. No caso de outras empresas, o "call center" foi criado como empresa independente, razão de não ter impactado nos dados sobre o número de funcionários.

E-mail - lnassif@uol.com.br


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