São Paulo, sexta-feira, 16 de agosto de 2002

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EM TRANSE

BC tenta hoje trocar dívida que vence entre 2004 e 2006 por papéis que vencem em 2003 para conter crise nos fundos

Próximo governo começa com dívida maior

LEONARDO SOUZA
MARIANA MAINENTI
NEY HAYASHI DA CRUZ

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O Banco Central tenta hoje trocar R$ 13 bilhões de sua dívida de prazo mais longo, que vence entre 2004 e 2006, por títulos (LFTs, certificados de dívida pública) que vencem até junho do ano que vem. Se a troca tiver sucesso, o próximo presidente terá de administrar o vencimento de uma dívida de R$ 112,283 bilhões no primeiro semestre do ano que vem em vez dos R$ 99,283 bilhões previstos até agora.
Além da troca, o BC informou que 20% dos novos títulos que forem adquiridos (R$ 2,6 bilhões, se todo o lote for leiloado) poderão ser revendidos à instituição em dezembro deste ano se os compradores assim o desejarem. Na prática, o vencimento dessa parcela será em dezembro deste ano, podendo ser renovada por mais alguns meses.

Concentração
As LFTs são os títulos federais de maior participação na dívida interna e os que mais se depreciaram nas últimas semanas, o que gerou perdas para os fundos de investimento e influenciou os resgates por parte dos cotistas.
Pela posição de maio deste ano, o total de LFTs que vencia no último trimestre deste ano era de R$ 2,051 bilhões. Pela posição de junho, os vencimentos desses papéis no último trimestre já estavam em R$ 24,647 bilhões. Ou seja, a concentração desses títulos nos últimos três meses do ano aumentou em mais de 12 vezes.
Pela posição de março, venciam R$ 17,251 bilhões em títulos públicos no primeiro trimestre de 2003. Pela posição de maio, o total de vencimentos caiu para R$ 16,254 bilhões. Mas os de junho subiram para R$ 25,691 bilhões.
Foi exatamente no final de maio que o BC antecipou a decisão de que os títulos públicos teriam de ser registrados nas carteiras dos fundos pelo seu valor de mercado, e não mais pelo preço de aquisição. Como esses papéis haviam perdido valor nas semanas anteriores à marcação a mercado, os fundos apresentaram perdas, o que levou muitos cotistas a resgatar seus investimentos.
Para cobrir os saques, os gestores dos fundos tiveram de vender as LFTs, o que derrubou ainda mais o valor dos papéis.
Diante da resistência dos investidores em comprar títulos de longo prazo, o BC decidiu oferecer ao mercado papéis de vencimento mais curto. É o que o diretor de Política Monetária do BC, Luiz Fernando Figueiredo, chama de "encurtamento tático" -uma redução no prazo da dívida pública para que a rolagem dos títulos não seja prejudicada.
A medida serve, principalmente, para atender a pedidos de administradoras de fundos de investimento. Anteontem, o BC e a Comissão de Valores Mobiliários suavizaram as regras que obrigam os fundos a contabilizar seus papéis pelo seu valor de mercado.
Com a mudança, títulos de curto prazo -como os que serão ofertados hoje- não precisam mais ser avaliados pelo valor de mercado. Podem ser marcados pelo seu preço de aquisição, que não está sujeito às turbulências do mercado.

Mais encurtamento
O secretário-adjunto do Tesouro Nacional Rubens Sardenberg disse ontem à Folha que pretende vender neste mês um total de R$ 2,5 bilhões a R$ 3 bilhões em títulos públicos com vencimento em outubro próximo. Desse total, R$ 1 bilhão já foi leiloado. Restam, portanto, entre R$ 1,5 bilhão e R$ 2 bilhões para vender.
O diretor da Mercatto Gestão de Recursos, Régis Abreu, diz que a procura maior por títulos de curto prazo vai partir dos bancos de varejo. "Os gestores de grandes bancos vão querer papéis de curto prazo para diminuir a volatilidade dos fundos, pois o cliente deles não gosta de volatilidade (variação continuamente irregular do valor das cotas dos fundos). Grandes clientes estão acostumados ao risco e suportam melhor papéis de prazo longo, mesmo marcados a mercado", diz.
Alexandre Záquia, diretor do Itaú, diz que a demanda maior será por títulos de prazo "o mais curto possível". "Com o dinheiro dos leilões de recompra do BC, a tendência dos gestores é comprar ativos com vencimento até o fim do ano e ir para o "overnight" [vencimento de um dia para o outro] mesmo", diz. Segundo Záquia, os saques no Itaú foram de quase 10% do valor do patrimônio. "É muito, mas abaixo da evasão do mercado, que ficou em 14%", disse.


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