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São Paulo, sábado, 16 de agosto de 2003

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LUÍS NASSIF

Para mudar a economia

Segunda-feira poderá ser uma data histórica para o futuro do país e, especialmente, das ciências econômicas nacionais. Será oficialmente lançada na Bovespa a Faculdade de Economia da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo. Sua principal missão será tentar inverter a rotunda mediocridade que marcou o debate econômico brasileiro nas duas últimas décadas, especialmente na última.
Nesse período, consolidou-se um tipo de pensamento econômico falsamente complexo e intrinsecamente superficial, no qual modelos econométricos desenvolvidos no exterior passaram a ser utilizados mecanicamente, acriticamente, descosturados da realidade nacional, sem nenhuma sofisticação de análise, sem conhecimento básico das condições jurídicas, políticas, sociais e empresariais do país.
Esse tipo de pensamento simplista levou a discussão econômica nacional a um grau de alienação e a erros de diagnóstico que tiraram o país da rota de crescimento que havia sido sua marca desde o começo do século. Até então, os economistas brasileiros, especialmente no pós-guerra, caracterizavam-se por uma formação intelectual ampla e eclética e pela capacidade de utilizar a teoria como ferramenta para a solução prática dos problemas de desenvolvimento.
Especialmente nos anos 90 desenvolveu-se um modelo importado, cuja complexidade em muito se assemelhava ao do rococó, quando o movimento barroco se esgotou. A criatividade e a inventividade foram substituídas por complexidades vazias, que, longe de permitir interpretar adequadamente o país, serviram apenas para jogá-lo em uma sucessão interminável de crises. Criaram-se teorias auto-referenciadas, estáticas, sem o cuidado da comprovação empírica, que produziram desastres os quais comprometeram o bem-estar de toda uma nação.
Hoje em dia em decadência, a figura do "economista de planilha" tornou-se referência de opinião na economia, mediocrizando o debate econômico e tornando o país refém de padrões de análise que seriam risíveis se não fossem suas consequências trágicas.
Muito se criticou o jornalismo financeiro, que acabou se submetendo ao primarismo dos bordões brandidos pelos cabeças de planilha. Mas, por trás desse modelo de jornalismo acrítico, havia a ausência de um centro de pensamento alternativo, que consolidasse uma visão mais crítica e abrangente do processo econômico. Sem esse centro de irradiação, as opiniões dos economistas mais consistentes -e existem vários- se perdiam, sufocados pelo alarido, pelo coral de declarações repetidas, repetidas e repetidas na mídia, mesmo sendo desmentidas diariamente pelos fatos.
A nova faculdade surge com uma proposta inovadora de ensino. A formação dos alunos se dará na prática, intrinsecamente ligada aos setores produtivos, conhecendo suas particularidades, suas limitações e potencialidades, submetendo as novas teorias econômicas ao teste da realidade, ao desafio da solução de problemas concretos do país, incorporando ao conhecimento econômico a formação jurídica, política e setorial, imprescindíveis para montar modelos econômicos que vão além das planilhas.

E-mail - Luisnassif@uol.com.br


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