São Paulo, terça-feira, 16 de agosto de 2005

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OPINIÃO ECONÔMICA

Urgências urgentíssimas

BENJAMIN STEINBRUCH

Fiquei espantado ao ler, na semana passada, uma reportagem da revista "Meio & Mensagem" sobre os custos da campanha eleitoral de 2002, quando 94 milhões de brasileiros votaram para eleger deputados estaduais e federais, governadores, senadores e o presidente da República. Segundo a revista, especializada em publicidade e marketing, a campanha custou cerca de R$ 10 bilhões.
O espanto não foi apenas com o valor total do gasto, obviamente astronômico para um país pobre como o Brasil, mas também com a diferença entre os valores oficiais e reais do dinheiro aplicado na campanha. Oficialmente, os partidos políticos declararam aos tribunais eleitorais dispêndios de R$ 850 milhões. Ou seja, 91,5% dos gastos "não foram contabilizados", expressão inventada pelos autores da atual crise para não pronunciar a denominação correta de caixa dois.
Não dá para continuar assim. Uma das grandes lições do terremoto político deste triste inverno brasileiro é que ficou impossível adiar a reforma eleitoral. Sem ela, a próxima campanha já começará manchada pela suspeita do caixa dois e os eleitos não terão credibilidade para exercer seus mandatos. Embora o PT esteja pagando mais pelos seus pecados nessa matéria, o fato é que nenhum partido grande ou médio pode dizer que não conheceu caixa dois nas últimas campanhas.
Infelizmente, não há tempo para fazer até 30 de setembro, prazo constitucional, uma reforma político-eleitoral completa. Para isso, seria necessário contar com um tempo mais longo para debates. É impossível saber, por exemplo, se a sociedade aprova novidades como o voto distrital, o financiamento exclusivamente público de campanhas ou o fim da reeleição de presidente, governadores e prefeitos. Mas a farra do caixa dois precisa e pode ser estancada imediatamente por uma reforma eleitoral de emergência, cujo eixo principal deve ser a austeridade.
Cabe aos parlamentares examinar e votar com urgência urgentíssima medidas simples para reduzir drasticamente os gastos na próxima campanha. Já estão no Congresso propostas nesse sentido e parece haver consenso sobre alguns pontos, como redução pela metade do período de propaganda política na TV, fim dos showmícios, proibição da maquiagem de candidatos pela ação de marqueteiros e obrigação de contabilizar diariamente os gastos pela internet.
O controle de gastos terá de ser rigoroso. É indispensável que os candidatos e partidos tenham um limite máximo de despesas, para que sejam dadas oportunidades iguais a candidaturas ricas e pobres. Com esse limite, campanhas luxuosas ou exageradamente visíveis ficarão imediatamente sob suspeita de caixa dois.
Ficaria então para a próxima legislação a reforma política completa, embora seu esboço já possa ser desenhado na própria campanha do ano que vem. Seria muito útil que cada candidato à Presidência da República apresentasse em seu programa de governo o teor da proposta de reforma que defende. Assim, ao eleger o presidente, a população já indicaria indiretamente o tipo de legislação que a sociedade deseja.
É ingênuo esperar que possa partir dos próprios parlamentares medidas que reduzam, por exemplo, o número de deputados ou de suas mordomias. Alterações dessa natureza só podem ser viabilizadas se estiverem em programas de candidatos e se forem sancionadas pelo voto popular.


Benjamin Steinbruch, 51, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
E-mail - bvictoria@psi.com.br


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