São Paulo, terça-feira, 16 de agosto de 2005

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EM EXPANSÃO

Negócios em feira deste ano aumentam 73%; apesar da alta, setor quer maior acesso a tecnologia de produção

Agricultura familiar dribla crise e cresce

MAURO ZAFALON
DA REDAÇÃO

Maio de 2005, Ribeirão Preto, cidade do interior de São Paulo. Um grande produtor do Piauí negocia com uma multinacional produtora de colheitadeiras a compra de novas máquinas para a colheita de arroz, soja e milho nos 10 mil hectares cultivados por ele no Estado nordestino.
A negociação ocorreu na 12ª Agrishow, feira que concentra os grandes negócios do agronegócio brasileiro. Produtor e indústria saíram satisfeitos com a negociação. Ele, porque conseguiu reduzir os preços das máquinas, que superam R$ 500 mil cada. A indústria, por ter feito mais algumas vendas em um período de vacas magras. Serão necessárias 31 mil sacas de arroz para pagar cada uma das máquinas.
Agosto de 2005, Agudos, também no interior paulista. O pequeno produtor Antônio Marcos Cardoso de Souza, de Sete Barras, no Vale do Ribeira, mostra eufórico uma máquina para "bater" arroz (separar o grão do cacho) na 3ª Agrifam -feira voltada para a agricultura familiar e trabalhadores assalariados no campo.
Movida a gás (usa um botijão de três quilos), a engenhoca, que é capaz de "bater" até 40 sacas por dia, está exposta no espaço dedicado a inventos voltados à agricultura familiar da 3ª Agrifam.
A nova máquina, comercializada por apenas R$ 300, já tinha cinco interessados, segundo Souza. Para pagar esse investimento, o produtor vai gastar o correspondente a 17 sacas de arroz.
Alexandre Abbud, diretor-executivo da Abag (Associação Brasileira de Agribusiness), associação que congrega grandes empresas do agronegócio, presente à Agrifam, diz que "não há conflito; a diferença é apenas o porte".
Ele se referia à diferença entre a chamada agricultura "empresarial" e a "familiar", cada uma com seu tamanho e sua importância.
E é exatamente essa diferença que os promotores da Agrifam querem preservar. João Carlos Pedreira de Freitas, diretor da Hecta Desenvolvimento Empresarial nos Agronegócios, empresa responsável pela Agrifam, diz que não há incompatibilidade entre agricultura empresarial e familiar.
A primeira gera dólares; a segunda, comida. Mas com dólares se compra comida, diz. "O que não pode ocorrer é um avanço do modelo concentrador. É preciso repensar a agricultura, e a familiar tem um grande papel porque trabalha em pequena escala e é sustentável", afirma Pedreira.
E não é só o entusiasta Pedreira que acredita na agricultura familiar. A 3ª Agrifam, realizada de 12 a 14 deste mês, atraiu 117 expositores e teve 152 estandes. Participaram da feira sete multinacionais, principalmente da área de herbicidas e fungicidas, bancos e indústrias de máquinas e equipamentos, todos com programação específica de orientações, por palestras e cursos, ou de vendas para os pequenos produtores.
Os negócios realizados são pequenos se comparados às grandes feiras que ocorreram neste ano no país, mas mostram um caminho bem diferente do dos grandes eventos. Enquanto a Agrishow de Ribeirão Preto deste ano teve queda de 40% nos negócios, a 3ª Agrifam superou em 73% o volume negociado em 2004. Foram 120 propostas de financiamentos, no valor de R$ 1,5 milhão, e R$ 3,7 milhões em negócios efetuados durante a feira, diz Pedreira.
No caso da agricultura familiar, o importante, no entanto, é o pós-feira, diz ele. A decisão é sempre tomada pelo produtor junto com a mulher e os filhos, após o evento. Por isso, Pedreira estima que os negócios totais do evento devam atingir R$ 24 milhões neste ano, 100% acima dos de 2004.
A análise de Pedreira é corroborada por informações de duas empresas do setor. Segundo elas, enquanto há queda nas vendas de tratores de grande porte, não existe recuo nas vendas de veículos de baixa potência.
Mas a agricultura familiar também tem os seus problemas, segundo Braz Agostinho Albertini, presidente da Fetaesp (Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de São Paulo), entidade que congrega 176 sindicatos e é a realizadora do evento.
Crédito e tecnologia são dois deles. "O produtor rural familiar tem de ter acesso não só ao crédito mas também ao conhecimento", diz Albertini. Na avaliação do presidente da Fetaesp, o produtor tem de "trabalhar com a melhor tecnologia disponível".
Albertini diz que é preciso conhecer exatamente o papel da agricultura familiar. "É preocupante quando se associa a agricultura familiar a assentamentos com produtores sem recursos, sem raízes agrícolas, sem know-how e sem vocação para a lavoura. Existem pequenos produtores que, com um empurrãozinho, vão produzir muito mais, já que são eficientes e sabem administrar seus negócios", afirma.


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