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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
De susto em susto
Há indicações de que o atual episódio de instabilidade financeira é mais grave
do que os anteriores
AS ATENÇÕES estão voltadas para as turbulências internacionais. O foco da crise está no
mercado de hipotecas de alto risco
dos EUA, mas ela já se propagou para outros segmentos do mercado financeiro e para outros países. Como
não poderia deixar de ser, os mercados brasileiros sentiram o impacto
das ondas de instabilidade externa.
Trata-se de mais uma turbulência
passageira, como a que tivemos em
fevereiro? Ou será que estamos
diante do início do fim da fase de bonança financeira e econômica? Ninguém sabe ao certo. Os mercados financeiros sofisticaram-se enormemente e se tornaram mais opacos. A
verdadeira extensão dos riscos é
desconhecida. Mas há indicações de
que o atual episódio de instabilidade
é mais grave do que os anteriores. O
fluxo de más notícias é praticamente contínuo. Os principais bancos
centrais do mundo foram levados a
intervir pesadamente, com maciças
injeções de recursos, na tentativa de
conter o pânico.
Uma certa angústia é inevitável. A
pergunta que muitos fazem é a seguinte: teremos uma repetição das
crises da década de 90, com graves
efeitos no Brasil?
Por um lado, a situação atual é
mais preocupante. Nos anos 90, as
crises tinham origem na periferia do
sistema internacional (México, Leste da Ásia, Rússia etc.). Agora, o epicentro está na maior economia do
mundo, que exibe sinais de fragilidade e depende muito de capitais estrangeiros. O déficit em conta corrente do balanço de pagamentos dos
EUA cresceu significativamente nos
últimos anos, estabilizando-se em
torno de 6% do PIB desde 2005.
Por outro lado, é inegável que a
posição brasileira é mais sólida hoje
do que era na década de 90 ou no início da década atual. O Brasil aproveitou a bonança dos últimos cinco
anos para reduzir consideravelmente a sua vulnerabilidade externa, um
problema que nos perseguia há muito tempo. Cheguei a publicar nesta
coluna, em 2003, um artigo intitulado: "Vulnerabilidade e(x)terna?".
Desde então, os nossos indicadores melhoraram muito -bem mais
do que eu esperava. A balança comercial registrou megassuperávits.
De 2003 a 2006, tivemos superávit
no balanço de pagamentos em transações correntes. Em 2007, teremos
provavelmente outro superávit.
Cinco anos consecutivos de saldo
em conta corrente é um resultado
talvez inédito na história brasileira.
Nossas reservas internacionais
cresceram de forma expressiva, alcançando quase US$ 160 bilhões. A
situação fiscal está razoavelmente
arrumada. A inflação foi controlada.
A economia brasileira começa a
crescer a taxas mais adequadas.
Em resumo, a economia está bem
mais preparada para enfrentar choques externos. Não é invulnerável,
claro. Temos pontos fracos. O maior
deles talvez seja a existência de uma
dívida pública interna de prazo curto e ativos financeiros domésticos
de grande liquidez. Como a conta de
capitais é bastante aberta, um agravamento dramático da situação internacional poderia desencadear
uma fuga de capitais. A troca de ativos em reais por moeda estrangeira
pressionaria a taxa de câmbio e/ou
as reservas internacionais do país.
Estamos longe disso, mas não podemos ser complacentes. O Brasil
pagou, nas últimas três décadas, um
preço alto demais por subestimar os
riscos associados a turbulências internacionais.
P.S.: Há um lado positivo na turbulência recente. A moeda brasileira
voltou a se depreciar, depois de um
longo período de apreciação excessiva. Foi preciso que o mundo financeiro viesse abaixo, para que o dólar
reagisse um pouco aqui no Brasil...
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 52, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago).
pnbjr@attglobal.net
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