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ARTIGO
Brasil pode se tornar a Arábia Saudita
THOMAS L. FRIEDMAN
COLUNISTA DO "NEW YORK TIMES"
A cada vez que a Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) exagerava no
esforço de empurrar os preços
para cima, nos anos 70, o lendário ministro do petróleo da
Arábia Saudita, xeque Zaki Yamani, gostava de lembrar aos
colegas que a Idade da Pedra
não havia terminado devido a
uma falta de pedras.
A era do petróleo não vai se
encerrar porque faltará petróleo. Ela acabará porque o preço
do petróleo subirá tanto que alguém terminará por desenvolver alternativas. Yamani estava
alertando seus colegas para que
controlassem sua cobiça e evitassem estimular o desenvolvimento dessas alternativas.
Tarde demais, o barril de petróleo a US$ 70 teve exatamente esse efeito. Uma das as alternativas mais promissoras é o
etanol, combustível feito de milho, cana-de-açúcar ou qualquer biomassa. Vim ao Brasil
para tentar compreender melhor o que é verdade e o que não
é na história do etanol, porque
nenhum outro país é tão pioneiro quanto o Brasil no uso do
álcool como combustível.
Minha impressão, depois de
conversar com diversos especialistas brasileiros, é que não
só o etanol é real como nem
mesmo começamos a explorar
todo seu potencial. Com alguns
avanços tecnológicos, o Brasil
realmente pode se tornar a
Arábia Saudita do açúcar.
Desde os choques do petróleo dos anos 70, o Brasil, depois
de muitos ciclos de tentativa e
erro, transformou o etanol em
parte de seu cotidiano. Como o
etanol à base de açúcar oferece
quilometragem equivalente a
cerca de 70% da obtida com a
gasolina, os motoristas fazem
as contas para determinar se o
preço do álcool está pelo menos
30% abaixo do preço da gasolina. Caso esteja, muitos deles
optam por encher o tanque de
cana-de-açúcar. Assim, o Brasil
substituiu por etanol cerca de
40% da gasolina que consumia.
Visitei a usina de açúcar Cosan, em São Paulo, a maior processadora de cana-de-açúcar
do Brasil. Chegar lá exige que
sobrevoemos um oceano verde.
As plantas são colhidas e carregadas em grandes caminhões,
que as transportam à destilaria.
Lá, o suco é extraído e convertido em açúcar ou etanol. O bagaço remanescente alimenta
imensas caldeiras a vapor que
geram eletricidade suficiente
para acionar o processo de refino e propiciar um excedente
revendido à rede elétrica.
Por fim, quando a cana é colhida, o topo e as folhas muitas
vezes são abandonados nos
campos. Mas essa biomassa
tem rico conteúdo de celulose
que poderia ser aproveitado e,
se o açúcar aprisionado na celulose fosse extraído, seria possível produzir volume ainda
maior de etanol. Existe uma
corrida, no momento, para desenvolver esse tipo de processo.
A expectativa é de que as tentativas obtenham sucesso dentro de cinco anos, e quando isso
acontecer será possível extrair
"mais que o dobro de etanol de
cada pé de cana", disse José
Luiz Olivério, vice da Dedini,
uma das gigantes da indústria.
Perguntei aos especialistas
brasileiros o que eles fariam caso estivessem na Presidência
dos EUA. A resposta de consenso foi que exigiriam que as empresas petroleiras americanas
oferecessem álcool em todos os
postos de gasolina que controlam no país. Eles também requereriam que as montadoras
de automóveis dos EUA adotassem sistemas que permitam
uso de combustíveis múltiplos
em todos os seus modelos, além
de alterar os padrões de consumo de combustível e eliminar a
absurda tarifa de US$ 0,54 que
impusemos à importação de
etanol de cana-de-açúcar. Depois disso, bastaria permitir
que o mercado funcionasse.
A demanda por etanol dispararia. Isso aceleraria o ciclo de
inovação, resolvendo mais rápido o problema da extração de
etanol da celulose, reforçando
as democracias em nosso hemisfério e debilitando os petrocratas no Oriente Médio. Pena
que não sejamos tão inteligentes quanto o Brasil.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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