São Paulo, terça-feira, 16 de outubro de 2007

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BENJAMIN STEINBRUCH

O FMI dos pobres


Para que seja instituição que financie desenvolvimento, o Banco do Sul tem de buscar seu equilíbrio financeiro

ASSIM COMO nenhuma mente sã pode ser contra a luz elétrica ou a água encanada, é razoável supor que ninguém possa se opor a ações ou entidades que promovam o desenvolvimento, sejam elas nacionais ou internacionais.
Esse é um enunciado básico na discussão da decisão de sete países da América do Sul, sob a liderança da Venezuela, de criar o Banco do Sul, tomada na semana passada em reunião de ministros, no Rio. Em tese, é bem-vinda a criação de uma entidade regional cujo objetivo seja financiar projetos de integração e desenvolvimento na América do Sul.
Até aí, tudo certo. Mas é preciso saber como se pretende fazer funcionar essa instituição. Pela idéia original do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, o Banco do Sul seria uma alternativa política ao Fundo Monetário Internacional e ao Banco Mundial para socorrer países sul-americanos endividados ou com graves dificuldades em seu balanço de pagamentos. Se fosse por esse caminho, que previa a criação de uma espécie de FMI dos pobres, o banco não teria futuro. Ainda que o velho FMI (dos ricos) mereça críticas e tenha falhado seguidamente em seus programas de ajuda amparados por políticas recessivas, a proposta de Chávez é por demais ideológica e peca por não conseguir enxergar o tamanho das carências financeiras do subcontinente.
Quando Chávez esboçou seu plano, o Brasil ameaçou ficar fora do Banco do Sul. Felizmente, numa concessão ao bom senso, voltou atrás, por perceber que seria muito melhor participar do banco e tentar representar um fator de equilíbrio nas decisões do que deixar Chávez espalhar sozinho sua demagogia aos carentes vizinhos sul-americanos.
O Brasil não conseguiu adiar o lançamento do banco de Chávez para 2010, como desejava, nem impedir que sua sede seja em Caracas. Mas obteve duas importantes vitórias na reunião da semana passada, quando os ministros de sete países aprovaram as diretrizes principais do banco, cuja operação deve começar em 2008.
A primeira vitória foi a decisão de que a instituição funcionará só como banco de desenvolvimento, não como FMI dos pobres, como imaginava Chávez. A segunda foi a restrição das atividades financiadoras ao território sul-americano, impedindo que sua ação se estenda para países amigos (de Chávez) da América Central, como Nicarágua e Cuba.
Nada garante, porém, que estejamos livres do viés ideológico sonhado pelo chavismo, ou seja, do risco de que o Banco do Sul possa ser usado para o assistencialismo demagógico com dinheiro alheio. Nada contra ajudas assistenciais, desde que se defina claramente de quais cofres sairão os recursos a fundo perdido. Caso contrário, o banco não teria nenhuma credibilidade para captar poupanças no mercado internacional. Em outras palavras, nasceria quebrado.
Para que seja uma verdadeira instituição financiadora de desenvolvimento, o Banco do Sul tem de manter os pés no chão e buscar o equilíbrio financeiro. Para isso, o Brasil deve desempenhar papel importante e ter poder político na nova entidade. Não faz sentido que todos os parceiros tenham o mesmo peso em voto, como quer Chávez. Esse peso tem de ser, naturalmente, proporcional ao volume de capital desembolsado por cada sócio.
Racionalidade e equilíbrio, portanto, é o que se espera do Brasil nessa iniciativa, para que não venha a entrar em canoa furada. Nenhum agente financiador pode sobreviver só de bravatas marqueteiras.


BENJAMIN STEINBRUCH , 54, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


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