São Paulo, terça-feira, 16 de outubro de 2007

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VINICIUS TORRES FREIRE

Xepa no fundão dos bancões


"Crash" da Bolsa de NY faz 20 anos; presente de bancões dos EUA é fazer a xepa da crise de crédito deste ano

VAI FAZER 20 anos, na sexta-feira, que a Bolsa de Nova York tomou um tombo inédito. Foi o "crash" de 1987. Temeu-se, por uns dias, pelo apocalipse do capital. Não rolou. O Japão murcharia, o comunismo levaria a breca, as mil flores da China floresceriam no pântano maoísta, o tempo passa, o tempo voa, mas Wall Street continuaria numa boa. O Fed injetou adrenalina no mercado quando necessário, nos anos 90 houve um salto de produtividade nos EUA e tudo foi turbinado ainda por bolhas financeiras, déficit público e dívida externa.
Para comemorar os 20 anos do "crash", Citigroup, Bank of America e JP Morgan anunciaram um fundão de, especula-se, US$ 75 a US$ 100 bilhões para limpar parte dos detritos da crise recente, curada pela transfusão de centenas de bilhões de dólares de crédito fácil e barateado do Fed e do BC Europeu.
O fundão dos bancões compraria papéis podres, estimados entre US$ 320 bilhões e US$ 400 bilhões. Os títulos estavam em veículos especiais de investimento, negócios com derivativos de crédito que os bancos apartam do balanço e que foram o núcleo da crise de julho-setembro, iniciada por calotes imobiliários. O lucro dos bancos tomou tombos em Wall Street devido à operação tapa-buracos, rombos deixados pelo pânico e pela fantástica fábrica de derivativos rentáveis e de baixo risco.
Trata-se, ao mesmo tempo, de uma xepa organizada com bom marketing e de uma vacina antigripe. O fundão financiaria a compra e/ou revenda ("sob nova direção" e nova embalagem) de papéis encalhados pela crise. Pode ter papel ainda bom, mas barato, que o fundão vai carregar até o vencimento. Assim se livra a cara de quem precisa vender agora, na baixa, e se embolsa o rendimento prometido do papel. Tem muito papel infeccioso, "lixo tóxico", que até pode passar a valer algum. Título lastreado em crédito imobiliário de segunda linha, os famosos "subprimes", estaria fora do negócio.
É uma tentativa de regularizar de vez o mercado de empréstimos de curto prazo, muitos garantidos por ganhos da prestação de financiamentos (casa, carro, cartão de crédito, crédito de varejo) -recebíveis.
Os bancos, na verdade, estariam fazendo a si mesmos o favor de ressuscitar um negócio rendoso. Segundo a "Bloomberg", o secretário do Tesouro dos EUA, Henry Paulson, ex-presidente do Goldman Sachs, ainda em setembro chamou os bancões para, enfim, para dar um jeito no resto da confusão que eles mesmos ajudaram a criar, "sem querer querendo", como diria o Chávez (o humorista mexicano).
No diplomatês financeiro, os bancões disseram que refinanciar os título ("asset backed commercial papers") tem sido "difícil", "apesar da alta qualidade das garantias". Isso travou desde empréstimos entre bancos até o financiamento do varejo japonês. O dinheiro em promissórias lastreadas em dívida ainda está 22% menor em relação ao pico de junho -encolheu US$ 250 bilhões.
Ontem, caíram os juros de "commercial papers" e a taxa dos swaps de calote de dívida (CDS, um seguro contra calotes). Mas teve gente a se perguntar por que os bancos ainda precisariam de um fundo tão grande. Estão mal das pernas ou é "para te comer melhor"?

vinit@uol.com.br


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