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Para fazer caixa, indústria pede mais prazo a fornecedor
Com a crise, grandes grupos querem alongar em até 90 dias o pagamento de faturas
Empresas que terceirizam mão-de-obra estão entre as mais pressionadas; 10% dos maiores clientes tentam acordo, afirma recrutador
JULIO WIZIACK
DA REPORTAGEM LOCAL
Com menos dinheiro na praça, grandes empresas apertaram as negociações com seus
fornecedores, pedindo prazo
maior de pagamento. Segundo
os prestadores de serviços, essa
prática intensificou-se nas últimas três semanas, principalmente entre as companhias
que recrutam trabalhadores
temporários para a indústria.
Uma das maiores do país, a
Gelre afirma que pelo menos
10% das grandes empresas de
sua carteira de clientes já pedem o dobro do prazo. Segundo
Jan Wiegerinck, presidente da
Gelre, antes elas pediam entre
15 dias e um mês. Agora querem, no mínimo, dois meses.
Há quem tente três meses.
"Com a crise, a pressão ficou
maior. Elas querem que a gente
financie ainda mais sua folha de
pagamento", diz Wiegerinck.
"Neste momento, estamos em
negociação, mas esse prazo é
impossível, a menos que os
bancos que nos financiam também nos dêem prazo maior."
Apenas na Gelre, Sadia, Carrefour e Votorantim, entre outras, estão em negociação. A Sadia confirmou sua intenção de
alongar pagamentos, mas informou ter pedido um mês, e
não três. As demais, por meio
de assessorias de imprensa, negaram as negociações.
Por esse tipo de contrato, as
fornecedoras de mão-de-obra
selecionam os funcionários que
trabalharão temporariamente
nas indústrias e pagam os salários. O valor é recebido depois
das empresas contratantes.
Segundo a Asserttem (Associação Brasileira das Empresas
de Serviços Terceirizáveis e de
Trabalho Temporário), os industriários costumam pedir
prazos para fazer uma prática
conhecida como "float".
Como a fornecedora de mão-de-obra paga primeiro para receber mais tarde, esses recursos já disponíveis no caixa das
indústrias ficam rendendo no
mercado financeiro ("float").
Com um prazo de pagamento
maior, essas empresas conseguiriam deixar esse dinheiro
rendendo ainda mais.
O crédito acabou
Na fabricante de cosméticos
Empório Bothânico, a situação
é dramática. Em plena expansão, prevendo faturar R$ 26 milhões em 2008, o presidente
Antônio Mesquita construiu
uma fábrica de R$ 3,5 milhões,
em São Paulo. A nova unidade,
com 2.200 metros quadrados
de área construída, produz 1,5
milhão de itens por mês, quatro
vezes a capacidade antiga.
Às vésperas de pagar os fornecedores, Mesquita teve canceladas as linhas de crédito previamente acertadas com dois
dos maiores bancos privados
do país. "Disseram que o momento não era propício", diz.
Desde então, a Empório Bothânico tenta esticar os prazos
com fornecedores para 75 dias.
Os salários dos 140 funcionários atrasarão em pelo menos
cinco dias e há chances de demissões. É possível que haja
atraso na entrega das encomendas fechadas para os próximos anos. A empresa também
quer trocar o perfil de sua dívida com o BNDES. "Vamos tentar o financiamento do Finame
para cobrir nossos gastos com a
compra das máquinas que já estão na fábrica," diz.
Tudo isso para correr das firmas de fomento mercantil, conhecidas como factoring. Segundo Mesquita, elas cobram
taxas de 5,5% ao mês, contra os
2,3% praticados pelos bancos.
A Folha consultou 15 das
maiores firmas que terceirizam
mão-de-obra no país. Segundo
elas, além da escassez de crédito, pequenas e médias indústrias estão cancelando postos
temporários. Isso ocorreu na
fábrica de colchões da Probel,
em Suzano (SP), e na Komatsu
do Brasil, que produz tratores
de esteira. Ambas não atenderam a reportagem até a conclusão desta edição. Na construção civil, estima-se que 20%
dos temporários foram cortados dos canteiros de obras.
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