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Crise energética na Califórnia é
exemplo e alerta para o Brasil
CÉLIA CHAIM
DA REPORTAGEM LOCAL
A crise energética que provoca
blecautes na Califórnia, a região
mais rica dos Estados Unidos, é
um alerta para o Brasil. Na Califórnia, o modelo de liberalização
do setor de energia aprovado em
1996 -ao qual o brasileiro muito
se assemelha- está fracassando.
Na última década, a demanda
no Estado aumentou 50% e a capacidade de fornecimento manteve-se estacionada. As empresas
distribuidoras estão sufocadas
pelas leis que fixam limites para as
suas tarifas, liberando a dos produtores. A PG&E, que, junto com
a Southern California Edison, domina a distribuição de energia na
região, decretou a sua falência em
abril, para desespero do governador Gray Davis e desconfiança do
mercado: antes de anunciar a falência, a empresa teria distribuído
US$ 50 milhões entre seus diretores, sob a forma de bônus.
Movido pelo susto, o governador da Califórnia, logo em seguida, fez um acordo com a Edison
para evitar seu colapso. Segundo
o acordo, o Estado da Califórnia
comprará a rede de transmissão
da empresa por US$ 2,7 bilhões e
a companhia utilizará esse dinheiro para saldar parte de sua dívida
de US$ 5 bilhões.
O que leva à comparação entre a
política energética brasileira e a da
Califórnia (que consome mais
energia que o Brasil) é a filosofia
da desregulamentação e ausência
de uma política energética.
Lá não houve privatização porque 99% das empresas do setor
sempre foram privadas. O pouco
que resta nas mãos do governo os
americanos não vendem (o Exército, por exemplo, gera energia).
O que aproxima os apagões de
lá com os de cá são os princípios.
O Brasil desregulamentou o setor,
assim como a Califórnia, reduzindo o papel público e separando as
atividades de geração, produção e
distribuição. Ou seja, houve um
estímulo à desverticalização, em
favor do estímulo ao mercado.
A lição da crise vale nos dois casos: o setor energético, na Califórnia ou no Brasil, não pode correr
completamente solto nas mãos da
iniciativa privada. "Pode ser mais
ou menos mercado, mas sempre
exige a atenção do setor estatal",
diz o físico Luiz Pinguelli Rosa, vice-diretor da Coordenação dos
Programas de Pós Graduação em
Energia (Coppe), da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
A crise na Califórnia levou Estados americanos a reavaliar seus
planos de desregulamentação no
setor. Nevada, por exemplo, que
iniciaria seu processo no ano
2000, adiou-o indefinidamente.
O processo na Califórnia, dizem
os técnicos, é cheio de falhas. A
maior delas: foi feito em condições de falta de capacidade de fornecimento. "Há 20 anos que não
se permite a instalação de novas
refinarias de petróleo e há 10 anos
não se instalam novas usinas porque há uma resistência muito
grande dos ambientalistas", diz o
brigadeiro Aldo Rosa, brasileiro
que mora em Palo Alto, é professor de engenharia eletrônica na
Universidade de Stanford e atua
na área de projetos energéticos alternativos. "Ninguém quer permitir a construção de uma usina
em seu município", ele diz.
Mas ninguém quer ficar sem
energia. Daí o impasse e um dos
problemas imediatos que o governo americano terá que enfrentar. Não se trata de defender a volta da regulamentação, mas de desenvolver fontes alternativas de
energia em combinação com as
fontes tradicionais. Essa fase de
transição, diz o professor Aldo
Rosa, é lenta. "Leva 20, 30 anos."
O gás natural seria uma alternativa. "Falta nos Estados Unidos,
mas é jogado fora no Alasca; o
problema é que também enfrentaria resistência porque um gasoduto é antiecológico", diz o professor. A energia nuclear, que ele,
Aldo Rosa, também teme, tem
vantagens e desvantagens, mas
enfrenta a fúria dos defensores do
ambiente, que em países desenvolvidos têm força.
Grandes empresários do setor
de novas tecnologias já começam
a espernear. Avisam que não poderão suportar a situação por
muito tempo e insinuam que suas
indústrias, cujo maior patrimônio
é o talento, podem ser transferidas para outros lugares.
O problema é que não há solução a curto prazo. Uma central de
produção de energia não é uma
fábrica de automóveis. Nem na
Califórnia nem no Brasil. Mas a
Califórnia tem pressa. O Estado
sofreu blecautes em janeiro e
março e eles devem se repetir durante todo o verão.
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