São Paulo, sábado, 17 de junho de 2006

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Lei de Falências, 1, tem poucos "usuários"

De junho de 2005 a maio último, só 208 empresas pediram recuperação judicial no país com base na nova legislação

Um dos motivos que explicam a baixa adesão à lei é que os empresários temem expor as contas aos credores na recuperação


SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL

O número de pedidos de falência continuou batendo, de goleada, o de recuperação judicial durante o primeiro ano da nova Lei de Falências. Foram 6.443 falências requeridas de junho do ano passado a maio deste ano, e 208 de recuperação, segundo dados da Serasa.
"Com a nova lei, esperava-se que ocorresse o oposto", observa Laura Bumachar, advogada do escritório Barbosa, Müssnich & Aragão.
A recuperação judicial substituiu a antiga concordata e é considerada um processo no qual empresas em dificuldades financeiras têm mais chance de se reerguer. A lei estreou em junho do ano passado com dois casos de grande visibilidade: o da Parmalat -que concluiu em maio um acordo com os credores, obtendo redução de 83% na sua dívida- e o da Varig, que agoniza publicamente.
Dois fatores explicam o número ainda reduzido de adesões à nova lei, segundo advogados e consultores. O primeiro é o medo que os empresários têm de expor suas contas aos credores num processo de recuperação judicial -condição básica da negociação entre as duas partes.
"Os empresários ficaram um pouco receosos com a lei. A concordata era mais unilateral, determinava quanto e quando pagar [40% dos débitos no primeiro ano e 60% no segundo]. Na recuperação, as empresas têm de abrir sua contabilidade para negociar com os credores", diz Maria Isabel Alvarenga, sócia do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados.
O segundo fator que explica por que ainda é pequeno o número de pedidos de recuperação é o fato de a lei ter sido usada para tentar ressuscitar empresas tecnicamente falidas, como a Varig e a Vasp, segundo especialistas.
Profissionais de grandes escritórios de advocacia relatam que a cada novo capítulo do drama da Varig, empresas em dificuldades que os consultam sobre a oportunidade de pedir recuperação judicial desistem desse caminho.
Advogados falencistas, investidores especializados em comprar empresas em dificuldades e consultores de gestão consultados pela Folha foram unânimes em afirmar que o caso da Varig não se enquadra no espírito da nova Lei de Falências.
"É preciso que a lei seja aplicada no seu espírito: pode pedir recuperação judicial a empresa que é viável, que pode pagar suas despesas operacionais", observa Bumachar.
O juiz encarregado do processo de recuperação judicial da Varig, Luiz Roberto Ayoub, da 1ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, diz que "se não acreditasse na recuperação da empresa teria decretado a falência há um ano".

Desgaste
Os especialistas em falências consideram, porém, que o processo de recuperação judicial da aérea é uma tentativa desesperada de salvá-la "forçando" a lei. Citam um precedente perigoso como a liberação, pela Justiça, de recebíveis dados em garantia a credores. Esses títulos foram vendidos pela Varig e os recursos foram usados para pagar o combustível necessário para mantê-la no ar.
Outro precedente que estaria gerando temor em relação à aplicação da lei é o caso da Vasp. Ela parou de voar em janeiro de 2005, teve canceladas as concessões de todas as linhas e está sob intervenção desde março daquele ano. No início de julho de 2005, entrou com pedido de recuperação judicial.
O juiz Alexandre Alves Lazzarini, da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo, que acatou o pedido, diz que "a Vasp não é só avião voando. Tem uma parte enorme de manutenção em funcionamento". Para ele, a empresa pode recuperar-se atuando como prestadora desse tipo de serviço. "Voar, só mais tarde."
No entanto, a Vasp ainda não conseguiu fechar seu plano de recuperação e o total da dívida ainda é motivo de grande discussão. Os credores acusam rombo de R$ 5 bilhões e a empresa, de R$ 3 bilhões. São embates desse tipo que os empresários em dificuldades temem enfrentar ao recorrer à nova lei.


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